Blog da Liz de Sá Cavalcante

Amanhecer sem Sol

O Sol é uma utopia, um sonho sem sonho, no qual desmaio minha alma. O amanhecer sem Sol é o reconhecimento desse sonho. Sonho de Sol, realidade sem chuva, sem Sol, é apenas a distância do tempo do sonho. O sonho não é real, o tempo do sonho não é real. O sonho não sonha. A morte é uma qualidade insensível do ser, ampara o Sol, antes dele se desmanchar, e o torna o ser do amanhecer. Deixa a alma no debruçar do céu romper a discórdia divina pela união divina. A vida nasce da destruição divina para apenas Deus ser divino. A sensibilidade é a insensibilidade humana, confiança de Deus no amor que sentimos. A insensibilidade é amor. A percepção é uma ausência, não sei se da vida, de mim, de Deus. Conceber o Sol como o exterior do ser, que amanhece sem amanhecer, como um amanhecer jeito de Sol, sem Sol. O Sol derrete a sensação do Sol no calor da mente. O distante é sensível, é a falta de mim, em mim. Nenhum amor traz a vida de volta. A volta do amor é o seu fim. A poesia é um ser que não nasce, coloca sua frustração em mim. Estou anestesiada pelo meu corpo, por ele não me causar dor. Sua dor é minha dor: a poesia.

É inesquecível esquecer

Escrever, parte de mim que não foi esquecida na lembrança de Deus. Fugindo do medo como um Sol amedrontado de amor, nas curvas do tempo. A morte é um pretexto para o fim. O irreconhecível na alma é o seu amor. O nada salva uma vida. A morte de dentro de mim é a falta de me aceitar o pessimismo. Senti-me bem com a morte. Ela coube em mim. A morte é união, não é afastamento. A vida é acorrentada pelo nosso amor. A imagem do objeto desaparece: dá luz à vida. Renasci da morte. Meu corpo é para não sentir o inferno (a vida). Eu não quis a vida: ela me quis sempre mais. Vivo sem me sentir, por isso sinto a vida. Tudo é pouco para o nada. Meus olhos são feridas abertas da vida. Nada vejo com meus olhos. Meu olhar é vazio de não ver e vejo pelo meu silêncio. Esqueço o que não vi, mas existe em mim. Não preciso ver a morte. Não é renúncia, é um adeus perdido no infinito da falta de ver. Assim a imagem descansa, no não ver em mim. Meus olhos permanecem; o ver desaparece na morte, como uma poesia secreta que eu vejo no meu não ver. O Sol se vê na minha poesia. Sou a razão do amanhecer. Conheço o amanhecer pelas minhas poesias.

O abismo da alma

A vida imaterial não reage ao abismo da alma. A morte é um retraimento em uma explosão de almas. Sonhar é um entorpecer sem a alma, onde sou apenas eu. Esqueci meu ser na alma: foi como ser real. Real em mim é te ver, mesmo a sofrer. Amar-te é um olhar solitário. Ser é o nada da alma. O nada se abandona no olhar sem pele, sem dor. A vida é apenas o último e único olhar do mundo. O ser é uma sensação da alma, na qual o infinito da alma descansa como sendo o Sol da inexistência. Sonhos da mente e sonhos do ser são existências que se separam. Pele são ossos roídos da alma. Crio para tudo me faltar. É ruim essa alegria. Ela não é clandestina. O pensar toma conta do corpo. O nada em corpo é o pensar verdadeiro. Deixar a relação por um corpo é morrer de egoísmo, é a substância do nada. Escrever torna minha substância concreta, em um transcender de alma. Sou a minha substância no morrer eterno.

Meu luto pela morte

O nada no ver é não existir na alma por ver o  nada. O nada é o real. Queria uma realidade menos morta para eu morrer. O real impede a lembrança sem a cessar: este é o luto da morte. Cessar é apenas morrer. Que eu cesse infinitamente, enquanto puder morrer. Deixo de ser apenas morrendo: isto é um sonho dentro de outro sonho. Esta é a minha realidade, morrer sonhando.

Escutar as palavras

Fico sem palavras ao escutá-las sem a vida, o mundo. Escutar as palavras para não escutar o choro do meu interior, vazio por chorar. Não posso afetar-me com a morte, palavras na morte. Ao menos eu consigo esperar pelo meu fim. Será o fim apenas esperar?

O olhar humano

O olhar humano é sem linguagem. A linguagem é o vazio existencial. Na linguagem, desaprendo a ser, aprendo a amar, viver pelo ser que não existe em mim. O nada morre na lembrança, sem as cinzas do ser. O olhar humano é a vida, vivida em um olhar qualquer. O nada é a vida na morte, é desesperar-se de alegria, como um último Sol a banhar-se de chuva. Deixe-me ir no desespero onde estou, senão não estou em lugar algum, nos espaços deixados por mim, de mim. Morrer é organizar-me no meu interior. A tristeza é o fim do meu interior. Defendo-me de mim com a alegria não sentida. O Sol age só no mundo, e não é o mesmo Sol de ver. Amar é sem Sol.

Escondida no existir

Escondida no existir para a morte encontrar-me. Morrer é ter a vida unificada, reunir a vida onde não estou mais escondida no existir. Não posso expor meu existir nem para a vida, mas posso não me sentir escondida ao viver a vida no meu esconder. Vou deixar de ser na duração da vida, que é minha duração na eternidade de me mostrar a mim.

A positividade da morte

Não vou abandonar meu corpo morto. Ele sente o Sol na positividade da morte. O que lembro da alma é o infinito de mim, que poderia ser o meu fim, mas não é: é a falta de Sol, que não me deixa sem Sol. O Sol é a dúvida da morte. Morrer é a incerteza de morrer em uma eternidade de Sol. A vida depende da morte. O nada do Sol é o Universo.

A inconsciência de mim em um mundo perdido pela consciência

A consciência é um rio no mar da inconsciência. Eu sou a consciência do perdido sem instantes. No nada da ilusão, sonhos eternos me fazem viver. Sonhos do nada cessam a ilusão de ser. Esvaziar o nada como o nada é impossível. O possível da morte não torna possível o ser. Ser significa para toda a vida, mas a vida não é toda ser.  O ser do nada é o mesmo ser da vida. Deus é Deus de si mesmo. Distribuir vidas inexistentes vai além do amor, do incontrolável desse transcender solitário: isto é puro ser, pura divindade. Vai além do nós, vai além da humanidade, em um único ser. Não vai além de Deus. Incorporo Deus no meu imaginar. Consigo respirar todos; respiro Deus.

A voz do ver

Ler forma uma imagem, na qual a palavra desaparece. O nada torna as palavras infinitas na voz do ver. Ver, fim das palavras, por não serem sozinhas. O nada do ver, concretização da poesia na fala do nada. Morrer não deixa a palavra intocada, morta. A palavra se escreve com propriedade sem restrições. A palavra alcança o céu onde não posso alcançar. A voz do ver vê, por mim, meu infinito particular, que me faz falar na voz do ver.