Blog da Liz de Sá Cavalcante

Ilusão

O nada é ilusão, nadifica o ser, mata-o. O que significa ilusão? Um pedaço da vida que não foi perdida. Ilusão é arte, poesia. Desenho almas no vazio de mim. Penso ser, mesmo sem alma, e meu vazio se torna alma real. Alma é a lembrança da vida. A lembrança não apoia o ser. Se tudo fosse ser, Deus não existiria. A lembrança é a vida do nada. O nada é a imensidão de um mar de estrelas. A plenitude não existe. É a essência de uma coisa inacessível a plenitude. O sonho torna a plenitude real. A inconformidade é um sonho. O sonho das minhas mãos não deixa meu ser dormir. O nada substitui o sono, o ser. O ser e o nada, unidos, são o despertar vazio, como o mar todo em mim. Sem mar, não sei de mim. O nada, sabedoria do mar. O sonho penetra na pele, saindo de dentro da vida para o ser. O sonho é sem imagem, sem palavras, sem atitudes. A imagem do sono é o nada vivo, é a força do nada em mim. Desistir é força. Pele por pele, fico com a força que supera a pele nos poros do nada. Tão artificial respirar quanto a vida. O ar, escuro de emoção, mobiliza a vida. A vida sem mãos não é vida. Pode o corpo ser a falta da vida das minhas mãos. As mãos são uma forma de ter céu. O céu se segura nas minhas mãos e descansa. Flores de angústia sustentam o céu e o salvam do prazer eterno, que não é a morte, é a cura das minhas mãos na poesia, em um prazer comum. Tudo me invade, não fica, torna-se amor. Simbiose de sonhos é o céu. Se o sonho aprendesse a sonhar, seria a morte. Nada se parece, tudo é sonho. Tudo deveria ser vida? O nada é inseparável do nada, confiança sem paz. Os passos da eternidade caminham nos meus sonhos. Não há sonhos sem eternidade.

Martírio

A morte faz eu me aproximar mais ainda da vida. A morte é luz que não se vê. Ver é ser capaz de morrer, esfriar para morrer, para dar calor à vida.

O amor da vida

A morte é a única angústia que é um ser no amor da vida. Morrer para sentir angústia. Não sou mais um ser: sou angústia pura, apenas. Tudo isso, por isso morri.

Injustificável

Nada se justifica, nem em vida, nem em morte, nem em mim. Tudo se destrói na justificação, como se tudo fosse Sol, amor, nostalgia. O amor não pode ser Sol. Sol é a eternidade do amor.

O silêncio sem silêncio

O silêncio sem silêncio é ingratidão das palavras. As palavras sonham em silêncio o que não consigo sonhar. Tudo se resolve em sonhos. Morri nos meus sonhos, como se eu não me descobrisse só e me descobrisse feliz, inteira como um Sol sem luz.

A grandiosidade do nada

Admirar a morte torna o nada passivo, desconfiado. Nadando no meu amor, não me afogo. Não desafogo meu coração. Amo no afogar do destino. Não é desafogo, é meu corpo como destino. O amor cessa o destino, torna-o admirável de ausência. Não tenho destino, tenho ausências de amor. Ausência é viver intensamente de amor. Amor é agonia. É tanto amor a amar, que não dá tempo. Viver elimina o amor distante do tempo. Nada se pode fazer sem amor. Vida e morte são almas gêmeas que se confundem de amor. Não existe consciência, existe relação que se relaciona sem consciência. A consciência é amor, amor que existe até na inconsciência de morrer. Morrer não é a morte.

O sentimento do mundo

Nada tem o sentimento do mundo. O mundo sem sentimento é fuga, é Universo. O tempo escraviza o Universo de tanto Sol. O mar é sem o Sol do Universo. O ser é o Sol de si mesmo, por isso converso com o Universo em poesias.

Como sofrer, se posso ser feliz?

O quietismo da morte não o deixa aprender o ser. Quietismo é força de aprender sem aprender. Para aprender o ser, a morte precisa esquecer o mundo, a vida. A morte me desperta, não para mim, mas para o despertar, para o mundo doente sem cura. Seu único auxílio é morrer. O imaginário não destrói a mente, porque é um ser da imaginação, mas nunca um ser imaginário. O ser imaginário é a única morte real, referência de vida. A última morte foi a primeira do ventre dentro de mim. A outra morte foi o corpo. A poesia não pode nascer de dentro de mim. Eu a transformo em mim.

O desperdício do ser

O ser é a ignorância da morte. A morte é o telhado do mar.

A leitura da vida

Leio a vida pela alma. A alma me faz ter vida. Tocar-me é necessitar tocar a morte, é deixar meu corpo na morte de alguém. Não sei ter corpo, não sei ter alma. Sei apenas tocar a morte. É como não haver renúncias, nem vida, nem morte. Há apenas a leitura da alma: o silêncio. O silêncio me toca. É como se houvesse um corpo de lágrimas em mim, por mim. O céu é um desejo, uma maneira de ficar perto do mundo. Longe do mundo é o meu nascer. E se o mundo for o meu nascer? O que significa nascer? Ser eu não é nascer. Nascer é a fraqueza do espírito em mim. A saudade de mim é a eternidade.