Blog da Liz de Sá Cavalcante

A luz do abismo

Perdas são realidades que permanecem necessitam da luz do abismo para eu ser real. Para a realidade, como se fôssemos uma só. A ilusão de estar só é só. O abismo é o fim da solidão, enclausurada mais do que a solidão. O consolo aberto como asas do céu no pensamento. E a luz do abismo se afasta, deixando no lugar a visão do real, que é minha visão, não é o eu vejo dentro de mim. No real, eu existo: dentro de mim não existo. Será o mundo mais importante que meu interior do que minha alma? O que tenho dentro de mim é pouco para mim.

São tantas coisas

São tantas coisas impronunciáveis, que se tornam palavras, amor. O abismo une as coisas ao amor, a vida, desarmoniza o sentir no ser. São tantas coisas que falo, escondendo o silêncio de mim. O sol torna a alma só, no meu amanhecer sombrio, onde não há claridade, nem mesmo no meu olhar. O olhar desafia a vida a viver. Viver é desacreditar no que vejo. Ver apenas o ver em mim é viver. O absoluto não é o silêncio: é a fala. São tantas coisas perdidas em viver, que quero viver.

O esplendor do nada

A alma ainda deixou-me metade de mim. Não preciso ser meus fragmentos para amar a alma. Amo a alma, mesmo morta. Dou minha morte para a alma, fico sem nada. A face do espelho é o nada em mim. A alma é a imagem no espelho. Então não sei como sou, não é a minha imagem no espelho. Sei como me sinto, como sou, sem nunca me ver. Ver é abstração do nada na realidade do nada. A realidade do nada me faz viver. Tudo que é será um dia sendo de si mesmo. O nada é a profundidade na distância do nada. Eu vi tua realidade sem alma do nada, como uma alma sem vida. Tudo é essencial para o nada. O nada se vê no nada do outro nada. São tantas lacunas e nenhum nada em mim. O tempo esquece o nada de si por um talvez não seja o nada, mas é. É o nada a razão de tudo. O nada das minhas mãos oferece mais do que vida, oferece amor. A solidão da alma é o corpo, vontade de chorar sem alma, para me sentir por dentro de mim. O sol e a alma são ausências abandonadas. E o céu reza ausências adormecidas. Sem a alma, não há chegadas ou partidas. Vir a alma é deixar-me inerte. O corpo, saindo de mim, é a alma. Os dedos desfazem realidades sem mãos. Vivo dentro de mim. O corpo isola o ser nele mesmo. Não há ser no ser da alma. Fugir dos dedos com minhas mãos para acariciar pensamentos são almas tranquilas. A incompreensão é o amor da alma. A alma sem o esplendor do nada me faz morrer sem o nada: me faz morrer em vão.

Irreversível (não se pode reverter, voltar ao estado anterior)

Eu não gostava da minha alma até tê-la de verdade. Engravidei da minha alma para ter direito ao sol. Um sopro de vertigem queima o sol doce por viver. Nada sofre de sol, vida. A pele se pode arrancar do corpo, não da alma. Mãos firmes não sustentam o corpo em mim. Nada fica do corpo em mim. Por isso, não morri. Morrer de quê? Não sei, vou simplesmente morrer, como se dissesse amém a mim. Um beijo calaria a minha morte de mim. Um beijo em palavras silenciosas reflete-se sem silêncio. Tudo parou, estagnou em mim, sem palavras. Preciso lembrar da fala: me manterá viva um dia. Como conversar com minha fala? Com amor. Minha vida está toda em minha alma, não em mim. Mesmo assim, me sinto viva. Tão viva quanto a poesia de um único instante apenas. Gosto da minha alma para morrer nela.

Extravasar a alma (transbordar, derramar)

O silêncio se derrama nas palavras, sem que a alma transborde como a imensidão dividida entre mim e o meu amor, que sinto como sendo eu. Tudo vivo em palavras. Não existe vida sem palavras, existe vida sem convivência. Palavras são as estrelas do céu. Nada na palavra se pronuncia sem o céu. O céu é visão da vida. Lembro de mim ao viver. A vida é a essência de cada um, nos torna todos em um único ser. A vida nos torna ela mesma. Há mágoas que são vidas. Sonhar é lembrar para esquecer. A alegria é nada lembrar ou esquecer. Meu corpo, meu rosto, não fazem me lembrar de mim. O que mudaria se eu lembrar de mim? Nada. Nada muda, nada está como está: no corpo apenas. Não sou mais do que um corpo. A alma é o sempre do corpo, de mim. O novo horizonte no meu corpo não precisa refletir, sendo a alma no meu corpo. Alma na alma, no meu corpo pleno. Amar a alma é não ter corpo, nem alma, ter apenas amor. Pele é alma. O amanhecer é incompleto. O outro sou eu no amor que sinto. Amor é sem adeus. A alma estabiliza o ser. O ser é a alma que se fez só: em Deus. A imagem da morte jamais será Deus. A morte sem imagem é a falta do meu olhar, da minha alma.

Aconchego na alma

A morte é a derrota da alma. Vou viver sem alma. A morte é o aconchego da alma. A alma é o lado da vida que ninguém conhece na morte. A morte não está no meu lugar, ela me acrescenta, eu não consigo me acrescentar. Não estou cedendo a morte, estou evoluindo nela.

A permanência não é eterna

A permanência é um raio de sol: ilumina pouco, vive pouco. A impermanência é eterna: são meus sonhos. Vida, te vi como um sonho. Ver é sonhar. A impermanência é sempre. Nada além da impermanência do amor. Não há nem silêncio, dor, ausência: algo necessita permanecer, mesmo que seja a morte. Tudo é real no desaparecer. Não é real na impermanência.

Alma iluminada

Minha alma iluminada com o amor inexistente em mim. A existência não se deixa iluminar. A morte que tua ausência me causou me ilumina, me enche de vida. A paz infinita na minha alma iluminada. A morte é a medida perfeita da vida.

Renascer na dor

Renascer na dor para esquecê-la. Renascendo, vivendo na dor que não existe em mim. Nem nela. Renascer é sem alma, amor, sem chão, sem referência, sem amor. Apenas renascendo sou a ausência que necessita. Se precisa apenas de ausência, quero ser a melhor ausência para mim, para ti, vida. Que você, vida, está entre a vida e a morte. Vida, cabe em minhas mãos, minha vida, em minha alma. O sonho é uma alma que nunca se manifesta. A alma de ontem não é a alma de hoje. É difícil para a alma, viver numa vida que não se modifica. Tudo reage, não se transforma. O sol é o mesmo, a emoção, o amor pelo sol é sempre surpreendente, onde o céu são cinzas do sol.

Metade da saudade da ilusão

Metade da saudade de uma ilusão sou eu. O infinito que busco na morte é a imensidão do infinito, sem o infinito, vou morrer sem a morte. Metade da saudade ainda não é morrer. Vou morrer plena de saudades. Me espanto de ser tristeza como a morte. Aquilo que sou, o amor da alma. Mas não se reflete em mim.