O que basta basta por não se bastar: esse é o nada da angústia. O olhar é a perda da vida. A vida é um olhar que não volta: está dentro de mim, sem estar em mim. O olhar é minha única lembrança boa, onde não me importo com as lembranças tristes, se eu posso vê-las reconhecendo que elas são tristes. O fim da lembrança é a tristeza. Em mim as lembranças são sempre tristes e infinitas, como um céu particular. O nada da angústia é Deus? Ou sou eu em Deus? Sei o que é Deus? Sei que o amo. Amo seu desaparecer, é como Deus a dividir sua essência, seu espírito em mim. Nunca mais nada desapareceu, as minhas memórias tornam-se eternas, como se eu esquecesse apenas a vida. Ser feliz não é uma lembrança, é a perda dela. O silêncio é o único olhar de adeus. O adeus à vontade com o abandono do seu me faz olhar, não para o seu olhar, mas nele, no que nele se modifica e não retorna nem como antes, nem como depois. Nem como agora. A luz toca a alma, nunca pude tocar a alma. O que devo dizer à voz, se é a minha vida, mas nem no imaginar ela existe. A voz quer ser escutada pelo som da separação. A voz se espalha no corpo, como sendo a morte, por compreender a vida. A voz abençoa as trevas do amor. A voz tem imagem de morte, pior do que a morte. Conheço o que falo, sem voz, sem consciência, por isso, a voz não suspira por mim. Desligo-me da voz, com o silêncio do meu corpo se todos os corpos silenciassem dando lugar à vida, Deus existiria sempre para todos, e até para ele mesmo.