O ser e a vida não se completam. O depois é antes da vida e do ser. Nada faz de mim o que sou. A liberdade é sonho. Ninguém pode sair de si. Nem o mundo sai de si para a vida. A vida é o além do ser. O Sol se fere de Lua. Escrever, sair da frente do Sol, é adoecer a Lua. O silêncio da Lua faz nascer o Sol, mas o Sol não nasce de si mesmo. O contrário da Lua e do Sol faz cessar o tempo. O tempo da voz é sem ser. Justifica-se a voz no ser. Ninguém é ninguém no ser. Se a voz silenciar, converso com o vento, com o ar, comigo mesma. O silêncio descansa na fala. As mãos do silêncio curam a morte. A lembrança faz nascer a morte. A falta de lembrar, essência da vida. O passado da morte é um amor alheio a si. O presente da morte é morrer desse amor. E assim a minha lembrança pode partir com amor. Não é mais lembrança, é amor. A lembrança é esquecer o amor sem esquecer. Esquecer é a alegria do amor na mágoa do nada, motivo para viver. O céu, cobertor de estrelas, a invadir meu silêncio. Olho o céu e tenho consciência de nada ter, por isso consigo olhar o céu. O céu é ter mais do que ter. É ser esse ter. Varrer o céu me deixa sem mãos. O real é sem compromisso, é como não compreender o silêncio no silêncio. Nunca senti a minha pele, por isso sinto mais do que os outros. Sorrir é falta de mim. O mundo é avançar o sorrir na tristeza sem fim da vida. A falta é sorrir. Faço nascer o futuro, não sou o meu futuro. Sou a perda de mim, que apenas eu percebo. Perceber o que ninguém percebe é não ser só. Sinto correr meus ossos na dor de ser. O tempo é a memória em um nó humano. É frágil esquecer, é sempre o relembrar. Há momentos que não adianta pensar, nem ser. Basta uivar para a imensidão, afastar o medo de sentir e correr no vazio. Faço dele um aliado. Não há momentos difíceis, há o vazio, a obscuridade, que é positivo. Pele é o nada da vida. Se a pele não respira, tudo morre pela distância das mãos do silêncio. O céu não tem cor. Apenas respira cores que se confundem com ver. Ver é o real do real. O ver tropeça em mim. Respirar assusta, é o inconsciente. Venero a falta no respirar em mim. Respirar é preencher o mar de coisas boas. Nada pode esconder o real da minha alma. A falta é não sofrer. Na falta da amargura, fico presa no meu ar. Há duas ausências em mim: uma de vida e uma de morte. Nascer vai além do ser. Nascer não depende do amor. É mais real que o amor. Vencer é perder? Ter de volta o que nunca perdi. Abraço o tempo sem mim e o tempo se torna meu. Sem mim o tempo não ama. O ser com outro ser é o fim de se relacionar. O nada é carente de nada. A dubiedade do ser é o nada. Na visão do nada, o ser é uma promessa de existir nunca realizada. A escassez é falta do nada, não é falta da falta. A falta da falta é alma.