Blog da Liz de Sá Cavalcante

A presença da morte

Sofrer é esperar que sintam como eu. Apenas há esperança da presença da morte, que é estar unido sem nada existir. Além dessa união, em que existir une a poesia ao nada, esse nada se torna melhor que a vida do meu corpo e escrever é o medo do nada do meu corpo. O corpo é medo do meu corpo. Escrever e medo não têm fala. Palavras e argumentos são apenas corpo.

Existir no fim

O sofrimento não pode ser nada. Ele representa a mim, na alma, no corpo. O sofrer devia ficar na consciência, nunca no ser. Que ser é esse, que é apenas consciência? A consciência não faz viver. O nada não existe no fim. O nada é escrever diante de mim, para o outro. Meu corpo de estrelas submerso de mortes. Morte é existir sem o fim. O que é o fim no nascer? É o parto do fim. Parto da morte, escravidão sem nascer. O sofrer cessa a morte e encontra o ser perdido na morte.

Ninguém

Sem ninguém, são todos em mim. Tudo existe no ninguém e me faz ser ninguém. Esquecer o ser nas alturas da morte e fazer de Deus o descer sem alturas. O infinito é raso, como um amor divino. O infinito morre no ninguém, no amor eterno.

Resistência

O sonho é resistência da alma. Nem mesmo o dia é como a alma, nem o Universo é como a alma. Quando falta algo em mim, é minha presença em mim. Sabe o que é ter presença? Presença são oscilações da alma quando a alma encontra seu lugar. Alma é uma maneira de crescer. Crescendo perco a alma. Vivendo, a alma não me sente. O eu interior da alma é o nada, é voar no nada. O eu interior é sem o eu da alma. Alma é suicídio, é fatal. A alma é um milagre. Pela falta conheço a vida, admiro-a, conquisto-a. O que falta não falta, fica dentro de mim, sem necessitar de alma ou faltas. Eu vivi o necessitar da vida. Como se fosse uma necessidade minha, aprendi a viver. Fiz de mim o teu viver, saudade de mim. Vida, negaste o céu, mas não a mim. Sou teu céu. O céu murchou, o céu estendeu-se em sonhos. Sentir o céu sem morrer ou viver. Sentir o céu é dividir minha alma com o céu. Sem ser no céu, recupero o céu em ausências. A ausência é o céu e eu canto o céu na poesia. O pó é meu corpo. Nada se deixa no nada. O nada é como a voz de Deus. Deixo o nada sem o nada. Deixo-me levar sem o nada. Aonde estava antes? No nada ou em mim? O nada é o único ser de si mesmo. O céu está cheio de ser, ansiando o nada.

A presença e o eterno

A presença é eterna sem o eterno. A presença é o querer. O eterno é o não possível, é o não querer na presença vazia sem corpo, onde o único querer se foi. A alma levou com ela a presença e o eterno. Torno-me o que não existe. Existir é misturar eu em mim, realidade e sonhos, corpo e alma, o bom e o ruim. É por isso que o existir me deixa só, para eu ter presença no eterno.

Meu coração de ar

Sem palavras, meu coração de ar me sufoca para me fazer respirar. Respirar é ausência que não reduz o tempo. O tempo respira momentos perdidos de morte até a vida cessar. O tempo une vida e morte, separando o ser do ser. A tristeza do infinito fica a boiar na minha alma. O céu, no derradeiro céu, clama por Deus. Nada é compacto sem solidão das asas do mundo. A morte parada, sem ação, é reação da vida. Vida, foste a minha morte, a minha verdade. A morte é um lugar vazio sem paz. Nada se faz de morte. Eu criando eternidades, poesias evaporam em eternidades perdidas dentro do meu corpo. Meu corpo é miragem da alma. Ler a alma, para morrer na falta de alma, desabotoa a alma em poesia. Chove poesia. A alma é um precipício. Poesia é despontar sem viver. Do aparecer nasce a alma. A palavra me faz um ser, um ser para todas as poesias. Palavra não é um sentimento, é solidão. Solidão de mundo, de céu, de desarmonia. O mundo é triste apenas se sorrir. Sorrir entristece até a calma da alma. Não existe motivo para viver. Alma, dê-me motivo para viver. De céu em céu, não parti. O ser em si mesmo fica preso na morte, sem morrer.

Resplandecência

A resplandecência da morte é o acolhimento da escuridão. É triste resplandecer sem a escuridão. Contraí escuridão para não morrer. A escuridão é poesia. A ansiedade pela escuridão é a luz. Luz e escuridão se fundem no ser. Poesia é um outro mundo, uma nova vida. O sonho caminha em mim. As flores desencaminham minha alma. Elas são apenas sonhos de alma, que reconhecem o fim do real. Real é olhar nos olhos dos olhos e ver alma. Ver sem alma é experimentar ser, em mim mesma, o Sol da alma dentro dos meus olhos. Olhos somam. Vidas interferem no infinito do amor. O deserto do sonho é o Sol mais perfeito. É como se a alma fosse infinita de Sol.

Intuição

A intuição faz morrer sem a intuição, cessa o pensar, a alma. A intuição é por onde não se pode perder-me em morte. É a duração da morte, sem a morte. Reservo a morte no íntimo de mim. A verdade de morrer não existe. Arrancar-me da morte pela raiz. O sonhar da morte é mais morte. Sou o ser que não sou. Transfiro o ficar na morte para as estrelas. A estrela se conserva sem morte, mesmo com morte.

O mundo dos sonhos

A realidade do mundo é o nada no mundo dos sonhos. Tirar o nada dos sonhos fica sem sonhos. A ternura não fica sem sonhos. O sonho se torna um ser. Posso, enfim, desaparecer, despossuir-me. Amar e desamar são o desaparecer do amor. O tempo não é amor, é o corpo do meu desaparecer. Não reparo em mim, e sim no meu desaparecer feliz. Agora tenho realidade, portanto não preciso sonhar.

A fala da alma

A perfeição do nada é o não ser. A fala da alma é o desaparecer eterno, que comunica o nada no nada. A fala pode ser o vento, a quietude, o dormir, o amor. O inencontrável é onde apareço no nada. São tantos nadas para nenhum ser. Um único ser seria o nada da vida. A fala da alma é a minha fala, sem silêncio interior. O interior é falar para o nada da saudade do silêncio dentro de mim. O silêncio é se despir de alma. A existência é um ser incompleto, que ainda vai desnascer da sua voz. A voz é a consciência da alma. Fala, alma. Aonde estiver te escutarei.