Blog da Liz de Sá Cavalcante

O ser sem o nada

Sem a vida, tudo é como sempre foi: como um nada a se afundar em mim. No Sol de mim, torna o nada feliz. Os mortos iluminam-se com a vida, sem raios de luz de escuridão. Os vivos, na escuridão, esperam morrer em uma escuridão maior que a escuridão: o vazio livre. O céu, penteando-se de estrelas, não precisa sorrir de azul. O azul do céu são lágrimas de céu a expandir o Universo. A morte é o vir a ser. A consciência não sente a própria dor, mas sente a consciência da dor. A consciência da consciência é meu ar pairando no ar que respiro, até não respirar para me sentir.

Conectando-me

Viver é conectar o amor sem me conectar, é o soluço do nada. Palavras ouvem dentro de si a falta de vida. Minha aparência é irreconhecível em mim. A dor da alma consola-me de ser. Ser é nunca estar. O ficar dos meus olhos é a falta de uma paisagem, é a vida. É o meu soluçar como paisagem, é a falta de me ter.

O fenômeno da vida

Quando tudo me falta, descubro a vida em um véu de certezas do amor que não vem! Do céu que me sorri, como se fosse o meu amor por mim. Posso viver sem consciência, mas não posso viver sem amor. O amor não entra na alma, é apenas amor. O amor nunca vive, nem por mim. O amor é apenas o sentimento de estar viva. A incerteza do amor o torna possível. Meu amor é mais que amor, é morrer. Meu amor é morrer sem amor. O amor fica, a humanidade morre. A dor é falta do amor vivente. A vida é antes do nada. Depois do nada é o ser. O antes do antes é reflexo da alma sem alma, sem o ser. O irrefletido reflete-se na morte. A segurança da morte não é a morte, é o ser.

Equilibrar a morte

A morte é o novo de algo passado. É recurso sem a morte, mesmo sem existir recurso, pois o infinito supre a falta de recurso. Basta olhar o mar e a vida toma-me. As divergências do mar e do Sol fazem a vida. O nada sem ausência é um ser morto. O extremo de não morrer ressuscita o ressuscitar com a morte, mas o fim não ressuscita na morte, é virtual. Escolho o fim como quem escolhe uma flor. A flor é poesia intocada em sua morte. Existo na minha essência: o nada feroz como a morte sem precipícios, sem faltas, apenas a selvageria do nada a impor sua falta de destino, a impor sua paz. Não a paz que isola o mundo, mas a paz que agrega o nada, acolhe-o, ama-o. O céu desperta a vida, o ser, esse nós escondido como morte, como fim. O fim é real; o céu, não. Ele é um sentimento de amor que arruína a vida. A consciência do corpo é a morte. O Sol dura na morte, onde o Sol se vê. Tudo é real pelo Sol, sem o sacrifício de existir, é como se houvesse apenas existência no mundo. Há coisas mais essenciais que a existência, até que a morte nos separe. Pensar cessa a poesia, o meu ser. O mundo é a incoerência do meu ser. É fácil terminar minha morte, o difícil é começar nela. O fim da minha morte sou eu. Nada tem fim sem a morte. Ela deduz o tempo de ser. Escrever é uma cruz quebrada dentro do meu corpo.

Ausência de verdade ou realidade?

A ausência da verdade renasce a vida ao gritar para o nada. Ao menos seu grito é sincero, é como o nada a falar com o nada. A demora da vida é um adeus essencial que existe em mim, mesmo inexistente.

Saudade é presença

Saudade é presença onde a falta do corpo é saudade da presença inerte, por isso atenta da saudade. No entanto, nunca é saudade, por mais que a sinta. Para a aparência não ser aparência de morte, teve que aparecer no seu fim, continuar no aparecer, que é o fim. O fim é um aparecer tão completo, mas a vida não ousa aparecer, prefere morrer. Saudade fere e cura. É como se alguma luz acendesse no infinito da escuridão: penumbra dos meus olhos. Não penso no que não posso ver, penso apenas na escuridão e isso é tudo que posso ser: pensar na escuridão sem véu a escondê-la. A vida alcançada não é mais vida, é uma alma perdida, que se perde mais ainda em mim, por me sentir.

A morte está no âmago do ser

Nada teria sem a morte. A morte encontra o caminho de Deus; o ser não encontra. Sugar o nada com a essência viva é morrer.

Em mim há apenas poesias

A minha inconformidade é a conformidade de Deus. Deus encontra respostas na falta de respostas. Eu, que não tenho respostas, faço da poesia uma resposta ao amor de Deus. Não lembro da vida, sinto-a. Vejo o irreal no real de mim. Não existo como o não existir. Não existo absorvida na falta de adeus, que é o silêncio da vida. A vida é apenas parte do meu corpo. Meu corpo é mais do que a vida, é o meu Universo. Minha alma está perto de mim, isenta de mim. Minha alma é a poesia. Muitos são felizes e não vivem; eu vivo e não sou feliz. Não sinto totalmente a tristeza, senão veria que é feliz como é. O perto de mim é distante, como um amor sublime, eterno. A vitória de ser pertence ao fim de ser. No fim, aprendi a estar em mim. Estar em mim, sem mortes, sem pausas. Multiplicar a morte ao infinito, para a morte não ser mais nada. Sinto falta da morte quando amanhece. O amanhecer sem morte é triste, pois dá a sensação de nunca morrer. Preciso muito sentir. A poesia escreve sobre mim na minha morte. Assim deu nome, significado ao seu vazio: esperança de me ver.

Satisfação

O amor, início do nada. Vir a ser é ser. A alma não se vê como é: vazia de tanto amor. O amor é o passado da minha ausência feliz. Não conheço minha ausência, nem a sua alegria. Não me acostumo sem ausência. Nada pode ser a minha alegria. Eu sou a minha alegria. A angústia é a minha vida, não separada de mim. Toda separação une as almas. Morrer é apenas encontrar a alma como ela veio ao mundo: só. Colhi a dor que não existia antes da minha falta de partir. A noite, o silêncio do abrigo. Nada acaba, apenas deixa de existir.

Ruínas de vida

Morrer é simples, mas eu dificulto o morrer, recupero a essência da morte. A essência do meu corpo não é a minha morte. Morrer por uma essência é carência de alma, que não me deixa morrer como uma essência.