Blog da Liz de Sá Cavalcante

A falta da falta de mim

Entre o ser, o nada, e a vida, a falta. É difícil manter a falta no nada de mim. Ver meu ser é minha falta no outro. Escolho minhas faltas no amor de alguém. O momento é um pensar, persegue mais do que uma sombra. Momentos retornam pelo pensar. Não consigo pensar na saudade. Raios de céu me afastam da alegria de sentir saudade. Sofro por não sentir saudade. O sol é a falta de ver, que amanhece só como uma nuvem que se parte ao meio, sem falta de um adeus. Queria ser uma nuvem. Nuvens espalham o céu. Nada quero do céu, nem minha morte, quero olhar o céu, admirar o céu, meu olhar era para ser o céu. Eu não quis. A falta da falta de mim é o céu, sem o meu olhar. Pode me afastar de mim, meu olhar é apenas meu. Falar com meu olhar é sorrir. Parte de mim é o que vive em mim, parte de mim é o que morre em mim. O que sonho é alma, é canto, é dor. Carícias da alma é o tempo a cessar na falta de mim.

O inevitável de ser

O fim do meu corpo é a essência, onde é inevitável ser. Meu ser e meu eu se fundem na morte. A morte é uma alma viva, no padecer da vida. Para padecer não é preciso vida. O instante não é fiel, o padecer é fiel. Sem a morte, a ausência é o único tempo do corpo que não é mais novo ou velho: o corpo é apenas presença de vida. Não há vida na presença, mas corpo é presença de vida. Meu sofrer não é morte. Morte é não ficar só com meu pensar. Solidão é falar como sonho, amar como sonho. O céu e o mar separados pelo sentimento de viver. Céu e mar juntos é me sentir morrer. Morrer não se sente, se vive. O viver do meu corpo é uma lágrima caída. Quero morrer do meu amor. Fecho os olhos e me tenho de novo, como se meus olhos fossem o meu sorrir. O sentir é escutar o chorar do vento. O vento não chora no não sentir. É admirável morrer como chora o vento. O sonho é um ar sem morte. Quando não sou alma, sou eternidade. Abraço o vento em encontros sem fim. A alma é o buraco de mim.

Saudade viva

Lembrei de mim, dentro de uma saudade viva. Expandir silêncio, nunca saudade que não recebi. Será as minhas palavras, saudade de mim? A saudade é a falta do silêncio em mim. O ato do silêncio não é o silêncio. O perfume do silêncio são palavras de água. Isolo a realidade no meu amor. Não existe o tempo sem palavras. A ilusão do fim do tempo é o silêncio. Não sei do silêncio de Deus. Reconheço o silêncio pela falta de silêncio. O universo é um silêncio individual. A sombra torna-se imagem. A alma é desfigurada no olhar do amor, sem chance de agredir ou ser agredida. Saudade viva por mim. Morri, apenas para a minha sombra aumentar meus passos perante o mundo. O absorver é a alma cessando. Eu e a alma, sombras uma da outra. Sonhar é uma saudade vazia, morta, por isso é útil, me faz ser um ser, é poesia. Sou refém da minha liberdade. Morrer é dividir minha fé com o ódio. A alma necessita de mim para morrer. A única luz é a alma. A alma sonhou tanto estando morta que estava morta, agora vive. Viver é uma defesa do ser, não contra a vida, mas contra a alma. O amor não é o ser, é a alma. Apenas o ódio faz viver ou morrer. A saudade viva é a certeza que mantenho a vida em mim. A saudade não é viva quando transparece na morte da presença. O balançar das árvores, o florir das flores, é a única saudade viva. O céu é sem saudade do vivido. A saudade, adormecida em despertar, me faz dormir na saudade de mim. Sonhos deixados em saudade, lembram de mim. Saudade é não ter o mar no meu amor. Poluir o mar de esperanças. A inspiração é a falta do mar sentida como poesia. Nada vai durar, mas vai ser sempre de verdade: coisas boas e ruins. A sintonia da falta do mar, como minha presença, é amor. Escrever é mar para ter um fim.

Promessa de vida

A ausência é um fogo que se apaga na alma, na promessa de vida de ser só, de ser vida. Sonhar é promessa de vida. Nunca sentir é a vida, sem promessa de vida.

Profundidade do vazio

A desigualdade da alma com o ser é o amor. Um amor vazio. Alma esquece o amor sem amor. Escrever deixa pausas essas pausas são o sentimento.

Um sonho de morte

A vida não se faz sol para corrigir a morte. A vida é apenas a falta do que não existe. A alma se dá em ausência por viver, sou ausente. Morrer por excesso de vida é alegria. Uma alegria sem céu, alegria de vida. Um ser a chorar é a alma a se alastrar no fogo, sem as águas do amor. O nada, povoado, somos nós, inseparáveis do nada. Levo o nada a sério. Um sonho de morte são coisas materiais. Envolvo-me em sonhos de morte, pois tenho sentimentos. O sofrer sofre por escorregar, mergulhar em mim, e não na morte. Não há nada no nada: isso é sofrer. Eu não quero ver o olhar perdido em mim: seria como estar inteira. A inteireza é amor. É alma. A vida é a falta de mar. O sonho é morte. O sonho de morte é existir.

Vazio de estrelas

A proximidade da morte é o vazio sem estrelas, onde o sonho é possível. O nada não é culpado pelo que eu não sou. Sou o que serei. Entre a vida e a morte, o nada sem o ser. Preciso aprender a sair da alma, como um sol a se pôr.

A poesia e o meu ser

O coração do tempo é minha poesia: um depois sem depois, nuvens sem respirar o vento, no respirar do vento. A emoção não respira, brilha mais do que o sol, que a escuridão. O fim é meu olhar no teu. Estar é presença da volta ao começo, não é a minha presença. O que existe na presença de ser, é a morte separada de mim sem minha presença. Mais do que me perder, amei minha alma. Na alma não há separação. O corpo separa o nada da alma. Tudo se foi sem ter tido alma. Não ter saudade é ter alma. A imaginação morre nos meus braços, deixa meu corpo suspenso no que sou. Poesia e o meu ser são a mesma vida com a mesma dor. Meu coração se foi, estou a pulsar, a bater mais do que meu coração. O silêncio é um amor exposto a tudo. O silêncio são almas se abraçando, o amor a desaparecer por ser feliz, por eu ser feliz. A vida é feliz, sem corpo, alma sem pertencer. A vida não dá força para viver. A morte, força da vida. Nem o céu, nem a morte, alcançam meu corpo, minha alma. Alma é te dizer adeus, nunca a tive. Solidão é não te dizer adeus, é te dizer adeus, sem acabar com o acabar. No auge da minha morte, não te disse adeus. Guardei teu adeus, para não morrer é morri no teu adeus, sentindo teu adeus como se ele fosse eu.

Desatar o nada de mim

Para desatar o nada de mim, tenho que entrar na minha alma como quem cessa o sol no sentimento do amanhecer. O amor não amanhece. O sentir é um amor impossível. Não respiro o ar, e sim lembranças. A saudade de lembrar é o fim vazio. Na alma, o vazio é eterno. A espera é o entendimento da alma. Corresponder à alma é não a ter. A alegria torna-se a alma transcendente. E a alma nunca será a alma transcendente, é um resto de sol a se esconder da vida, da falta de céu. O real do céu são apenas as nuvens. Não dá para ser só no céu. O céu é o meu coração a permanecer. O vento me faz esquecer de mim. A lua, bêbada de sol na areia do coração. Não me parti ao meio, apenas morri. Não sou areia do vento, sou a sombra do vento a esperar o nada. O vento, sobras de uma inexistência. Na existência de um adeus. Somente me despeço em sonhos, distantes da morte. Ao te ver, esqueço que morri, abandono sonhos para sofrer. Sofrer por ti. Sem vida, morte, apenas eu e o meu sofrer: ele não é você. Deixei o sonho, por isso não desapareci: por sofrer. Nado em mim, me reservando à eternidade da realidade. A morte é o entardecer da alma, sem manhã ou noite. O sorrir da alma é um adeus acolhedor. O momento de escrever é sempre. O sol que não desaparece numa poesia não é sol. O chorar não chora, é ausência. Ausência na falta de sofrer esmaga o sol, canta o nada. Beijo a morte com ardor para curar sua frieza, para me esquecer da vida, ao menos um pouco em mim. Cresci, amadureço na morte. Sem sofrer mais. A ausência da morte é triste. A morte descansa no meu olhar, em vê-la. Ela necessita apenas ser vista. Nada a acrescentar na morte. Tudo desaparece no aparecer. Menos eu. Apareço onde morri: em mim.

Suplício de uma solidão

Percebi como sou pouca coisa, na minha visibilidade. Tudo é visível sem existir. O nada encanta a alma. Falta muito para a alma ser o nada: é como um céu sem sol. O céu renasce no nascer eterno. Nada é o fim na existência do fim. O ser sofre com ou sem fim. Deixar a alma no nada de mim é sofrer com a solidão: é ser a verdade eterna da vida. Ninguém se importa mais com a verdade, apenas com existir. Existir não existe sem verdade. Mas quem percebe que necessita da verdade? Eu percebo a verdade encolhe as dúvidas por dentro de mim. Te quero como quero a morte: não posso nada querer. O equilíbrio emocional é morrer. Não falar quando amo é respeitar o universo. É não sentir o amor sentido. A privação de vida é sem a negação de ser. O sentido da fala é ser no não ser, no nunca mais do ser. O nunca mais do ser é amor, é abandonar o nada, como se me abandonasse. Entranhas no pensamento. Nada no ser é pensamento. Ser são entranhas emendadas numa alegria impensada, mas não deixa de ser pensamento. O sonhar é uma alegria contida na ilusão. Se a ilusão fossem minhas entranhas, haveria eternidade, mesmo ela sendo um sonho. Sonhar é ultrapassar o viver para não regredir ao viver. Escapar de um sonho é sonhar ainda mais, perfeitamente só, como uma multidão de nadas, em busca de um único ser. Parece bom viver na escuridão, na falta de um abismo. Assim, a desilusão é uma vitória dos sábios.