Blog da Liz de Sá Cavalcante

A ausência pode ser boa

A ausência morrendo pela razão adormecida. A intensidade da vida tem medo da minha profundidade, mesmo ela sendo ausência. O ser é apenas entendimento de si. O outro não existe como compreensão, por isso, compreendo a vida. Minha compreensão não me compreende, mas eu a compreendo na minha ausência. Não há compreensão maior do que a ausência. Não tem amor pra todos, mas tem ausência para todos, que supera o amor. Na ausência se pode viver. Ser o que se é eternamente, sem nunca descobrir o amor. Às vezes sinto falta de amar, nem que seja em sonhos. Para que sonhar, amar, se posso ser ausente para amanhecer como o sol? Faço da minha solidão a compreensão da vida para que eu não exista mais.

O que somos nós e o que é o amor?

Vê, não somos nós, nem é amor, é saudade de um desconhecer na memória. Não vejo o real nem como sonhos. O sonho demonstra que não há realidade em ser. O tempo flui sem o tempo, assim, ele encontra sua realidade. Que nada infeste o amor, ou lhe dê outra alma. Não há alma para tocar o meu corpo, por isso, não sinto vazio, sinto a morte.

A alma é a única imagem da vida

Se meu ser tiver certeza que a imagem da alma não faltará no meu ser, estou pronta para morrer, mesmo sabendo que a imagem da alma não é a alma. A vida não merece a alma em que vive. O fim do fim é ter uma lágrima de alma dentro de mim. Lágrimas são luzes se abrindo na alma: é o último sol, amanhecer eterno na alma. Quem ilumina o amanhecer? A beleza do amanhecer ilumina o amanhecer, como se o amanhecer estivesse só dentro do sol.

Tenho de ser

Tenho de ser até onde não existo mais na tua lembrança. Ter de ser vem depois do ser. Às vezes respiro no que não sou, por isso, sou apenas eu. Em mim, ser eu é apenas escutar o nada que me torna mais do que sou. Lembra do que sou. Lembra de mim na inexistência, na delicadeza das flores, que é minha inexistência, minha delicadeza. A alma é construída no mar do tempo. Mas a delicadeza de morrer não é construída aos poucos, flui no meu olhar, que morreu antes de mim. O que se faria olhar se tornou o esquecer no nada. Nada trará de volta o meu esquecer. Agora, o agora é este esquecer no meio do nada. Esquecer é ser, amar, enquanto o mar não é meu esquecimento, por isso, o esqueci por vê-lo como mar. Nem o mar me esquecerá, é quando sei que posso fechar os olhos, entregar-me ao mar, sem o mar, sem ter o mar, como existência do meu sol, que não aparece no mar da solidão. O meu sol é sempre poesia. Pode abrir meu sol em poesias sem fim. Destacar o nada do sol é confiar na alegria do sol. É muito sol para uma única vida. Nada se perde na vida, nem mesmo o seu fim, por isso mereço todo sol, toda vida, sem sofrer. Você fez do sol minhas mãos a tocar o infinito. Pena que você, vida, seja intocável, como o calor do sol, que não fica nas minhas mãos, fica na alma, no meu amor.

Na margem da consciência

O que falta na consciência é esta margem sem superfície. Recomeçar é não fazer nada pela consciência, que existe mesmo assim. Não há o nada do nada, nem há eu em mim. Mas existe eu no nada. Alegria e sofrer são a presença do nada na alma. A alegria e a tristeza tiveram tudo no nada, não aproveitaram a oportunidade. Sou feliz mesmo sem o nada do sofrer, sem o nada da alegria. A inquietação da alma é sem amor, como um suspiro de cansaço solto no ar que perdi. Esse ar que perdi era o meu tempo de ser feliz. Nunca mais suspirei, deixei o ar livre, como se algo restasse em mim, talvez seja o ar. Não existe ar na solidão, ninguém pode respirar só. Respirar é o outro em mim. Não me sinto viva por respirar, mas me sinto viva por amar. Amo tanto que fico inconsciente de amor. A febre de amar isola a minha alma da vida. A saudade é o refúgio e a fuga das almas. A alma exterior destrói a alma interior que absorve o tempo no tempo. O tempo se foi como consciência da perda de ti.

Nunca mais

Nunca mais vou amar na plenitude de ser só. Por melhor que seja, esse amor é esquecimento de mim. Amar para esquecer é a tristeza, é a ausência sem dor. Lembre-me da plenitude de viver com esse nunca mais, espanta tua solidão com minha morte.

Fascinação

Apenas o amor pode fazer nascer a eternidade. A eternidade é um pedaço do céu deixado na vida. O nada começa no ser e termina na falta de ser. Sem o ser o nada não pode continuar a existir. É inexplicável a alegria da alma sem o sol. Olhar para não ver a alma. Se tudo fosse eternidade, nada existiria, mas o vazio da eternidade é plenitude. Aprendi, assim, a admirar o vazio em tudo que existe em mim.

Esquecer o corpo

Esquecer meu corpo é morrer no que já foi perdido em mim. As lembranças vagas ou incompletas eu tenho dentro de mim, como se fosse meu corpo. Mas a lembrança da morte é completa e não a tenho como se fosse meu corpo. Ter um corpo é sair de mim para a vida.

Caminho poesia

Neste caminhar de poesia, posso ir onde for, que volto a mim. Amar é caminhar infinitamente, pintar-me de vida, enquanto o sol durar. Nada se ama em poesias, mas eu me amo em poesias, onde Deus consegue me amar até no meu sofrer. Sofrer é poesia! Deixe-me chorar até amar. Vi o tempo no meu sofrer. Preciso ter consciência do nada que não existe em mim, para que o nada de mim cesse, deixando-me liberta do nada. O nada da poesia é essência da poesia. A poesia é essência do nada. Saudade de ter saudade do nada. Para evoluir a saudade, preciso morrer sem faltas, provando a mim mesma o quanto amei e o quanto ainda queria amar. Conhecer o conhecer para suportar o desconhecer da vida que me conhece. Como renunciar o que conheço para o que me conhece? Deixe-me tão desconhecida quanto o amor. Assim, serei apenas luz, cor. Luz é como música, por isso pode me esquecer, vida. Não quero ser uma simples lembrança, quero-te de verdade, vida, inteira para mim.

Consagrar a morte

Consagrar a morte na imortalidade da dor: Deus, que também é alegria até na hora de morrer. Morte, espero-te no amor que sinto, onde a única ansiedade é poder te perder. Ao menos te tenho na minha solidão e não sou mais só. Morte, morrer pra mim é te perder. Morte de sentimento de alma, não me deixe só, como deixou o mar só em suas ondas. Voltaria ao eterno se você não existisse. Mas preciso te sentir, morte, como sendo a eternidade da vida em mim!