Blog da Liz de Sá Cavalcante

Movimentos do mundo

O que vai ser da vida na vida? Perdi a perda na perda de mim. Fora do exterior do ser, não há mundo, não há céu. Mas há o inabalável sem o ser. A inexistência se abala no inabalável. Me sinto infeliz na alma: ela me abandona em poesias. Eu conheço sua ausência, alma, sua respiração de partir. Não conheço sua presença. Te dei o melhor de mim: minhas poesias.

O sol no perdão da ausência

O ser e o nada são ausência de sol, de vida o sol, no perdão da ausência é falta de vida. Morta da saudade da vida, que transforma o vazio em saudade de cinzas. O amor é forte como se fossem as cinzas de alguém, a querer descansar.

Dor impecável

A vulnerabilidade da alma é minha força. A eternidade passada é a alma, a eternidade futura é o ser. A morte é um respeito à sombra.

Alma atormentada

Não me conheço na vida, mas em mim. Na alma me desconheço. Reconhecer a alma, a atormenta. Larga a alma em mim, posso ser todas as almas, todas as vidas. Não posso ser eu. O amor afasta o ser da alma. O olhar é alma que não se vê. Ver através da alma é perdê-la. Perdi a alma sem desaparecer: que desgraça.

Delírio da sombra

Nasci do delírio da sombra para a lucidez do amanhecer. O delírio da sombra é minha reação à vida. Sem reação, delírio também. O isolamento do ódio é a vida na morte. O ódio é só num amor de trevas. Tristezas são vidas eternas, não se pode perder. É imperdível sofrer em vida. O céu não se possui. O céu é céu para as estrelas, mas não é céu para as tristezas.

A dor do esquecimento

Sou minha sombra. Sou o delírio da minha sombra. A dor de esquecer cessa a sombra: não me torna eu. A vida não me deixa ser no meu esquecimento. Queria esquecer que um dia senti algo. Não me sinto anestesiada, me sinto viva por nada sentir. Não sinto que essa dor é minha. Sou o refluxo da vida. Tudo fica dentro de mim, em refluxo. O ser da alma não é o meu ser. Não perceber é ver. Ver é o infinito sem mim. A ausência é a interioridade: foi encontrada em não viver. Nada é real no ser: o ser é real numa solidão irreal. Minha defesa é o meu interior: explica por que vivo. Nada me diz o silêncio da alma: sua inexistência existe como vida, na maciez das palavras que multiplicam o tempo sem eternidade. Ver o tempo crescer, evoluir, é eternidade da alma, não do tempo. Por isso, acredito na eternidade da alegria ao morrer. A alma me faz feliz. Estar unida a ela é um privilégio mesmo sendo para eu morrer: minha admiração por mim, pelo meu amor extremado, começa pela alma. Não termina na alma, mas em mim.

Apatia

Passei perfume na alma, como esperança de escrever. Estou no interior da dor e fora de mim. Não sinto prazer em mim, para escrever. Mas esse torpor é a minha alma, não posso desprezar a alma. Não consigo olhar para a alma, para o amor que sinto. A imagem é a consciência do nada na imagem da morte. A morte me escuta me vendo. O tempo é a morte, que não tem fim. A imagem sem morte não é imagem, nem falta de um adeus: é o que preciso para sentir a falta sem adeus. Me vejo na imagem da morte: apenas para não sofrer. O perfume da alma fez eu me sentir viva, mesmo na imagem da morte.

A poesia semelhante à palavra

Não percebi: estou vivendo. Estou a viver por ser amada. A vida é poesia. A voracidade de morrer é o nada em vez da morte. O não da morte é um nascer eterno. O amor é um exagero, um privilégio que apenas a alma tem. Se a alma me dê um pouco seu amor, eu multiplicarei, o tornarei muitos amores, um melhor do que o outro, sempre se superando, me surpreendendo. O respirar da morte é a vida que nunca esqueci, parece que a vida nasceu dos meus braços para descobrir a eternidade de ser feliz. Cada palavra, poesia minha, tornou a vida o que ela é: a vida somos todos nós. Somos a palavra que a vida não pode dizer: ser, mas, enfim, a vida disse e não se calou mais, transcendemos uma na outra. Não importa o que acontecer, estamos juntas. Até nas minhas poesias de morte a vida está. Não desista da vida, não desistam. Sem ela não há mais nada. Tudo que quero agora é viver, perto de quem amo e sou amada. O amor me tornou eu, de todas as maneiras que há de amar. O verdadeiro amor me escolheu: essa é a única lembrança que levarei comigo. É como se eu fosse eterna para a vida, para o amor. Sempre vou lembrar que sempre sou amada. Seja onde eu estiver: no céu, no mundo, não vou esquecer de ser feliz. Amor, amor, amor…

Necessidade

A palavra desaparece no existir. O existir da palavra é a necessidade do silêncio, excluir o meu ser na palavra é a poesia. Meu eu corporal e a alma, somos o silêncio do silêncio. O silêncio é eterno no corpo, na alma, mas não é eterno no silêncio mesmo. Demora o silêncio a amar, como um tempo que partiu para nascer. Partir é o nada na alma. Ser feliz como a vida é no seu silêncio interior, que fez da fala, ausência. A alma é única realidade numa realidade sem alma. A morte é o amor da alma, o discernimento sem alma, é apenas prazer, mas a inconsciência é o prazer na alma. Meu eu sem mim é a alma. A alma em mim é sem mim. Forçar a existência faz não lembrar da alma, e sim da essência da alma. Não há essência na morte.

Ansiedade

Parte de minha alma se foi sem poesias, sem ansiedade, sem perdas. Estou isenta, inerte de mim: sem a tua sombra, a perseguir minha morte. Deixa minha morte na tua sombra de viver. Lembre-se do sol, de mim, ainda viva.