Blog da Liz de Sá Cavalcante

Voando nas asas do sonho

Não tenho corpo ao voar nas asas de um sonho, a amparar minha morte no amor eterno. Eternidade é ver a eternidade no amor que sinto. Isolo meu pensamento de mim. Deixo-o só, abandonado: estimula o amor. Há estrelas que são pensamentos onde não sei agir. Nunca penso; venero. Admiro, e isso é tudo. O mundo é leve. Como me deixar cair? Não dá para cair em mim. Não me levanto do abismo. O que é bom para mim é bom para a vida. Vivo em sonhos. Como é possível não sentir falta da vida? O que é a falta? Um possuir eterno? Um acolhimento? O espírito do sonho é minha morte. O nada do espírito é o ser. A solidão é o não sentir falta do amor, da minha voz, do meu ser e, ainda assim, não desaparecer. Estou viva pela falta de vida, de amor. Por nada ser o distante, tornou-se perto: pela minha indiferença de mim. Tanto faz estar viva ou morta.

Névoa

Nada me consola. A realidade é névoa. O sonho me vê e eu o vejo, restaura meu corpo em névoa. Morto, é Sol, é vida. O nada ressuscita. O céu são mortes indizíveis. Corri atrás da morte para não a perder. Deus também é vida, fé que vai além do morrer e do viver. Sonho na esperança de Deus. Acredito no amanhecer. Acredito no acordar. Acredito que a sombra da minha ausência se dissolve em lágrimas. O nada vem de dentro de mim, sem o meu interior. O céu deixa o vazio penetrar em chamas. Fogo que varre a morte, leva a morte para lugar nenhum, onde o tempo e o espaço caminham de mãos dadas. Será o fim o começo de Deus?

Sentimento

Para que sentir, se ele escapa da minha alma? Ele foge do meu amor, da minha vida, da minha intimidade. O céu é uma intimidade sem sentimento.

Recordação latente

O lembrar, sofrer puro, torna a esconder a lembrança em uma lembrança. O céu é o interior de toda lembrança. O mundo são lembranças isentas da realidade do ser, isentas do ser. Nada é verdade sem o ser, mas é real sem o ser. Há ser no nada, na recordação morta, por vivê-la.

Desnecessário

Movimento-me sem necessidade até minha alma, a vida, a solidão, que parou; e o corpo movimenta-se pelo flutuar do pensar. É bastante tempo morta. É como se o tempo fosse apenas morte: não é tempo! Tempo é a convivência com a alma. Minha morte foi um instante apenas, sem certezas ou incertezas, sem vazios ou alegrias, apenas o meu fim, em expectativa pós-morte. A incerteza de morrer é a morte. É morrer como sendo o valor da morte. Ver é apenas a morte. Vejo a morte nas coisas que têm vida. Não há crime na morte. Ela não me matou, excluiu-me de si e de tudo. Excluiu-me de mim, tornando-me eu. Será que tenho significado sem eu morrer? Não amar? Não amar são tropeços da alma. Quando eu era apenas um corpo, era feliz, mas ser eu dentro de um corpo é demais para mim. O corpo sem mim é um espaço nunca preenchido, é Deus em mim. Deus é meu corpo; não pode ser minha alma. Minha alma sou eu saindo do meu corpo para o nada do corpo, para não ser só. As oscilações do nada descobertas em um amanhecer sombrio, triste. Nada vivo sem o nada. A presença do silêncio cortante na alma me dá vida. O nada, como ausência, é imagem da falta de imagem.

Morrer são memórias

A ausência não me vê em um morrer de memória. A memória me vê no seu fim, que torna a vida reconhecível. Morrer são memórias, até arder em mim. Reconhecer a memória na falta de tempo, o nada fora de mim, o que sou. Morrer são memórias eternas. A vida sente a memória no adeus. O adeus esquece de mim, do que sou. O nada sem vida é uma forma de compartilhar a vida, o amor. É uma maneira de não voltar ao passado, ser triste. O silêncio sente o seu fim. Quando eu morrer, sintam a minha poesia como compreensão da vida, do céu, das suas ausências, perdas, que são a vida também. A compreensão de tudo é a morte, que não me deixa sem pele. Morrer são memórias na forma de pele.

O saber da alma

A realidade que pensa não existe. A falta da realidade em mim me faz sentir viva, capaz, por não ter a realidade para me esconder. Sou minha própria realidade. A vida é perda se a vivo como alma. Deixo o meu saber para a alma. Eu o deixo com o amor que não possuo. Coisas têm vida, mesmo sem pensar no seu nada saber. Sou frágil ao desaparecer sem alma.

Permanência é compreender

A permanência não é estar sempre aqui, comigo. Permanência é nunca desistir de viver. Nutro-me de ausências de Sol, oscilações da alma, onde apenas permaneço sem estar em mim. Isso para mim é viver, na poesia da inexistência do Sol, onde apenas eu amanheço, plena de mim.

Amanhecer sem Sol

O Sol é uma utopia, um sonho sem sonho, no qual desmaio minha alma. O amanhecer sem Sol é o reconhecimento desse sonho. Sonho de Sol, realidade sem chuva, sem Sol, é apenas a distância do tempo do sonho. O sonho não é real, o tempo do sonho não é real. O sonho não sonha. A morte é uma qualidade insensível do ser, ampara o Sol, antes dele se desmanchar, e o torna o ser do amanhecer. Deixa a alma no debruçar do céu romper a discórdia divina pela união divina. A vida nasce da destruição divina para apenas Deus ser divino. A sensibilidade é a insensibilidade humana, confiança de Deus no amor que sentimos. A insensibilidade é amor. A percepção é uma ausência, não sei se da vida, de mim, de Deus. Conceber o Sol como o exterior do ser, que amanhece sem amanhecer, como um amanhecer jeito de Sol, sem Sol. O Sol derrete a sensação do Sol no calor da mente. O distante é sensível, é a falta de mim, em mim. Nenhum amor traz a vida de volta. A volta do amor é o seu fim. A poesia é um ser que não nasce, coloca sua frustração em mim. Estou anestesiada pelo meu corpo, por ele não me causar dor. Sua dor é minha dor: a poesia.

É inesquecível esquecer

Escrever, parte de mim que não foi esquecida na lembrança de Deus. Fugindo do medo como um Sol amedrontado de amor, nas curvas do tempo. A morte é um pretexto para o fim. O irreconhecível na alma é o seu amor. O nada salva uma vida. A morte de dentro de mim é a falta de me aceitar o pessimismo. Senti-me bem com a morte. Ela coube em mim. A morte é união, não é afastamento. A vida é acorrentada pelo nosso amor. A imagem do objeto desaparece: dá luz à vida. Renasci da morte. Meu corpo é para não sentir o inferno (a vida). Eu não quis a vida: ela me quis sempre mais. Vivo sem me sentir, por isso sinto a vida. Tudo é pouco para o nada. Meus olhos são feridas abertas da vida. Nada vejo com meus olhos. Meu olhar é vazio de não ver e vejo pelo meu silêncio. Esqueço o que não vi, mas existe em mim. Não preciso ver a morte. Não é renúncia, é um adeus perdido no infinito da falta de ver. Assim a imagem descansa, no não ver em mim. Meus olhos permanecem; o ver desaparece na morte, como uma poesia secreta que eu vejo no meu não ver. O Sol se vê na minha poesia. Sou a razão do amanhecer. Conheço o amanhecer pelas minhas poesias.