Blog da Liz de Sá Cavalcante

O tempo da alma

O tempo da alma clareia o sol, na minha luz. Eu sou o tempo da alma, quando a escuridão se afoga na luz da alma, para que escureça o pior da vida, para que o pior da vida seja sem luz. A escuridão mata sem morrer. A luz morre simbolicamente, sem lembrar a vida. A luz nada ilumina. A luz é o vazio, apenas a escuridão me fará me encontrar a mim, na presença da luz. Esqueço a escuridão, já morri como a falta de luz, que não é escuridão. O tempo não é luz, nem é escuridão. O tempo da alma esconde a luz, a escuridão, no ser. Por isso, não diferencio a luz da escuridão, o sentir de amar. O tempo da alma morreu, para não ser luz ou escuridão, mas sinto o tempo da alma no meu agir, no meu amor. O tempo da alma é a vida, que se dá sem nada ter a oferecer. Talvez, eu necessitasse ser luz ou a escuridão da vida, que agora é apenas morte. Mas, continuei a ser, sem luz ou escuridão, achando que algo melhor me esperava, longe da luz e da escuridão, mas consegui morrer estando viva, consciente de que a luz e a escuridão não vão acabar. A luz e a escuridão são tudo que tenho dentro de mim, para disfarçar a solidão. Nunca saberei o que é luz ou escuridão, pois as sinto profundamente, intensamente, que não me importaria de morrer por elas, para não desaparecer para elas no meu adeus.

Catarse da morte (alívio de traumas antes reprimidos)

Eu quero que a morte viva sem o trauma da minha morte, pois a morte nada levou de mim, minha consciência continua sendo minha. Minha alma não sabe que morri, mas sente a minha morte como sendo sua alma.

Queria que a vida me abraçasse, ao menos uma única vez, como abraça o nada

O amor, espere minha morte, como se a vida pudesse me abraçar, como abraça o nada. A plenitude busca uma plenitude exterior a ela. Amar sem o tempo é o mundo, a vida, o céu, as estrelas, que não percebem que brilham, realçam o nada, o tornam magnífico. O que pensar sobre o pensamento? Que ele é uma estrela distante do céu, me une a mim? Mas, como é essa união? De céu? De estrelas? Ou é apenas um precipício amigável? Agir no pensar me tira o chão, me conecta como se eu voasse no meu imaginar. Imaginar não é real nem para o que eu imagino. Para ser, não preciso me imaginar, mas esse imaginar é uma maneira de imaginar o meu sentir, sentindo-o. A alma não cria, ela é o limite de criar, que estabelece o real na realidade. É possível sonhar com o real? O real não é o fim do sonho, é outro sonho, que consigo sonhar só, pela alma, pelo amor que me faz sentir que tudo é perfeito, até o sol desaparecer nas nuvens e eu notar minha imperfeição. Minha imperfeição é perfeita.

A falta é a consciência

Liberta teu amor do nada, quem sabe, assim, há consciência de ti. A falta é a ausência do nada. Não sentir apenas o amor, me sentir quando amo. Sentir o amor por inteiro é aceitar o nada nessa plenitude de amar. A falta é o nada, mais inteiro em mim do que o amor. A ausência do nada é o nada invadindo meu corpo, minha alma, minha tristeza. Amei meu ser inteiro no nada. Nada seria sem o nada. O acalento do nada modificou a minha vida. O ser inteiro é menos da metade do ser. A ausência sem faltas é a consciência do ser. Nada falta na ausência, na presença tudo me falta. A respiração tem que vir da minha presença, mesmo sem ela ser a minha vida. Não há estrutura na morte para erguer o meu ser, há apenas o céu. O céu mantém meu ser, sem pensar na minha morte. O quando da minha morte não é o céu: é a certeza de me imaginar viva, quando já morri, sem o quando da morte. A morte não quer saber por que morri, quer que minha reação de morrer seja minha única morte. Tentei viver mais ainda, mas o impossível se fez em mim, como coragem pra morrer. A morte escorrega, desaba no meu amor. O olhar sem tristeza é minha maneira de morrer na minha dor. Sem me ver morrer, a morte está incompleta. Tenho medo da minha alegria em morrer. O céu é uma alegria que morre, o ser é uma alegria que morre. Apenas a morte é uma alegria viva. A falta é a consciência do amor, numa inconsciência que é mais amor do que amor: é a saudade de viver tanto quanto amo.

Começar sem nada

Começar sem nada. O nada é a única coisa que queria ocultar, é a única coisa que não está oculta em mim. O nada não me isola, me constitui, como se toda companhia fosse o tempo. O meu tempo de ser é sem tempo. O tempo se dedica ao nada, que é o tempo no depois. As idas e vindas da vida são o céu sem o vazio, nem por isso o céu é livre, nem mesmo pelo libertar da morte. Não há antes nem depois do nada. Tudo é o nada, naquilo que me fortalece. A única coisa a lembrar é o nada. Mas, o nada não é o mesmo nada solitário de antes. O começo do nada é o ser, mas o fim do nada não é o ser, é a esperança que renasce como morte. Não comecei sem o nada, comecei sem mim. Por isso, comecei sem a vida, sem a morte, sem o nada, talvez isso signifique não desistir do nada, desistir apenas de mim.

O amor não me torna um ser

Nada me faz ser, nem mesmo o amor. Tudo é reversível, menos o amor. Apenas o amor caminha na escuridão dos meus passos. O amor não me torna um ser, mas me faz viver! A palavra é um instante eterno, onde a vida é um detalhe. Tenho que fazer deste instante eterno a perda da vida, apenas para te ter. Não há vida nas perdas, ninguém vive as suas perdas, vive apenas uma dor sem perdas. O instante não se perdeu na eternidade, ele é a eternidade, que canta baixo pra eu dormir. Morri pelo infinito de mim. Morrer preenche o espaço vazio de viver. O espaço vazio de viver se preenche com as lágrimas da morte. As lágrimas da morte é o tempo de viver.

Tudo pelo nada

Nada perdi do que foi perda. O que é perdido, posso recuperar, o que tenho é a ilusão de ter. O nada não esvazia o amor, por mais perdido que o amor seja, ele pode ser apenas o que é. Tudo faltou ao amor para ser, mas ele é. Esse é é um vazio sem vazio. O infinito não é vazio, mas ele é infinito sem o vazio. No vazio, ele é o fim do vazio. A criatividade do infinito é o fim do infinito, que não é espontâneo, não sabe criar a vida do seu infinito. A vida é o infinito de mim, sem morte, sem o fim de ser só. Ser só é o infinito que o amor não tem. Ser só não é solidão, é viver.

O porvir do ontem

Sem amor, ainda sou eu, é o tempo. O tempo se foi como sendo o meu coração a bater. Ainda sou eu o tempo em que fui feliz, pensando ser ausência, amor. O sonho deixa a alma vazia no ser. A dor de ver a vida é o mesmo que morrer. O porvir do ontem são sonhos que não se perdem no tempo, se perdem em ser.

Escrever é um amor maior que a vida

Transcendo na escrita, não transcendo na vida. Mas, para ir além da vida, tenho que morrer? Ou o além da vida pode estar no amor que sinto? A presença é uma maneira de me isolar. Isolando-me, a vida não se isola. Meu destino de escrever é ter o mundo todo nas minhas poesias, como se eu pertencesse à vida pelas palavras. Deixei de viver para escrever, isso me fez viver mais ainda, me deu forças para permanecer na vida, pelos abraços que as palavras me dão: não são vazios, é eternidade que fica!

A fala da ausência é o ser na falta do nada

A morte na ausência é viver, mas não é presença de vida. O que chama de dor pode ser apenas razão de ser. A coragem das minhas mãos de unir a ausência ao meu corpo, a morte ao meu corpo, até que minhas mãos sangrem por viver. Não me conhecia antes da ausência, já conhecia o sangrar da ausência, sem ti. A ausência não é solidão, é confiar no que sinto. As palavras deformam meu corpo de palavras, nunca o meu ser. Pensamentos não são palavras. Apenas o vazio preenche as palavras. A alma são palavras que virão com o tempo, o ser vai existir isento de palavras, se apropriou do meu pensar. Apenas as palavras sabem o que devo sentir. Não as sinto, lhes dou vida. As minhas mãos sentem falta de si quando tocam algo. A vida são as mãos sem as mãos. A ausência de sentir são minhas mãos que não conseguem tocar o nada. Sou livre como se tocasse o nada, e o amasse apenas como ele é. As mãos nada tocam, são o nascer da alma, que cessa a morte, com amor invisível. Perceber o amor é morrer. Perceber as mãos na inexistência das coisas é viver, sendo todo o meu corpo, não sendo o meu ser.