Blog da Liz de Sá Cavalcante

Aparências táteis (tocar)

Toco a aparência vivendo a alma. Mede o céu pelas estrelas do meu coração. Deixa que a minha aparência descanse na tua. O que é o rosto comparado à aparência? A invisibilidade depende de como vejo o mundo. A visibilidade torna meu olhar invisível, como se fosse ondas no mar. A aparência não tem aparência, mas é por onde vejo o mundo. Vejo o mundo pela minha aparência. Não existe aparência igual à do mundo, por isso a visão não vai até o mundo, o mundo vem até a visão. O amor existe apenas com todos juntos, somente assim o olhar recupera o sentido do ser. O mundo cabe no olhar, onde a vida é esse olhar infinito, que tudo abrange. Deixando-me conquistar a aparência, perco o mundo, o sentir, o nós que existia sem nós.

Ofuscar o nada

Não dá para ofuscar o brilho do nada. O nada é a poesia que se torna amor. O brilho é um olhar que torna a vida mais linda. A paisagem fica nítida, que pareço tocá-la com minha alma, como se a alegria fosse me quebrar por dentro. A paisagem ficou com minha alegria, me dando o amor que necessito. Deixei o meu amor ser minha única alegria, perdida nos abraços solitários de morrer. Transformou meu amor em lenda, fantasia, de um abraço que não se conforma de abraçar a solidão só. Ninguém é só na alegria, é apenas ausência de um abraço, deixa de ser triste como se o abraço fosse desaparecer para sempre, e eu, fora de mim, vivendo de abraços imaginários, superior à vida. Abraço meu próprio abraço, como a vida que se refaz para o amor que receberei um dia. Eu pensei que meu abraço existisse noutro alguém, existe apenas para mim, que devolvo meu abraço à vida, que desaparece sem chorar, como se tivesse sua ausência dentro de mim. Mas, a vida chora infinitamente mais por me ter, onde o ofuscar do nada é o fim da ilusão de viver. Mas, ainda sou tua vida, vida. Mas, sou o ofuscar do nada, que te faz olhar para mim. Me viste, vida, nesse não me encontrar. De onde te espero? Te espero no nada de mim. Te verei no meu desaparecer, como se eu não pudesse ofuscar o brilho do nada, para não ficar sem nada, no brilho do adeus. Onde me perdi no ar, sem desaparecer. Minha sombra me resgatou para me ver morrer em tua ausência, que é o mesmo que morrer nos teus braços, onde nunca mais é sempre vida, sempre amor, para enfeitar a minha morte de vida, e ofuscar do nada, seja a imensidão do infinito, a me enterrar morta pela vida. Vida nunca tive. O amor é como se não fosse morrer. Às vezes, sinto que não morri, que estou escondida no ofuscar do nada. Quando o nada brilhar, sentirei minha presença para que o céu descanse em seu tudo, deixo o nada para mim.

Direito de ser eu

Para sonhar, tenho que morrer? Perceber é falta de sentimento. Ter alma é saber de mim apenas como alma ou não saber de mim. A morte é minha maior recordação. O mundo é sempre a ausência do ser. Alcanço o mundo sem meu amor. Se meu amor pudesse ser o mundo, ele estaria salvo, da ausência de existir.

Como posso morrer por uma sensação que não é morrer

A sensação é um ser esquecido em mim, que não me deixa morrer. As sensações são perdas que se reconciliam no tempo. Sem o tempo, a sensação me deixa morrer, com a alma a florescer de amor nos espinhos da vida. A falta de morrer faz com que eu perca a alma, pela falta de sensação vazia. Não quero a sensação de amar, quero o amor, onde a sensação não pode me sentir. Viva ou morta, não sou mais eu, sou amor.

O nada não se parece com a morte

Quero me esconder onde o céu se esconde, nessa descoberta de viver. Um pedaço do céu não se escondeu, tornou-se amor, que não escondo do meu esconder. O nada é a vida do céu, se parece com meu amor. Se olho a vida, é para vê-la partir nos meus olhos, no absoluto de seu amor. O amor expande o céu sem o infinito. O infinito é tudo que foi perdido, que não precisa de um fim. Quero ter o céu, como sendo a falta de mim. O amor quer se mostrar mais do que é, não chega ao céu.

Mascarar a angústia

Seja como for, nasci antes de nascer, na tua angústia, vida, antes de me ver nascer. Deixo o amor escapar, como sendo a esperança, que tenho de ter tido um amor um dia. Mas, esse dia está cada vez mais distante, não o encontro em ninguém, nem na vida. Aprendi a ser só, como se o amor me procurasse na minha aflição. A profundidade faz cessar o sentir, como se sentir fosse a única profundidade, a única maneira de não ser só. Falta o inacabado, para o sentir ser um sentir. O sentir puro é morrer. Vida, em que destino se esconde teu amor, teu ser, tua vida? O desaparecer é a única presença ainda viva, como uma canção perdida, no tempo, no espaço, no não saber cantar, onde cantar é apenas o pensamento, um lugar para deixar o meu fim.

O amor é fonte permanente do não ser

A alma, não tiveste a mim, mas tens a minha vida. A vida se transforma, mudamos pela vida, permanência do amor. A vida nunca mais será a que foi um dia. Sentir a vida sem vivê-la é ter o exterior da vida no amanhecer. Ninguém respeita a permanência das coisas, da vida. Aceita a permanência como uma falta, perda. Deixa tua lembrança ser tua vida, assim não irei morrer. Permanecer é não ser. O ser não pode se negar, é afirmação da vida. Por que compreender essa afirmação? Reencontrar o nascer da vida na morte. A vida se faz entender no amor, mas o amor não é compreensível. Não dá para dividir o que não sou com o que sou. A inspiração, eu a compreendo quando ela não existe. Existe inspiração da alma. Mas, a alma apenas sabe existir no existir. Tudo que se foi na inspiração retorna como vida.

Voltar

Voltar à distância de mim é me encontrar, sem retornar à proximidade da distância. A solidão é a vida que não foi perdida. O tempo é a ausência do meu amor. O que sinto sem a alma é perto do fim. Se meu ser existisse como a alma, seria eterno de amor. Saí pensando que algo voltaria para mim, perdi a esperança no meu ser. A alma me hipnotiza, como se a falta do meu ser pudesse ser feliz na morte. Eu sou feliz na morte. Eu dou sentido ao meu amor, mas não consigo dar sentido à morte. Não acredito que a morte seja apenas morrer. O amor do nada não quer saber quem sou, apenas porque o aceito como é. A distância volta a surgir como se eu pudesse separar o sol da lua, a vida da morte. A morte do sol morreu sem olhar para a morte, viu apenas o seu amor. O céu escureceu como se estivesse a lembrar do sol. A morte está viva.

Amortecimento da alma (perda dos sentidos)

Esta vida é feliz. Se a alegria não se tornar lembrança, desvanece de alegria. Como ter certeza do que é a vida, se a vida se esconde na lembrança? Talvez a lembrança seja sem a vida, por isso é admirada por nós. Por mais que exista vida, sem a lembrança, a alegria cessa. Me realizar com a vida, mesmo sem vida. A vida para mim é o que existe dentro de mim. Se nada existe dentro de mim, como posso sentir a vida? A verdade nunca é compreendida, é sentida. Mas não sinto a verdade do meu valor. A alegria é a perda dos sentidos, num sentido qualquer. Único amor que posso ter é a morte, ela é como recuperar os meus sentidos e me sentir outra vez. Sentir espanta a vida, cessa a vida. A verdade eterna da morte torna a verdade infiel ao sentir, onde não quero a eternidade, apenas para ter em mim a verdade eterna, morrer. Quem nega o conhecimento não nega a vida. Apenas assim, as perdas do sentido serão a vida do amanhã, apesar dos sentidos, apesar da humanidade.

Dor devastadora

Não posso dar a impressão de morrer, sem morrer. Quando meu ser não se veste de sonho, mas se fantasia de sonho, é porque não há mais sonho, há apenas certezas vazias. Somente me falta morrer, que minha morte não traia o meu morrer! Penetrei na minha pele, tornei-me apenas pele. As flores dão vida à vida pelo resto que restou em mim, é o que faz a falta da saudade de viver, mas eu não sou saudade de viver: sou vida que perfuma a flor, que torna a beleza rara. O que esqueci na rosa lembrei no amor. Lágrimas me preocupam mais do que a própria preocupação. O sufocar é um respirar eterno que detém as lágrimas de si mesmas. Por trás dos seus olhos, a vida, o céu, o infinito, que não são vistos como se devem: como um olhar perdido, que me encontra em minhas lágrimas não no meu ser, que me faz morrer. Morri para saber se posso chorar minha morte, como chorei com a vida. O olhar distorce a realidade, num real qualquer. O real é a sombra do olhar, o irreal é o sol do olhar. Um tempo para chorar não é sofrer. Sofrer é abandonar a dor, como se abandonasse alguém! É um parto sofrer algo, precisa sair de dentro da dor, nem que não seja eu, seja apenas o sofrer! A saliva é uma maneira de respirar só, mas respirar é a saliva, onde engulo apenas solidão! Estou perto demais de mim, para ficar comigo. Neste distanciar, a alma não veio a mim para ser meu pertencimento, tornou-se minha vida. Somente aí percebi que a vida me ama, ao menos por dentro de mim não cedi à vida. Me adaptei à vida até poder amá-la como amo!