Blog da Liz de Sá Cavalcante

A morte é a única coisa que não está oculta na mente

Tudo foi oculto pela morte, menos o pensar, que pensa pela morte. Nada vai perturbar minha alma, enquanto eu viver. Ao morrer, perco o controle da alma, até esquecer que tive alma, pela presença do céu, de Deus. Tive lembranças da morte, inesquecíveis, raras, lembranças mais vivas que as da vida. A voz perdida no amor é sem morte, sem faltas. Tudo é presença na voz perdida do amor. Passei tanto tempo morrendo, que minha única razão é morrer. Não sei o quanto morri, mas sei pelo que vivi. Se tudo fosse apenas morte, tudo teria sentido, e a morte não seria assustadora, seria comum. A febre da morte é a minha pele, a saúde da morte é a minha alma. Criar a morte da morte é fragilizar a morte no que ela existe. As palavras consomem a morte, mas não pela fragilidade, pela força de morrer. Morrer é cada palavra não dita, não sentida. Devem existir palavras para morrer, senão a morte seria inútil.

Extremidade

Um ser dentro de outro ser é ausência absoluta. Mas, até a ausência absoluta não é ausência de tudo. O que é intocável na alma é o ser. Não há ser dentro de mim. É mais fácil morrer em ser, deixando o ser para a vida. Apenas meus sonhos te veem, como se eu tivesse alma. Me entregar ao nada, ser feliz, como se tudo fosse o nada. Lutar é não ter forças para reagir sem lutar. Sou frágil no que me fortalece. O amor não consegue imitar o ser. O ser é superior ao amor em suas ausências. São tantas ausências por viver, que o sol se destaca na imensidão do infinito. O sol, sem amor, sua luz não faz ver o amor, talvez o amor não possa ser visto como amor, o vejo como vida. Eu tentei acreditar na esperança, mesmo sendo falsa, ainda é esperança. O abismo é a esperança. Cair dentro da esperança é ser esquecida como esperança. Não há lembrança que dure como esperança. A esperança é o nada sem o sol. A realidade da alma é vazia, a plenitude é vazia, é apenas uma imagem que não se perde, mas nada significa para a vida.

O autêntico respirar

O autêntico respirar é tão leve, que não incomoda a vida em seus sonhos, o meu respirar é o que restou da vida. Nada será como antes, tudo será apenas um eterno respirar sem vida. Ver é qualquer coisa, ver se concretiza no seu significar, é como voltar a respirar, mas a respirar como alma. Respirar dá vida aos sonhos, dá vida à vida. A alma é um coração em busca do amor que se vê na alma, a alma se vê no amor. Mas um não vê um ao outro como diferentes, mas são diferentes, e amam da mesma maneira. Morte resguardada, como se fosse o infinito em cinzas. A morte é protegida mais do que o ser. Palavras seguem seu destino, sei que não vão me encontrar. Isto é sempre mais, é o infinito das palavras, onde perder é ter. Se não tenho com quem conversar, se não posso conversar, porque é imensa a minha solidão, as palavras conversam comigo, mostram que tudo que necessito é não me sentir só, pois as palavras são a melhor companhia. É pelas palavras que consigo amar, respirar, o autêntico respirar, como se o meu respirar fosse a eternidade das palavras em mim. Respiro, logo existo em palavras, onde a eternidade suspira por mim.

O prazer do esquecimento

Esquecer, lembrança eterna, dura uma vida. Esqueço o inesquecível. Não dá para ficar na lembrança que não me quer. Como lembrar de mim se fui esquecida até pelo esquecer? O mar é a lembrança do esquecimento. A falta de eternidade é a falta de sorrir, de olhar para o outro. O silêncio é uma forma de olhar sem distância. O fim do silêncio é uma eternidade vazia. O fim da morte é sem silêncio, tremula a morte, quer sair da sua voz. O fim é uma maneira de não calar, de não desistir. O fim nasceu morto, como uma morte interrompida pela distância do ser, do amor. Apoiar a morte, lhe dando um fim. O fim não merece a morte. Merece ter vida no que escrevo. Há tanto para escrever, nada para ser. Escrever é mais do que ser. A eternidade de esquecer é muito mais do que eu esperava ter. O silêncio é a concretização do nada, na perda do nada. Decorando a vida com o amor que sinto, afastando a perda do nada, como se fosse minha morte.

A ausência da ausência

A ausência da ausência não é a eternidade da presença, que não é a presença que a ausência quer ter. Chega de eternidade, onde não sou eu mesma, sou apenas fragmentos de eternidade que escapou da eternidade em sorrir.

Extraordinário

É extraordinário morrer como um sonho. É como se eu nunca tivesse tido vida. A solidão é um desejo de agradecer a Deus, mas não me sinto só perto de Deus. É como se o abismo se abrisse para eu não cair. Viver não é extraordinário, extraordinário é Deus em mim. Me sinto morrer sem Deus. Perto de Deus, a ausência do nada é bem-vinda, como se fosse o nada. Para que destruir o nada se ele não é uma ameaça? O tempo é o nada aperfeiçoado, mas aceito o nada sem o tempo, aceito ele como ele é: nulo dele mesmo. O nada não é nada, são as coisas a viver. Extraordinário, as coisas não percebem o nada dentro delas. Talvez, para as coisas, o nada seja sua ausência. A falta que me faz morrer separa o nada das coisas; agora, o nada e a morte são a mesma coisa. Para separar o nada da morte, tenho que dar minha alma para o nada. O nada não pode amar, mesmo com alma. A alma não sente falta de mim, penetrou no nada, isso foi definitivo. A invisibilidade é uma maneira de me ver dentro das coisas, mesmo sem elas serem um fato, existem sem acontecer. Tenho o direito de me perder, para me encontrar nas coisas. O olhar é falta de vida, vivendo vivências vitais, sem a vida. Respirar não depende da vida, depende do quanto amo. Apenas o amor me faz respirar.

Ausência feliz

Nada se conquista por viver. A ausência é uma conquista. Não há ausência na realidade, a realidade não pode viver. Apenas a ausência pode fazer a realidade viver. Consigo comunicar o que as palavras não dizem, sentem, por eu estar ausente. A ausência é um fim sem abismo.

Andando em sonhos

Andando em sonhos, não sei a dimensão do infinito em mim. A falta de amor é eterna, enquanto dura o amor. Andando em sonhos, descubro o fim sem sonhos. A vida é andar sem sonhos, tropeçando de realidade em realidade. Meu olhar desaba, mesmo assim sonha, para se destruir. O corpo sem sonhos não existe. Eu sou a realidade do meu corpo, sou sua única alma. O corpo sem corpo sai de dentro da alma, para o mundo. As palavras perturbam o nada, anulam o ser. O ser não renuncia as palavras como mundo. O mundo não se explica, fica confuso com explicações. Apenas a vida pode explicar o mundo. O amor é um mundo desconhecido, visto como uma ameaça ao mundo. A alma tem corpo: o corpo que meu ser sonhou para mim. Sombras, para viver a imagem do meu ser, é apenas uma maneira de te ver sem encontrar. A falta afasta a sombra do pensar, mas não afasta a imagem. Guardando o sentir, ele se perde. O sentir é distante do corpo. O corpo, fim do sentir, existe na inexistência da alma. Apenas a alma sabe quando é luz ou escuridão, por não ver a luz e a escuridão. Existir para a escuridão é existir mais do que a existência. Andando em sonhos, desvendei o infinito, sem abraço, sem amor. Daria minha solidão pela solidão do infinito. Eu sou só, meu amor não é só, ama. Cuido da solidão do meu corpo com a impossibilidade de ele existir. Para que existir, se sou tão só, que não sinto a inexistência do corpo. O corpo sem vida ainda é um corpo, uma alma sem vida não é mais alma.

Existe algo no tempo que seja o tempo?

Sou feliz, como se o tempo existisse. Conheço o tempo sem o tempo? O tempo não é um adeus, é a continuação do nada, que não me deixa morrer. A existência é um tempo de vida, que não está perdido em morrer. Nada se perde ao morrer, o tempo se multiplica por sensações que o amor da vida não pode me dar. Ficou do tempo a minha essência, que é eternidade do tempo. A alma tem algo a mais, que a vida não tem: consegue captar a ausência de Deus, como sendo Deus. Deus é presença na alma. Minha presença não pode ser Deus, não consigo captar minha ausência, quanto mais a ausência de Deus, que me tornaria eterna de ausências, de amor. Deus, não tenho tua ausência, plenitude, mas te amo mais do que a mim. Mesmo se Deus não existe, eu existo para Ele, pela divindade da solidão. Se a solidão é divina, Deus existe. A solidão é mais do que Deus, é a essência de Deus. A solidão não me torna só.

Entre no meu corpo

Para que meu pensamento entre no meu corpo e o faça seu, é preciso que eu seja o nada, que há entre mim e o meu pensar. Meu pensar me distancia da realidade. Se o real me fizer pensar, o que vai ser do meu pensamento? Quero que o real seja meu único pensamento. Entre em mim, pensamento, seja junto comigo esse nada, que acrescenta à vida o viver. Nada resta do nada, além de viver. O nada supera o ser. Entre no meu corpo, desfaça minha alma, sem eu sentir, faça com que eu morra sonhando com uma alma que eu possa amá-la. Amar para ter alma.