Blog da Liz de Sá Cavalcante

A simplicidade da vida

Morrer por morrer. O morrer da ausência é o absoluto. O corpo é relativo à fala. Nada na fala substitui o ser. O insubstituível é a ausência do ser, que me faz refletir se eu sou mesmo eu. A morte vai me fazer aceitar o tempo. Sonhos são o tempo real. Nada se vive no tempo concreto. A consciência do corpo é a alma, de onde posso voltar a mim. Voltando a mim, percebo a escolha de partir. Partir comigo dentro de mim. A consciência é uma sensação vazia, entorpece a alma. Não há alma na sensação. Há almas que se ferem sozinhas. A beleza da solidão é insuperável. Minha alma é o nascer eterno. Nascer não precisa de mim. O nascer como o sol, a expandir a realidade. Sou mais real do que a realidade. Sou mais real do que a realidade. Sou real até em poesias. Eu acredito que a realidade é amor. Os abraços da realidade são eternos: é como ver a vida no real. O sonho de não ver é real como a realidade sem fé, na fé do nada. A fé é ausência absoluta de paz. A paz do nada é plenitude. Suportar a plenitude na alegria de ser alguém.

Desilusão

A desilusão da alma é o ser. Não existir é pior que morrer. O nada tenta ser nada para amar o ser. Meu olhar pequeno frágil é tudo que há no mundo, mas não é o meu mundo. A alma dividida entre a vida e eu. Nada vem do olhar: o olhar é a vida que tenho. O nada é mais vida que a vida. Tudo que sinto é vida. Mesmo assim, a vida não é o que sinto. O silêncio dá ausência é o amor escondido em mim. Tenho medo de amar, de me perder no amor. Nunca a alma é ausente, mas não sinto sua presença. Olhar o mundo no sim da vida, é não haver mundo. O mundo é a negação da vida. Ter o mundo é renunciar a mim. O mundo sente minha renúncia, eu não sinto. Não preciso ser se há mundo.

Poemas de escuridão

A morte é invisível, faz as coisas existirem, mas esconde a escuridão na poesia. A escuridão vai além da alma. Sentir a alma pela escuridão é um sentimento de valor universal: é amor! Tornar o importante pela essência é o inessencial, se a essência é inessencial, como a plenitude da noite: ela me separa da alma, da essência.

Desencontro

A luz que constrói o universo o destrói em um desencontro de amor. O amor não foi destruído na destruição. Ficaram as sequelas do amor. O amor não pode tornar-se um sintoma. Clareia amor: a escuridão é definitiva.

Reveste-me do meu ser

Cobre meu amor no que fui e reveste-me sem morte, mesmo comigo morta. Reveste-me de ti, mesmo sem amor por mim. Sem o amor ainda tenho a mim. Penso no que não existe: vai além do amor. Pareço feliz sendo a eternidade das minhas poesias. A poesia impressiona pela emoção, não pelas palavras. Palavras são reais na poesia. Eu ia só até a morte: nada se foi de mim: meu coração é o canto do céu, a preservar todas as vidas: até a minha. Tentei fazer do meu corpo o meu ser. A verdade é boa se a vivemos. Deixa o céu mandar na vida, em mim, sem eu morrer. Transcender é vida, nunca morte. Fizeste poesias em minha alma, pela sua ausência. Escrevi, ausente de mim, encarnando o nada da presença na ausência, minha presença é eterna. A alma merece morrer nas palavras minhas. Ela fala como eu. Mas a sombra do silêncio persegue a alma. Pelo gesto, pelo ar, não pelo ser a alma existe. Não existe alma na escuridão. O silêncio transforma a escuridão em luz. A luz é a falta de palavras, de ser. Encaro a luz como a falta de Deus. A luz é a vitória da morte. A luz se perde na luz. Deixa-me partir na luz da imensidão. Almas de luz sem imensidão das estrelas. Tudo precisa acontecer para não acontecer. O tempo desperta a vida, para o seu fim. A alma lentamente deixa de ser não há mais lugar para o mundo e Deus. O perdido é o amor que falta, sempre faltará. A inexistência é um adeus mudo, apenas a morte pode falar por ela. A fala da vida tornou-se imortal com sua morte. Deus a escuta em sua dor. O sonho de fugir para a fala da vida, foi o reconhecimento eterno que Deus existe. A eternidade é o que vou amar nesse reconhecimento de puro Deus. Tudo é apenas uma maneira de se chegar a Deus. Mas eu quero viver: a vida tem sentido dando amor a quem necessita. O céu é inimaginável para mim. Aprendi a amar o mundo, ele faz parte de mim. O silêncio de palavras me fez renascer pra mim, mesmo morta. É como se eu nunca tivesse estado em mim, por isso renasci como o céu da minha alegria. Não sei o que tinha morrido em mim. O renascer morreu em mim, mesmo assim renasci e foi assim que esse renascer infinito me eleva a Deus e torna o sempre de Deus, o sempre de mim. Quanto tempo passei morta, para descobrir este sempre. Estou viva para a vida, para Deus, para o amor e apenas isso é vida. Amor, amor, amor…

Prudência no sentir

Nem mesmo o amor me separa do real. A abstinência do fim cessa o amor. O amor não é o fim da alma, mas é seu início. O começar é a alma, sem ser início de nada. A morte é de vidro, se quebra: uni os seus pedaços, não é mais a morte: são pedaços desconectados, sem tempo nenhum. Não é preciso prudência para sentir a morte. A morte nasce junto comigo. Não vou partir sem morte, nem com a morte. As mãos isolam a poesia. O corpo não necessita de mãos, não as sente. A poesia sente as minhas mãos, no transcender do tremor do meu silêncio. A vida é o meu silêncio sem o silêncio do outro. Buscar o silêncio é tirar sua essência. O silêncio me veste de mim.

Pertencimento

Para escapar do nada, tenho que ser eu, me pertencer. Vou me deixar na ausência do pensar, que me faz reagir ao meu ser: me faz pensar, diluindo as lágrimas na saliva. As lágrimas na saliva. As lágrimas pousam no meu adeus: que é o meu coração que não vive, faz viver, no pertencimento do esquecimento é pior do que morrer. Por mais que o partir seja uma presença é presença solitária. Faço-me presença na solidão. Eu, sou eu, só. Guardei a minha morte dentro de mim, como se fosse minha alma. A alma torna o eterno real. Nada do que sinto é meu, é da alma. A alma é a desrazão da vida. Não posso ficar na alma para sempre: há amor mais verdadeiro que o da alma. Eu não percebo o perceber da alma e, assim, percebo a alma por mim. Percebo que meu perceber é mais do que alma, é vida. Eu achava que tudo fosse vida. Escrever é um novo mundo. A falta do mundo é o fim da saudade de ser. A escrita me escreve, eu escrevo a escrita, assim, vamos dançando no vazio, até tropeçarmos em nossa dor. Corpos soltos, sem dor, dançam a dor do amor. Ao dançar, é como se meu corpo não existisse. Sinto sua invisibilidade na minha existência. A invisibilidade é o olhar: conquista o mundo sem vê-lo. Vejo pela alma. O mundo é o passado, a vida é essência do mundo. O que falta a alma na sua essência é alma. Confiar são restos do amanhecer. O ser é um perfume, deixa a alma sem cheiro, cor, vida. O fim é o interior do interior. A falta do interior é o mundo que é o interior do nada.

Eternidade sem vida

O desaparecer da transcendência é o mundo. A morte que se vê em mim não vê do outro. A alma é a realização da vida numa ausência absoluta, que é viver, que é poesia. Eu escuto a voz da vida como se fosse minha presença. O sonho não tem voz. O interior não escuto sua voz: converso com ele em mim. Encontro a alma na falta de alma: no meu olhar frágil: ele necessita ver algo sem solidão. Solidão é uma força, a morte a carrega em si. Nada mudaria na morte: mas não quero o morrer, o fim. Quero o lado bom da morte, de descobrir outro eu. A alma é para si o outro em mim. Capto a alma sem o meu fim: é o fim de mim, o cessar o fim. Não consigo deixar de olhar de não ter alma. Ver na alma cessa a transcendência da alma: a torna apenas alma que foge de si de vida em vida. A vida é um olhar perdido no olhar de alma, que desata o olhar do mundo: é assim a irrealização da vida. A eternidade sem a vida é me perder para mim no meu suspirar. Meu suspirar é minha fala arrebatada pela morte, no amor que lhe dei. Na morte, a vida é um suspirar que se vê na morte. Não há suspirar na solidão. O espelho envelhece antes de mim. O espelho não é só. O ar se multiplica em vidas inexistentes, que estão vivas no ar que respiro. Respiro vidas inexistentes. Transcender é o vazio da alma encontrando a vida neste seu vazio. Viver torna a alma imortal. A minha imortalidade é sem alma. A escuta é o partir da alma. A alma partiu antes de mim, sinto-a viva. A saudade, única alegria da vida.

A diferença da vida para a morte

A diferença da vida para a morte é que existe apenas abraços com vida. A morte abraça o céu. A vontade de pertencer ao nada é apenas meu olhar a falar comigo, me vendo.

O que vivo é imaginação?

O que vivo é a imaginação ou a minha permanência de tudo, me faz não acreditar na realidade? Como a realidade pode ser amor? Como a falta do amor não é irreal? O sonho é real. Irreal é apenas a morte. O tempo é a ausência de Deus. Há Deus na minha vida, não há Deus na minha morte. Deus é vida. O respirar de Deus é minha vida. O sopro de luz escurece a alma. Ter que viver não é viver. Aprendi a ser só sem a morte. Me mostre sua alma e não saberei mais quem você é. Ou saberia? Não sei se sou eu ou é o meu saber que se anula. O sol não se faz sol, pois se torna saber. O sol é o saber do amanhecer. Mas não vejo o amanhecer pelo seu saber, mas pela sua beleza: é a beleza superando o saber.