Blog da Liz de Sá Cavalcante

Amando meu passado, estou em falta com ele

Minha alma está no seu sangue. Por isto, não posso me negar, por se derramar em mim de amor. Amor, seguirei você quando estiver sem rumo, até o passado voltar, onde não preciso amar você. Amo você na imaginação. Até seu adeus deve ter amor, menos por mim. Eu não sei ficar sem amar. Como suportar ter alma? Nem pelo amor suporto a alma. A alma existe apenas no abandono de mim. Eu deixei de sentir o abandono pela falta de amor. Amor, eu deixo para quem me ama. Abandono-me no amor, amando o amor mais do que a mim. Tantas palavras para não amar o que amo: a vida. Ficar ao seu lado é tudo que não sou, não desisto de não ser. A alma domina o pensar. Não sei se penso, ou é a alma a existir. Há ser que ergue a alma da morte inexata, por isso compreendida. A compreensão da alma é o ser. A falta de alma é compreensão do infinito. O ser é mais infinito que o infinito, se ele quiser. Tudo que acredito é. Meu passado existe longe da lembrança, apenas assim há lembrança de ser. Eu acreditei no inacreditável. Perdi meus sonhos como se perdesse alguém. Vejo as perdas como um sol distante, inacessível, sua inacessibilidade é sua luz. Luz, demore em meus olhos, como se me faltasse o sol e eu tivesse que manter o tempo na ausência de sol. O sol é o coração de Deus a bater dentro do meu coração. Apenas assim, sei que coração é amar. O passado é uma maneira de conservar o amor nele mesmo. O céu é apenas céu quando eu morrer. Não deixo o céu na morte, levo-o no meu amor.

Prudência

Sofrer é eternidade. Mas não faço parte da eternidade, como esta faz parte de mim. É assustador amar. A alegria é o fim da ilusão. Todo dia é dia de ser feliz, por mais triste que seja viver. Saudade, maneira triste de dizer adeus. O adeus da alma é o ser, se ele se mostrar quem é, inconsciente como uma falta de ser? Ficar triste, solução de uma vida inteira. O tempo não deixa ser triste, fico refém da morte, que esconde o nada em mim. Como a morte esconde o nada em mim, se ela não pode sentir o nada? Mostrei-me ao invisível, sem morte, sem sofrer, apenas para me livrar do nada, entregando-me ao sol.

Como posso perder a realidade se eu já a perdi uma vez?

É difícil deixar o amor que sinto se resumir a uma realidade? A realidade é um olhar perdido. A fala é uma ausência que é falada sem ter um nome. A realidade encontra seu olhar perdido na falta de liberdade. Não se pode recuperar a realidade nos abraços de alguém. Sem a realidade, não posso sentir meu vazio interior. O vazio espiritual é a morte. A realidade cicatriza a alma com o sofrer. A alma está boa para ser minha realidade. O que cicatriza também machuca. Minha alma não confia na realidade de ser. Há realidades que se desprendem do ser, da vida, e se sentem mais reais por isso. Chego a temer a sensibilidade da realidade. Não consigo amar essa realidade de um pouco mais do nada, sem nada tirar do nada. A sinceridade do mar é o seu adeus. A vida não é importante como o que me ofereci só. Ofereci-me a mim. O tempo substitui a vida. Nada pode substituir meu amor, mas meu ser foi substituído pela vontade de viver, de não ser apenas um ser que ama. Nada me amaria como amor. O silêncio ama mais do que eu. Por ti, tristeza, esqueceria meu silêncio, minha vida, meu amor. Mas não me esqueço de te ver, com ou sem morte, quero-a intensamente, apesar de toda morte, toda vida. Realidade, regressa ao nada, que te encontrarei dentro da minha tristeza. Será que foste meu único amor, transformado em vidas? Fomos juntas ao conforto do abismo de mim. Mesmo assim, não renunciei teu silêncio. Pelo teu silêncio, tristeza, vejo que não és só. Eu fui só sem solidão. Amor que o silêncio aceita dentro de si, mas eu não aceito. Quem sabe, um dia, eu te veja diferente de mim? Eu acreditei que teu silêncio era de verdade, mas era apenas tua alma a desaparecer. Teu silêncio continua o mesmo, mas mudei no teu silêncio. Passei a desacreditar na alma, na morte, na vida, parece que tudo é apenas teu silêncio, a me envolver numa paz vazia.

A solidão é um olhar atento à vida

Nenhum instante foi perdido em morrer, pois a solidão é um olhar atento à vida. A vida esquece o nada na solidão do meu ser. Minha alma é o silêncio entre nós duas. Um segundo de silêncio é a eternidade do meu ser. Não há como esconder o silêncio de mim, do amor que sinto. Vida, tirou meu momento de mim. Os momentos retornam como morte, podem não ter sido um momento, foram apenas morte. A morte do seu silêncio foi pior que minha morte. Se falar, é apenas a sua distância de mim.

Guerra e paz

Amor é guerra de desistência. Lutar por mim, no que desistir por amor, essa é a minha guerra interior de paz. Guerra e paz, e despreparar a alma para a vida. A vida não é guerra e paz, ela é o ser. A tristeza acaba, sem guerra e sem paz. Deixa-me beber a morte, sem o gosto da água do meu amor. Fico feliz, por perder a alma, em encontrar o céu como sou: frágil, sem alma, em mim. O céu, sem minha alma, é plenitude de viver. Minha alma cessa o céu no meu aparecer. Meu aparecer é ser. O céu das mãos é o tocar invisível de ser, como uma poesia, intocada na alma. O tempo é a guerra da alma. Perder a alma, o ser, a vida, pela poesia é amor. Amor que não se preocupa em ser, em viver. A alma se vê; não me vejo em mim, nem mesmo com a alma me dando motivos para me ver. Tudo desaparece por ser visto. Dou voltas em mim, à procura do meu ser, como se a única saída fosse ser. A vida é a falta de mim; se eu cessar a falta, cessa a vida. A monotonia é uma ilusão. Ninguém consegue amar da mesma maneira sempre, ser sempre o mesmo ser. As coisas, o amor, são sempre o mesmo, muda o que sentimos por eles. Ainda há almas que se sentem, sorriso que me consola, sem me amar. Percebo que amo por nós duas. Não percebo que morri, fui puro espírito sem espírito. Guerra e paz acalmam-me de morrer. Enfim, eu!

A alma vive só em seu sofrer

Eu sofro junto da poesia, a alma não tem ninguém. O silêncio, aparência da alma. Esperar a aparência da alma desaparecer na solidão de um olhar. É como se o olhar da solidão fosse a aparência de uma aparência. A alma existe apenas em si mesma. A lembrança é a falta da vida, que não pode ser uma lembrança. A vida do amanhã nunca será a minha vida. A alma não tem morte, vida, é como uma brisa. Nada é passageiro, tudo permanece pela alma, quando a alma desaparece. A permanência tornando-se alma, para desaparecer como alma, não conseguiu desaparecer. A permanência da alma é frágil para desaparecer. O tempo determina o nada de ser.

A sinceridade da perda

Morrer é força, que se arrebenta na própria força. Sentir falta de morrer é como ter sol no abismo de mim. Nascer do morrer é a eternidade. Há eternidade nos olhos de quem não vê, mas sente. Sente tanto, é como se visse além da eternidade e, vendo Deus, vê que a única eternidade é Deus. O que seria da eternidade de Deus sem Deus? Seria algo banalizado, em vão. A eternidade nunca quis Deus, mas Deus é eternidade, mesmo sem a eternidade. Eternidade, diga-me quem é, dir-lhe-ei amor.

Sinto tua ausência sem o meu interior

A ausência é benéfica sem o meu interior. Interior que não é ser. O interior não necessita do exterior. O nada não sobrevive ao tempo que passou, mas convive bem com o agora. Perder-me em pensamentos cessaria o sofrer pelo pensar. O amor aconteceu sem ausências, vida. Espero pela falta de mim como ausência. Não sinto minha falta na ausência, sinto que a ausência falta a si mesma, sendo o que foi perdido sem mim. Sem mim, não há ausências. Mas não sou ausência de mim, sou ausência para mim, ninguém pode ser essa ausência por mim. Para a ausência significar algo, tem que deixar de ser um ser. Sinto tua ausência sem o meu interior, sem o nada em mim. O nada no nada nunca estará perdido enquanto eu não conseguir sofrer.

Catarse (liberação das emoções reprimidas)

Deixo minha emoção para a morte, que é subjetiva a mim. O deslizar sem emoção tornou-se um mar de amor onde perco a mim, para não perder essa falta de emoção, de amor. Se perco, é porque tenho algo, alguém, que precisa estar perdida: assim, faço uma catarse na alma. A alma não acolhe com abraços, suas palavras vão além de um abraço, além de ser. Minhas palavras se explicam, as palavras da alma amam tudo que se diz sem palavras, isola o abraço do amor pelo chorar. O sofrer parece eterno, como uma folha que cai da árvore. O sono de viver torna a presença possível, como se fosse o último sol a clarear meu coração com gotas de amor. O reconhecimento, a clausura, é a catarse da alma, isenta do ser. Há tantos abraços que poderiam ser o amor. Tive que me adivinhar sem amor. Estou emendada na morte, como sendo algo superior e até irrecuperável. Não recuperei a morte, mas recuperei a paz, que existe sem morte, foi como ver a luz do amanhã.

Desgarramento da consciência (separação)

Separei a consciência do que sou, não de mim. A consciência não me deixa ser, existir, é minha inimiga, sou refém do que não amo. Se não amo o amor, necessito-o? Amor é um vício de ser, que domina a alma, torna-a impura. Impura, como se fizesse o sol nascer. Nada nasce, queima-se sem o sol. Não há sol nas lembranças, mas há alegrias nelas. Eu confio no amor, como se fosse o sol a chorar. Chora, sol, não é o único sol que chora, há também o sol do meu sofrer. Nada é feliz, o amanhecer não é feliz, compreendo a sua tristeza na minha. Mas, sem minha tristeza, compreenderia você?! Amanhecer, você é tão sagrado, que é triste. Sou triste por vê-lo me vendo. Você, amanhecer, é a certeza de que existo no amanhecer mais sublime, parado como uma lagoa nostálgica. O céu não é o amanhecer. Amanhecer é viver, mesmo que anoiteça. Apenas o amanhecer cuida da noite, como de um filho. A consciência é o sol, a chuva, o vento, a tempestade. Aos poucos, perco a memória do amor, como um mar que não seca. A distância aproxima a lembrança da vida. Eu esperaria uma vida inteira para sofrer tudo de novo, apenas assim me sentiria viva.