Blog da Liz de Sá Cavalcante

Como encontrar a vida sem a vida?

O mundo é a sombra da paisagem da vida. Deixar a vida na sombra do mundo é negar a vida pela existência do mundo! A existência e o mundo não fazem parte da vida, fazem parte de mim. Encontrar a vida é tirar a vida da vida sem o semblante assustador do nada a perseguir minha imagem. Imagem não se dá, pois o interior é apenas a imagem da falta de imagem. A imagem da falta de imagem. A imagem não é a vida da imagem. Sua vida está perdida noutra imagem de onde vê a escuridão. A escuridão tem sua dor refletida em sua imagem. O olhar desfaz a imagem do nada, mas não desfaz a imagem da escuridão, que é a morte a me matar com um abraço eterno. Não consigo resistir. Minha emoção não me deixa respirar, mas tira a fadiga de viver. Vou procurar o destino na vida, assim como encontrei a alma na morte, sem me dizer adeus. A lembrança de morte é falta de um adeus. O adeus comanda a vida no que falta em mim: continuar com algo acontecendo ou sem acontecer. O adeus é o mesmo, é a mesma vontade de continuar. Não sei se na vida ou na morte. Sei que, assim, o vazio se dispersa sem que eu tenha que deixá-lo.

Expandir a vida

O fim da morte é a poesia. Expandir a vida, onde o sol se esconde, para que o sol seja meu no meu amanhecer, que é mais que luz, é sabedoria. Pensei que minha vida fosse minha morte. Só assim percebi que morri por dentro de mim! Eu não sou da vida, mas não preciso morrer por isso! Não existo mais nem pela dor. Por isso dou flores para minha morte. Essa atitude de morrer por flores tornou a vida flores. Vida de flores escapa da alma, do amor. Eu já fui feliz na minha imaginação, onde tudo é infinito pela beleza das flores, que se mistura à beleza do meu ser! Nada pode me fazer feliz, então o nascer das flores é minha única alegria, como se fosse uma poesia que não vou escrever, pois já existe em mim. Levo a poesia da alma na poesia da vida. Meu amor está na minha ausência. Por que o resto não pode também ser ausente de mim? Em mim, a ausência é como o sol, mas transcende na chuva da alma, do pensar! Uso o conhecimento para nada conhecer. Assim, a vida flui em paz. Tudo pousa no meu pensamento inexistente. A vida é a inexistência do ser. Conhecer antes era amor. A inexistência é o recomeçar. Esta é minha alegria. Nenhuma alegria é a vida que quis. Lágrimas secas por reviver a vida, sem alegrias. Alegria é deixar a dor fluir num mar de emoções. O sol socorre o céu com amor. A alma surgiu para ser alma sem ser alma. Assim, pensa se vingar de tantas mortes, tantas vidas. O ser não viver para se conhecer. O meu ser vive para amar! O desconhecer, como uma aparência fiel da vida, que nem a poesia consegue olhar para o desconhecer, que devia estar ausente. A ausência se conhece sem passado. Deixa a ausência incendiar a minha pele de fogo, prazer, para que minha pele nunca esteja viva, para o corpo ter liberdade de sentir calor, frio exterior à pele. Por que necessitaria viver como pele? Mesmo sem pele, os ossos, a alma, o olhar em envelhecem! A pele não é um abraço, é por onde deixo de abraçar! As feridas da alma não estão na pele, então por que a pele grita, dilacera? Talvez minha pele seja alma. Me sinto superior à alma: sou eu a contemplação da vida! São tantos os recomeços, mas nenhum é morte, vida de mim mesma. Há muito mais para ser sem mim. Quero ser livre para morrer, para que a vida cante para mim, como os pássaros cantam em mim, com o silêncio da minha voz. Que ela não comunique o inferno que é a alma sem dor. É como se nem os pássaros quisessem cantar minha dor. Mas meu silêncio tem a voz que canta internamente em mim, como o sol que vai se pôr para o nunca mais, onde a liberdade deixa-me só, na luz do sol. Nem a luz do sol dá um fim à solidão. A solidão não precisa de luz para me sentir. Ver é deixar de sentir por uma ilusão que vive como sente, mesmo na falta de amor! O amor não sente falta de nada, mas não é absoluta, como apenas a morte pode ser.

A diferença entre a verdade e o significado

A alma não é secreta. Fica exposta à vida, ao amor, à morte. O sol espera o céu acabar para se expor sem evidência de existir. O significado não prova que a verdade é verdade! Estou leve, solta, como se estivesse sendo inexistente a mim. Não há significado para a razão! Nada significa apenas para significar algo para si ou para alguém. Significar é ter valor. Nada ama mais a vida do que o seu significado. A vida, quando tem um significado, é para sempre esquecida. Não é fácil lembrar da vida, se puder esquecê-la. Como se eu soubesse viver sem a vida! Perder minha sombra noutra sombra, não no sol, que fez a sombra como pretexto para me ver. Há mais a amar do que o amor. Não há ninguém que substitua o amor! Almas são desencontro mortal de viver. Tudo vivo pela alma sem a vida. Instantes são almas ainda vivas, momentos são almas que morrem!

A desgraça de ser feliz

Não preciso compreender que minha aparência é o que sobrou da vida, desde que a aparência se desfez em lágrimas. Fui feliz apenas para não ter aparência. Um dia quis ter aparência como se a vida pudesse me esquecer pela minha aparência. A vida cessa rápido, em várias aparências. A aparência é a morte. Há mais alma na morte do que no ser! Sou a maior vitória da aparência. Em mim, a aparência cessa para eu querer ter aparência. Foi ao abraçar a morte que me senti viva, ficando na aparência desse abraço, até que seja possível que eu exista mais pela morte do que por mim. Ser feliz é morrer. A aparência da aparência não é morrer. Aparência da aparência é a falta do olhar. Aparência da aparência é a falta do olhar. Livre da escuridão profunda do ser que torna o invisível aparência. Mas a aparência torna o invisível invisível. O amor é tão nítido na alma. Quando amo, não vejo meu ser. Vê-lo como se não o visse. A alma é invisível na ausência do corpo! Pelo corpo, vejo minha alma a dançar, exterior ao corpo, ao mundo. No que não se vê, está apenas a ausência, sendo vista no que não se vê: é a verdade da aparência da alma. Dor e alegria, vida e morte, tornam o corpo corpo. Tudo o que posso fazer pela alma é ter um corpo. Mas minhas alegrias, dores, nunca serão amor pela alma, é angústia de ter alma! O corpo boiando na alma, alheio a si, me deixou viver pelo seu descaso, que não é esquecer. É a alma absoluta, a negar o corpo, morrendo pelo corpo! A morte afundou-se de tanta vida. A alma adoeceu do corpo, que nada fez vendo o corpo morrer. Tudo cessou num silêncio eterno de amor!

A vontade não pode querer-se como verdade

A vontade nunca se tornará verdade. Ela tem um querer que a verdade não tem. A verdade nada quer do outro ou de si mesma, nem se assume como verdade. Espera que os outros percebam sua existência pela consciência do meu ser. Não deu para surgir nem como cinzas, tamanha a minha intensidade. Estou surgindo e existindo nesse desaparecer eterno. A alma é o desaparecer súbito da morte. A vida se fez alma. Minha alma tem o ventre infecundo, mas cheio de amor. Nunca saberei cuidar nem de mim mesma, mas ainda posso amar como se cuidasse dos outros e de mim. A existência não me deixa só, nem nas ausências, nem na dor, nem em mim. Assim, a existência se torna a minha existência! Pelo mundo real, não tenho alma, apenas em lembrar da alma. É como se me assemelhasse à alma. Não há alma na morte. Por não ter alma, venci o medo. Não tenho alma. Não posso chorar sem a minha ausência. A morte é a ausência definitiva de que não existo! Não estou me retirando da vida. Estou pensando! Preciso de um momento sem a vida para conseguir refletir a vida. Ela nunca está só, mas a sinto só, como uma palavra solitária que ninguém fala: a morte! Se nada de bom me acontecer, algo de bom acontecerá à morte, que aprendeu a sentir pelas minhas poesias. Ela ainda não ama, mas sente o amor sem amá-lo.

Incognoscível (que a inteligência não consegue compreender ou atingir)

Nada da consciência se reduz ao nada. Atingi a morte por não a atingir. Ela não compreende o que me faz feliz, não me faz viver, sorrir. Tenho mais a perder na alegria do que na dor! Não me importa perder tudo, morrer, desde que eu fique feliz. Deixar o passado é morrer. Como morrer de uma morte inexistente, que não me lembra de viver? Nada é compreensão. Compreender é morrer, antes que meu último brilho se apague, transformando o infinito no finito, onde o fim não é o mesmo finito. O fim tem alma. O finito vive em busca dela. O inexistente torna-se imagem. Minha alma, presa nessa imagem como uma liberdade a fluir sem imagens, sem destino. Mas tudo na liberdade se parece com a vida. A vida com nada se parece. Teve que ser sua própria aparência. Quando me vejo, perco toda imagem, toda referência de vida! Viver sem imagem é ter imagem. Quero agarrar a morte sem o auxílio da imaginação. Quero-a minha antes de eu morrer!

O que sinto além de mim?

Que falta faz a ausência no amor. É uma falta tão grande que me dá paz. A ausência é absoluta com você. O que mais posso querer? Escrever é minha alma, onde ninguém a sente. Nem a minha solidão quer sentir minha alma. Minha vida é minha alma. Nada preenche a alma, além do vazio que ela finge não sentir quando me sente. Mas o que a alma poderia sentir por mim? Em mim, a alma se sentiria amada? Nada pode faltar. Nem a ausência do tempo, nem a vida, nem o amor, nem a falta que o tempo sente de si mesmo. Por isso não sinto falta do tempo, que podia ser encontrado no que vivi, sem perceber que vivia sem o tempo. Do tempo restou a mágoa de poder fazer do tempo o que eu quiser. Posso amá-lo. Ele ainda se sentirá desolado! Desisti do tempo antes de ele partir, como lembrança de depois! O brilho da ausência é sem sol. A ausência é a falta de eu amanhecer!

Meditações aflitas

Morrer me colocou no mundo. O mundo supera a vida! A vida é para mim sem eu ser nada para ela. A vida é pura, mais simples do que a simplicidade. Ninguém sabe mais como é a ilusão de vivê-la. Mas a ilusão sabe porque me ilude. Talvez a realidade não seja suficientemente boa para o meu sentimento, que é por onde não dói a ilusão. Descobri pela ilusão minha verdadeira aparência verdadeira. O ser não morre pela morte, morre de si mesmo. O fim da vida é o ser que torna a vida incapaz de morrer por mim, em mim! As faltas de erros não são perfeição, são o ser em busca de si! O amor não pode ser um erro, talvez a vida tenha errado com o amor. Pensando na inexistência de mim. A inexistência me percebe pelo que não sou, e assim sou para que a inexistência não me perceba sem mim. Apenas minha alma pode perceber que não existe, pois ela também não existe. A vida não é minha existência. A vida é como eu a sinto. A vida era irreal para mim, mas aí aceitei minha dor, e desde então sou feliz, como um pássaro que não tem o céu para voar! O mar que não leva a dor, onde ela tem que ficar. Nem a eternidade pode trazer a dor de volta para mim. A liberdade de ser a liberdade de ter a realidade, como se fosse alguém. Quando a vida vai de encontro ao mar, o mergulhar de incertezas é meu ser a se encontrar sem nenhuma realidade. A única realidade é o amor! As meditações continuam aflitas, tentando amar como se fosse impossível amar! Amo, pois nada me importa em amar. Mas necessito amar como se a esperança de amar fosse o céu. O céu deveria deixar umas estrelas nos meus sonhos. Não desaprendi a amar por sonhar. O sonho torna o amor mais lindo, mais real, como um desinteresse pela vida. Olhar as estrelas é minha vida, onde a presença do sol se faz de estrelas!

Tão livre quanto existir

Faz tempo que vejo a vida com olhos de vida. Não vejo a vida com meus olhos ausentes. A vida faz dos meus olhos o olhar que embeleza a vida de sonhos. Os olhos sonham de olhos abertos. Preciso trazer a vida para os meus sonhos pela força do olhar, que não tem a força da vida, mas também é infinita sua força. Quando as duas forças se unem, surge o céu, criado por Deus, pelo amor humano e pelas ausências, que nem sempre são o ser, nem sempre são Deus. A alma de Deus não tem ausências nem presença. Ela é o próprio Deus. Mas Deus sem alma, sem amor, é o mesmo Deus. Continuaria a amá-lo até pelo que ele não é!

Manifestações da alma

Nunca houve manifestação da alma. Tudo sofre e vive só, sem a alma. A claridade se perde no vazio do sol. Se eu não olhar o mundo com meus olhos, o mundo parece acabar pela vida que tem. A eternidade destrói o esquecimento destruindo o ser! Vida jogada fora no exterior do sentir. O vazio não esquece a companhia de si mesmo, como um renascer do sol emprestado de ternura. O que é o real, quando eu o vivo dentro de mim? Eu não sei o que fazer com a vida. Quando ela me abraça, parece que me compreende sem falar ou escutar. Como minha lembrança pode ser sua? O amor não decidiu ser amor. Distanciando a vida, como resto de esperança que não foi vista como esperança, foi sentida como vida. As tentativas de viver já são uma vida. Apreciar a escuridão é sair de dentro do abismo, que é como se fosse o sol a me devolver a mim pela escuridão do sol, onde a noite aparece sem me tirar essa sensação de vida, de paz. Um vazio infinito no meio do nada, a fazer do amanhecer o meu sorrir pelo sol. Sorrir para o sol é melhor do que ter o sol. Quando eu abro os braços para o céu, sinto a luz do sol a banhar meu corpo de luz. A alma é uma maneira de sentir o sol mais uma vez, como uma vida que se foi sem ter sido.