Blog da Liz de Sá Cavalcante

Vazio respirável

O vazio volta como nada. Nada é o vazio respirável de ser um adeus. Se eu soubesse desse afastamento do adeus, não me despediria desse adeus. A despedida é um respirar eterno, o adeus é o fim do respirar. A angústia de respirar é a alma em chamas, é a certeza da vida. A morte é o amanhecer. O amor está entre o ser e a morte. Eu estou entre o abismo e o sol. O sol logo cessará, terei apenas esse abismo para me proteger, me enfiei, desabei no abismo para não me sentir sofrer. Em vez de não morrer, morri mais ainda por não sofrer. O vazio é respirável, o sofrer não é. Olho o nada pela desatenção da vida, penso ver a vida no nada. Mas não é esse o nada de mim: o nada de mim é meu amor sem ausências. O nada conforta a ausência, assim vão nascendo os dias sem vida.

Inevitável

A fala é sem palavras. Nada para dizer às palavras. Elas me dominam. Alma são remendos do ser. A alma não supera a alma, por isso, a alma ainda sonha. Ser não é existir, ser é defender a morte. Eu me desprendi da alma no silêncio sem fuga. Que alma viver em mim? Meus pedaços se tornam amor de quem não necessita de amor: a solidão. A morte se destaca numa luz de vida. Assim, a morte é saudade de ver, mais do que de viver. É olhando a vida que me aproximei das palavras. Sem a vida não há palavras. Eu sonho com palavras, acordo nas palavras. Morri, continuei vazia, esperando que o amanhecer morresse em mim, como tudo morreu, como se fizesse amanhecer nas minhas lágrimas, dormentes de sono, e eu sonâmbula de amor. Não dá para terminar a poesia no amor de ontem. Ontem é mais importante para o amor do que para mim. Mesmo assim, o amor é esse agora. O momento se dissolve em palavras. Palavras são a compreensão da vida a desfazer o tempo num abraço sem corpo, sem alma. O abraço é quando corpo e alma desaparecem juntos. Meu ser é o amor que sente por mim. Se a alma passar do limite por morrer, o limite se acusará como sendo morte da alma. A vida é o limite de Deus. Ingratidão o amor amar como se fosse eu. O amor não necessita ser absoluto como uma rocha a afundar na água. O tempo, a espera, são o amor que tenho. Tudo permanece na falta de amor. A vida, a me tomar nos braços, diz que sou sua. Foi assim que morri: nadando em vida. Confiar é morrer. Falando como alma, me sinto não ouvida. O pensar transcende o nada, renovando a alma. Tudo que vivo é o desconhecido, como se meus sonhos, minha alma, tocassem tão fundo minha alma, num desaparecer eterno, onde fica apenas a mágoa de ter sido. O olhar nada tem a dizer, a viver. Vivo a sombra do meu olhar, num sol cego pelo olhar. O sol amanhece vendo, deixa sua cegueira no anonimato. Tão quieta a cegueira, parece não existir. Eu percebo a sua existência pelo seu amor. Existir me faz morrer. Tudo se termina sem o fim.

A distância da vida não me une à alma

A escuridão pertence ao nada, me une à alma. Deixa a saudade embriagar o ar de pedra para a saudade não partir na brisa do esquecimento. Deixa o ar voltar pela saudade de ser alguém. Deixa vibrar a ausência de vida. Cheguei sem partir. O céu partiu nas cores do perdão. Chora, vida, que o imperdoável continua no silêncio acolhedor. Para acolher o acolhedor, é preciso saber o que dizer à vida, em plena solidão. Nenhum momento é só, o ser é só. A falta de mim é o infinito me abraçando. Não há infinito sem o meu adeus. Minha presença é alma. A melodia da minha presença se cala numa canção infinita: é como não ter vida nem morte. Sou pura alma que me encanta, como uma presença alheia a mim, este é meu caminho, de alma, de amor, onde sou tão feliz, que deixo meus sentimentos. Na alma, para ser feliz, no nada do esquecimento, onde tantas vezes fui alma: sou um nada feliz, que expande o universo, onde me encontro despida de vida, sendo pura e simplesmente o nada que penetrando sua morte, descubro que, mesmo sendo nada, sou a mais feliz de todas: não tenho esperança, pois me entrego à alma, sem o fim. Quer alegria maior? Tente amar como minha alma, e tudo será perfeito, até não te amar é perfeito. Enfim, eu!

Morte sórdida (que usa meios degradantes para atingir o fim)

A vida não se deixa captar. A alma é a inessência da vida. A falta de essência é lucidez. A alma fraca, frágil, num amor infinito. Não há infinito sem amor. Morrer no infinito é não morrer. Desconheço o fim da morte. Para mim, a morte é sempre. Sempre mais.

Sentimento mutilado

Ser é abstração de ser. A solidão é esquecida se eu for só. O sentir é mutilado pelo próprio sentir. Mesmo assim, o sentir sente como se estivesse inteiro. Não há nenhuma forma de sentir sem sofrer. O sofrer é como um sonho. Por isso, não preciso sonhar em sofrer. A alma não é determinável como alma, a vida é a indeterminação sem alma. Amordaçada pela alma, pelo seu silêncio. Sorrir é silêncio. Fui colocar a vida na vida, olhando, contemplando o nada. Contemplar o nada traz paz. O medo traz paz. A paz mata. A paz desaconselha a ser feliz. O sentimento mutilado, que é o meu sentir, me salvou a vida. A vida do esquecer é a lembrança. A lembrança de ser feliz é amor. O que sinto sem amor? O amor me ajuda a esquecer tudo que a vida não pode ser. Mutilaram meu sentimento morto, inacabado. Tudo que sei é sem vida. Não há infinito na morte. O amor sofre de medo de alma. A alma não resiste ao amor. Amor, cobrança da alma. A morte é possível apenas pela presença. A presença é a morte. Vivo apenas no meu olhar. Tudo que olho ganha vida. E eu, perdendo a vida. Mas perder a vida por uma presença é um privilégio: talvez essa seja a presença de Deus: não ficar só.

O amor transforma a realidade sem amor em amor

Acomodei-me em pensar, não sei ficar sem pensar. Pensar faz parte da alma. Perco a alma por pensar. Pensar reinventa a vida criando o nada. Nada me fará pensar sem pensar. Ver impede o sentir. Olhar para o outro, sem palavras, é morrer. Nada quis da alegria. Por isso, tudo é feliz, como se a alegria fosse presença de algo. Tudo é feliz nas palavras. Minha tristeza é sem palavras. Defino a tristeza sem alma, sem senti-la. Defino a tristeza como o ar que respiro. É triste o respirar, é ser só. Respiro, vivo, por ser só. Sentir é a saudade de não ser, para ser o sentir. A alma encanta a solidão. A solidão, nua, não é mais solidão. A alma é esquecida na solidão. Não necessito do amanhecer como necessito da solidão. Respiro solidão. Tentar não respirar a solidão é criar um abismo entre mim e eu. Eu, para um abismo. Deixo o bom ser o descaso da vida. O nada pelo nada não é o nada. Se o nada é a imensidão do infinito, meu fim é o nada.

Aderir (juntar)

A alma é muito diferente do ser, não aderem uma à outra. O que fica no ser é a existência da alma sem a alma. Existir é uma defesa da alma. A alma se defende de si mesma. O vazio que sinto é a alma sem defesa. É surpreendente o vazio da alma em mim, é um descanso para o meu amor. Não há amor maior do que a poesia. Olhar para a alma torna a vida eterna. O sol não tem a eternidade da alma. O amanhecer é falta de alma. Ter consciência é morrer. Morrer pela consciência é transcender sem morrer. Morrer preenche o vazio. A vida fez do vazio esperança. A esperança deixa o espírito adoecer nas lágrimas. Para o ser se esgotar nas lágrimas do espírito, tenho que viver no vazio. A acessibilidade do vazio emociona como um vidro que se quebra em seus pedaços. Despedaçar a ausência de pedaços é a eternidade de viver sem alma, tudo está inteiro. Eu já me alimento de alma, não posso ser alma, ou já sou a alma? Mas que alma alimenta a alma? Não há certezas, há alma. Talvez a alma seja a única certeza. A alma é o destino do meu ser. A alma morre comigo para não deixar de existir. A luz da eternidade substitui o céu. Tudo vejo na luz da eternidade, nada vejo pelo céu. Nunca vou superar a falta com ausências. A alma em mim me dá náusea. A ausência de mim é o conforto dessa náusea. A náusea mantém a alma viva, realizada. A alma vomita a náusea, a náusea vomita a alma. Resta apenas este instante perdido. O instante não é só, por isso, se perdeu de mim. A luz se inspira no escuro, como sendo uma nova luz. A luz dos meus olhos é o amor sem luz. A falta de luz no amor é o meu viver. A vida escapa na luz. A luz não ilumina a vida. Vida é escuridão. A alma pode ser uma palavra, um abraço, o adeus voluntário, mas esquece-se de se abraçar, se amar. Amo por mim e pela alma. O adeus se desespera por se tornar alma. A alma tem prazer no adeus: de recomeçar no adeus e terminar no adeus. Sinto o adeus da alma, compreendo como o nascer do espírito. Sem adeus a vida seria pior. Não poder se despedir é a pior maneira de viver. Um dia trarei a alma comigo, para minhas poesias, me falta força, mas com determinação. Me expresso como morte. A alma é uma conquista diária, para sempre. Nascer ou morrer é conquista de eternidade. A eternidade se conquista só. Não há eternidade em ser feliz. Ser feliz é tornar a eternidade o fim. A morte é o movimento do pensamento que funciona apenas na morte. A morte faz o pensar existir. Eu deixo a vida passar por mim, como sendo o pensamento que não tive, por merecê-lo. Pensar é deixar a vida falar, sem agir amor. Deixa meu pensar na minha ausência. Amo minha ausência me vendo ausente. Minhas promessas de vida são ausências do nada. O nada, sinto como se fosse minha ausência, na imagem de outro alguém.

A alma para um rompante de sensibilidade

Esta irreflexão, única sensibilidade que não me deixou só no sofrer. Sofrer é falta de sensibilidade. Ser sensível é captar a vida. Não pude fazer nada pela vida. A alma sabe como deixar a vida sem a magoar. Alma, foste a idealização de um sonho. Não sei sonhar livremente, como a escuridão que se apaga sem luz. Eu fiz do suspirar minha vida, minha voz. Suspirar é o encanto de ser. Suspiro como quem respira. Quem fala não consegue respirar. Mas o ar é nocivo. A respiração tem vida própria.

Ausência divina

Sem alma a alma se foi pela ausência divina. A ausência é mais essencial que a vida. A vida é a única ausência de Deus, por ser pela vida. Não há ser no ser, nem há ser para o ser. Apenas a ausência determina quem sou. Não há ausência na minha ausência. Quero ser todas as ausências, todas as vidas. O esvair sem ajuda da ausência divina foi como o céu pra mim, em mim. A perda do tempo é o limite do nada. Sem o nada não há perda do tempo. Não há vida no nada. O nada é a chegada de não partir. Não partir é o nada.

Saber é suficiente?

O amor sempre viveu sem mim. Mas eu não vivo sem amor. A vida se foi num amor sem infinito que não senti nem em sonhos. Mas essa tranquilidade deve ser amor. Saber é um amor mais puro, real? Se eu morrer, nada perdi. A vida não quer ficar sem a morte. Tudo esqueço do que não perdi, por isso, não perdi a alma. A alma se pendurando em mim, ninguém a tira de mim. Há vida sem o amanhã: assim despertou meu sentimento por mim. Nunca havia me visto antes em mim, por mim. Fiz da alma desalento. Não me afeto de tristeza: eu sou a tristeza da vida. Ser a sucessora do meu amor não me agrada, nem eu posso substituir meu amor. Não sei onde estou quando amo. A vida é vivida aos poucos. Chorar deixa a alma seca, vazia, como se eu pudesse escutar o meu sofrer. O abismo sou eu em mim. Tenho que sofrer o insofrível, por isso, eu sorri como se algo existisse no meu sorrir. O ser se desenvolve a sorrir, nasce sorrindo como alma. Sou tão sincera que não consigo viver. Se a vida é uma mentira, o que é a verdade? A verdade é um engano, onde o ser sofre dele mesmo, em busca de uma verdade de que não seja meu próprio ser? O ser se fez em mim pela verdade do ser. O real é muito mais do que saber de mim.