Blog da Liz de Sá Cavalcante

A vontade não pode querer-se como verdade

A vontade nunca se tornará verdade. Ela tem um querer que a verdade não tem. A verdade nada quer do outro ou de si mesma, nem se assume como verdade. Espera que os outros percebam sua existência pela consciência do meu ser. Não deu para surgir nem como cinzas, tamanha a minha intensidade. Estou surgindo e existindo nesse desaparecer eterno. A alma é o desaparecer súbito da morte. A vida se fez alma. Minha alma tem o ventre infecundo, mas cheio de amor. Nunca saberei cuidar nem de mim mesma, mas ainda posso amar como se cuidasse dos outros e de mim. A existência não me deixa só, nem nas ausências, nem na dor, nem em mim. Assim, a existência se torna a minha existência! Pelo mundo real, não tenho alma, apenas em lembrar da alma. É como se me assemelhasse à alma. Não há alma na morte. Por não ter alma, venci o medo. Não tenho alma. Não posso chorar sem a minha ausência. A morte é a ausência definitiva de que não existo! Não estou me retirando da vida. Estou pensando! Preciso de um momento sem a vida para conseguir refletir a vida. Ela nunca está só, mas a sinto só, como uma palavra solitária que ninguém fala: a morte! Se nada de bom me acontecer, algo de bom acontecerá à morte, que aprendeu a sentir pelas minhas poesias. Ela ainda não ama, mas sente o amor sem amá-lo.

Incognoscível (que a inteligência não consegue compreender ou atingir)

Nada da consciência se reduz ao nada. Atingi a morte por não a atingir. Ela não compreende o que me faz feliz, não me faz viver, sorrir. Tenho mais a perder na alegria do que na dor! Não me importa perder tudo, morrer, desde que eu fique feliz. Deixar o passado é morrer. Como morrer de uma morte inexistente, que não me lembra de viver? Nada é compreensão. Compreender é morrer, antes que meu último brilho se apague, transformando o infinito no finito, onde o fim não é o mesmo finito. O fim tem alma. O finito vive em busca dela. O inexistente torna-se imagem. Minha alma, presa nessa imagem como uma liberdade a fluir sem imagens, sem destino. Mas tudo na liberdade se parece com a vida. A vida com nada se parece. Teve que ser sua própria aparência. Quando me vejo, perco toda imagem, toda referência de vida! Viver sem imagem é ter imagem. Quero agarrar a morte sem o auxílio da imaginação. Quero-a minha antes de eu morrer!

O que sinto além de mim?

Que falta faz a ausência no amor. É uma falta tão grande que me dá paz. A ausência é absoluta com você. O que mais posso querer? Escrever é minha alma, onde ninguém a sente. Nem a minha solidão quer sentir minha alma. Minha vida é minha alma. Nada preenche a alma, além do vazio que ela finge não sentir quando me sente. Mas o que a alma poderia sentir por mim? Em mim, a alma se sentiria amada? Nada pode faltar. Nem a ausência do tempo, nem a vida, nem o amor, nem a falta que o tempo sente de si mesmo. Por isso não sinto falta do tempo, que podia ser encontrado no que vivi, sem perceber que vivia sem o tempo. Do tempo restou a mágoa de poder fazer do tempo o que eu quiser. Posso amá-lo. Ele ainda se sentirá desolado! Desisti do tempo antes de ele partir, como lembrança de depois! O brilho da ausência é sem sol. A ausência é a falta de eu amanhecer!

Meditações aflitas

Morrer me colocou no mundo. O mundo supera a vida! A vida é para mim sem eu ser nada para ela. A vida é pura, mais simples do que a simplicidade. Ninguém sabe mais como é a ilusão de vivê-la. Mas a ilusão sabe porque me ilude. Talvez a realidade não seja suficientemente boa para o meu sentimento, que é por onde não dói a ilusão. Descobri pela ilusão minha verdadeira aparência verdadeira. O ser não morre pela morte, morre de si mesmo. O fim da vida é o ser que torna a vida incapaz de morrer por mim, em mim! As faltas de erros não são perfeição, são o ser em busca de si! O amor não pode ser um erro, talvez a vida tenha errado com o amor. Pensando na inexistência de mim. A inexistência me percebe pelo que não sou, e assim sou para que a inexistência não me perceba sem mim. Apenas minha alma pode perceber que não existe, pois ela também não existe. A vida não é minha existência. A vida é como eu a sinto. A vida era irreal para mim, mas aí aceitei minha dor, e desde então sou feliz, como um pássaro que não tem o céu para voar! O mar que não leva a dor, onde ela tem que ficar. Nem a eternidade pode trazer a dor de volta para mim. A liberdade de ser a liberdade de ter a realidade, como se fosse alguém. Quando a vida vai de encontro ao mar, o mergulhar de incertezas é meu ser a se encontrar sem nenhuma realidade. A única realidade é o amor! As meditações continuam aflitas, tentando amar como se fosse impossível amar! Amo, pois nada me importa em amar. Mas necessito amar como se a esperança de amar fosse o céu. O céu deveria deixar umas estrelas nos meus sonhos. Não desaprendi a amar por sonhar. O sonho torna o amor mais lindo, mais real, como um desinteresse pela vida. Olhar as estrelas é minha vida, onde a presença do sol se faz de estrelas!

Tão livre quanto existir

Faz tempo que vejo a vida com olhos de vida. Não vejo a vida com meus olhos ausentes. A vida faz dos meus olhos o olhar que embeleza a vida de sonhos. Os olhos sonham de olhos abertos. Preciso trazer a vida para os meus sonhos pela força do olhar, que não tem a força da vida, mas também é infinita sua força. Quando as duas forças se unem, surge o céu, criado por Deus, pelo amor humano e pelas ausências, que nem sempre são o ser, nem sempre são Deus. A alma de Deus não tem ausências nem presença. Ela é o próprio Deus. Mas Deus sem alma, sem amor, é o mesmo Deus. Continuaria a amá-lo até pelo que ele não é!

Manifestações da alma

Nunca houve manifestação da alma. Tudo sofre e vive só, sem a alma. A claridade se perde no vazio do sol. Se eu não olhar o mundo com meus olhos, o mundo parece acabar pela vida que tem. A eternidade destrói o esquecimento destruindo o ser! Vida jogada fora no exterior do sentir. O vazio não esquece a companhia de si mesmo, como um renascer do sol emprestado de ternura. O que é o real, quando eu o vivo dentro de mim? Eu não sei o que fazer com a vida. Quando ela me abraça, parece que me compreende sem falar ou escutar. Como minha lembrança pode ser sua? O amor não decidiu ser amor. Distanciando a vida, como resto de esperança que não foi vista como esperança, foi sentida como vida. As tentativas de viver já são uma vida. Apreciar a escuridão é sair de dentro do abismo, que é como se fosse o sol a me devolver a mim pela escuridão do sol, onde a noite aparece sem me tirar essa sensação de vida, de paz. Um vazio infinito no meio do nada, a fazer do amanhecer o meu sorrir pelo sol. Sorrir para o sol é melhor do que ter o sol. Quando eu abro os braços para o céu, sinto a luz do sol a banhar meu corpo de luz. A alma é uma maneira de sentir o sol mais uma vez, como uma vida que se foi sem ter sido.

Pensamentos

Pensamentos, eu não penso por ti, penso pela alma: ela é o motivo de eu ainda pensar! Nada tem algo que se pareça um pouco com a alma para eu matar a saudade de ter alma. A alma tão pequena caiu. Tentei segurar, desabou das minhas mãos. Pensamentos de alma não se perdem. O ser existe apenas para que exista alma. Pensamentos existem mais do que a vida! A vida não é eterna. O pensamento é eterno. É o pensar que mantém a vida. Mas o pensar não pode ser minha vida! Há mais dor que vida. Há vidas que perdoam a alma pelas vidas que não tiveram. Por existir alma, nada acontece em viver, por isso, a vida não é monótona. Na alma sempre algo acontece. Por isso, ela é monótona. A existência de Deus é a vida. Isso o meu pensar não capta. A vida é mais importante para Deus do que ser Deus. Nunca mais a alma desabou ou esmoreceu. Ela já percebe que existo, pois existo pra Deus.

Saber olhar o que vejo

A ausência de sentido é a subjetividade que dá sentido à concretude. Meu olhar é o que vê na inexistência de um coração para amar! Vou começar meu ser pelo seu fim. Quem sabe assim o fim seja outro? O fim do meu olhar, distante do meu fim, vê a morte! A morte tem limite, é vulnerável. Não basta eu querer a vida. É preciso que ela me queira, onde o para sempre acaba! Não basta sofrer. É preciso ser esse sofrer alimentando a alma de morte. A morte não sabe a diferença da dor e da alegria. A morte não sabe que é feliz, que nada mudaria nela. Mas esse desejo de viver é incontrolável. Há sempre uma pedra no caminho de quem se ilude e tenta sorrir. A permanência é o fim do que ia surgir sem a permanência! Minha permanência é de alma! O que busco de inesquecível na permanência é o seu fim. Somente o fim da permanência permanece permanência! Capturando a morte, como sendo o que restou do meu ser! Salvar a morte de sua permanência é lhe dizer que foi um erro me matar, quando a minha poesia dá vida à vida! Não quero me parecer com a vida, quero me diferenciar também de mim. A humanidade não acredita em Deus: razão de existir vida. Sei que não serei feliz com a vida. O fim da vida é a minha história de vida. Subestimo a morte. Ela já provou do que é capaz. Quando eu era morte, me queriam agora. Sou vida e não me querem. Estou só, continuo sozinha na minha morte, percebo a vida. A vida começa na alegria. A alegria de ter a vida é a mesma alegria de perdê-la. A alma dorme eternamente como se tivesse o meu amor! Como viver da alma se ela levou o meu amor? Quanto mais vivo, mais me desconheço. Não sinto a vida passar no meu desconhecer. Talvez, se eu conhecesse a vida, ela seria toda minha? O que deseja a vida, vendo o tempo desaparecer? Ela não sabe o que fazer para o tempo ficar. A alma sabe quanto tempo existe em mim? O tempo é uma maneira de sentir, que não explica a vida e a torna mais confusa dentro de mim! Dentro de mim, a vida partiu para não abençoar minha morte! Mas abençoar já é morrer, sem abençoar a morte. A morte deixa a vida. A vida terá que viver sem morrer. Meu ser não precisa morrer para partir. A vida ensina a viver na alma, deixando o corpo morrer para viver! A vida é muito mais me encontrar do que viver! Mas quero ao menos que a vida saiba da minha existência, que, mesmo na dor, existe! Nada nasceu ou foi feito para existir. O existir existia antes de tudo! A única esperança do ser é a morte, e a de Deus é a vida!

A infância é a ausência do ser

Busco a infância da minha ausência. A vida, com todas as suas ausências, é presença eterna em mim! Se eu não tivesse tido uma infância, não teria ausências. A ausência da criança que fui é a forma como abraço a vida! A essência, fim do amor, é a ausência, é a única a agir sem ausências! Leio a alma da ausência, na minha presença. O amanhecer é a ausência de ser! A ausência inesperada do retorno da ausência. É como possuir o mundo, a vida, pelas ausências. Ausências de uma vida inteira, que foi lembrada sem a vida! Não amo o que a vida me dá, amo o que me dou, sem expectativa de vida. Um dar que termina em ausências. Ausência é penetrar no mundo, sem o mundo, onde o mundo é a vida, sem ausências, sem as tuas desculpas vazias, de onde nasce a minha ausência! Deus é a ausência da presença, como a falta de luz no olhar da presença aflita! Mas a aflição comanda a luz feito alma. Desata a vida num único suspirar! Busco significado para a ausência. Seu significado é o meu sorrir. Meu sorrir explica e justifica a ausência. A ausência é sem equívocos. Posso escolher o que quero viver de ausências. Ausência traz o ser para dentro do ser. O interior do ser é interior ao ser. O que nasce do ser é apenas a realidade sem o ser, que se acostumou a nascer de ausências! A ausência precisa de mais ausências, sem nunca chegar a presença. Para que quero a presença, se posso ser ausente? A ausência é reconciliação comigo! A ausência é sagrada. Nela Deus está! O valor se perde sem perdas, ausências. A ausência é irracional, por isso ela tem a inteligência da vida. Será que o amor da vida é mais essencial que a existência do meu ser? A ausência é o alimento da alma. Se a alma da minha ausência fosse minha alegria, não seria feliz por ter alma. Alegria é a presença da alma na minha ausência. Custou até a alma me aceitar. Essa aceitação é o nada da vida! A alma me torna concreta. De ausência em ausência, vou deixando-me viver. A alma é incomunicável. Apenas a essência se comunica com a alma, numa ausência absoluta de você! A ausência não acontece, se essencializa. Com minha essência ausência. Minha ausência é sua essência. Temos uma única essência, mas somos diferentes. Minha ausência é de mundo, companhia; a sua ausência não vem do mundo. É sagrada como a lembrança tão ausente de mim, que sou eu! A lembrança não consegue que a ausência permaneça em mim! Se não lembro de ser feliz, viverei como a minha ausência, mendigando solidão, revirando o céu para saber o que fiz da minha alegria! Ela se tornou o esquecer da ausência, mas isso não me tornou feliz. Quero sentir que a ausência é humana, que ela me deixe sofrer o que tanto desejo. Mas não sofro pela ausência. Ela é apena solidão. Solidão que me desperta ao mundo do desconhecido. Chamo-o de eu. Eu no desconhecido de mim, onde faço parte da descoberta de viver. Tudo começou como um amor que cresceu, se expandiu, tornou-se vida, que não existia como ausência. Ela ausente por mim, em mim. Amei para conquistar a ausência, como se houvesse motivos na ausência para deixar de amar! O amor aceita as ausências, como o que falta no amor para o amor surgir pela ausência de depois! Depois do amor, a ausência desaparece. Ela somente me queria livre para amar. Agora, toda essa liberdade de amar devo à ausência. A ausência me impediu de morrer. Não sou só, sou ausente de mim. Ninguém me fará aceitar voluntariamente minha ausência. Não preciso dos estímulos que me ausentam do corpo. Parece que morri! Mas é apenas ausência num fim que não pertence. Pertence a Deus a ausência, a vida. Mas o fim não se pertence. Eu torno o fim infinito em apenas dizer amor!

Impaciência da alma

Num simples encontro de olhar, encontro a vida. Quero encontrar mais do que a vida. Quero encontrar eu na vida! Seria como se a vida me olhasse por dentro dela. Nunca mais náusea, nem dor! A resolução está na impaciência da alma, que cessa a ansiedade de morrer por uma impaciência de viver. Debaixo do céu, a escuridão, fascínio da alma, onde o encantamento da escuridão se desfaz na alma, numa admiração de viver! Vivo mais ainda pelo que não se vive, que constitui a realidade sem vida, onde deixo meus mais lindos sonhos para uma vida que não é real, mas não sonha. Quem dera a vida sonhasse. Juntas, para sempre, eu e a vida, com o que não nos separa. Ao menos em sonhos estamos tão juntas. É como se fosse real eu a viver! Um sonho a menos meu entristece a vida. A vida quer que eu sonhe eternamente em mim, onde não tem como viver a realidade. Se incorpora a poesia que já existe em mim. Às vezes acho que nasci dos meus sonhos, como se eu tivesse entorpecida em sonhos que duram mais do que eu! Pelos sonhos, construí minha vida! Às vezes sinto falta do real, de conviver com meus sonhos e lhes dizer que os amo, como se já estivessem prontos para sonhar! Eu morreria para sonhar esse sonho, do mesmo jeito que sou esse sonho, que todos sonham no insonhável de ser!