Blog da Liz de Sá Cavalcante

Morte pura

A sensação concreta não é vazia, é a morte pura, me elevando até as minhas faltas que são ausência de vida. Minhas faltas são mais essenciais que a vida. Será a vida apenas a falta de amor de alguém? Quem fica com minhas faltas, como se elas fossem uma morte pura? A vida deixa-se escapar num sol exposto ao nada.  A ilusão do sol clareia o nada. Crio ilusões no nada. Falta no sol a ilusão do amanhecer, que devolve a vida para a vida. A vida é realizar o nada, mesmo que isso me custe a vida.

Sorrir como o nada

Sorrir como o nada que chora na sombra da minha ausência me faz despertar como nada. Nada pode faltar ao nada, tudo falta a mim. O amor não se demonstra sem o nada. A beleza do nada não é sua eternidade, sua eternidade é sua permanência. A lembrança é frágil sem o nada, ela bem que podia ser você.

Exercer a alma

Exercer a alma com a alma dentro da alma, sem a dureza de amanhecer. Amanhecer é a palavra que faltava nas nossas ações para nos comunicar. Deixa a vida criar o amor por si mesma. A falta de vida são as ações nas palavras. As sensações são os vazios das palavras, como o sol a se pôr no amanhecer. Após a alma, as palavras dominaram a vida, se tornaram um amor universal, com o consentimento da alma e a resignação de cada palavra, num amor que resplandece em chamas no meu olhar.

Me escute em poesias olhando o infinito

O eterno no ser é o nada, por isso me escute em poesias, olhando o infinito. O depois é sem realidade, mas o depois no ser é real. Consigo amar o depois de ser como se fosse o depois no ser. O ser é para si a falta de um depois, por estar num depois sem o ser. O depois é o meu amor, que pode nem acontecer. Todo acontecer acontece depois de acontecer. O sol ilumina um agora que nunca existe. Eu sou esse agora de mim. O tempo vem depois desse agora. Criei um tempo no agora por escrever. Escrever é o único agora. Me escute em poesias infinitamente, e o agora nascerá eterno, como se fosse o sol. Mas, se o agora for eterno, existirá eternidade para a minha poesia? Essa reflexão é toda a minha alma.

A alma do meu amor

A alma do meu amor quer ser feliz junto da minha alma. Por isso morri com a solidão de viver dentro de mim, para esquecer o amor, para conseguir morrer. A alma não se perdoa por estar viva. A morte mantém alma viva para eu morrer.

O som do nada

O som do nada é o único som que escuto de mim para a alma. O som da alma e o som do nada se completam, e assim surge a consciência. Deixe meu ouvido ser o som do nada para não esquecer de mim. Assim, a compreensão de mim vira até mim, na morte minha, que não é um adeus. Sou eu voltando a ser. O som do nada salvou minha vida do silêncio eterno, sua solidão me preenche, não há plenitude verdadeira igual a essa: posso morrer em paz.

Sonhar o céu

Sonho com o céu quando estou vivendo, não quando estou a morrer. Sonhar o céu é viver de novo, ver a vida sem barreiras, tristezas. Sonho o céu e vejo a vida com nitidez, intimidade. O véu que esconde a vida quis esconder de mim. O véu se mostrou para mim, mostrando a vida. Vi que vale a pena viver, ser feliz, não vou esconder meus sentimentos, nem mesmo do véu que esconde a vida de mim, faz tempo, não importa, importa viver infinitamente essa alegria, onde há lembranças da vida, todas são uma só: viver, viver e viver…

Ininterrupto (não interrompido)

O sentir é apenas a percepção do nada, que não pode ser interrompida, nem mesmo pela vida. Interagir, enquanto o sentir não é luz, e a escuridão é o prazer das estrelas, que se buscam sem a escuridão. A vida é só, na luz, na escuridão, mas não é só dentro de mim. O ser afasta o prazer da escuridão pelo desprazer da luz. Luz é falta de alma. Desesperar-se na luz de morrer, como se a vida fosse partir. A morte perde sua luz como se perdesse alguém. Lembra-se do que é sem luz: nada. A morte escuta poeticamente a minha alma. Desenho-me sem minha imagem. Sei como sou pelo que sinto. Mas minha imagem não é o que sinto. Sinto como se eu fosse a perda da vida. Nada mudou com perdas da vida, mas o silêncio se comunicou, enterrando a vida. Foram tantas palavras por viver, que elas não conseguem dar um fim à vida. O silêncio faz a vida se lembrar dela. Tudo parece quieto, nunca morto. O que foi perdido por viver não está mais perdido. A morte vai dando lugar à sensação, que se torna um ser.

A presença não é estranha por si mesma

A presença é a alma mais perfeita, o céu que permanece, o amor que repousa em mim. Tenho medo do que a vida abandona por minha causa. Não quero sacrifícios, quero amor. A estranha presença da morte é o medo de amar. Quem ama é eterno, com ou sem a sua presença. O vazio sofre por ter uma aparência, que sofre antes da aparência do depois, que torna o vazio incompreensível, mas as coisas são vazias, tudo é vazio, aceitação. Antes, nada era vazio, tudo era negação. Eu senti esse negar na alma, nem por isso a alma se tornou negativa. A alma é a única presença do céu. O ser é alguém para si. A luta do céu é amar o mundo como sendo um lugar perdido, que não necessita de amor, mas o céu ama o mundo, por isso crio palavras no nada. O nada, essência da palavra. A palavra segura meu corpo e solta minha alma. Nunca perguntei se as palavras me querem, mas, quando escrevo, sinto que elas me desejam, amam-me. Onipotente, sofrendo na poesia, nada me atinge. Sofro, como se a poesia tivesse me ignorado, mas eu me ignorei, sem dar amor às poesias. É difícil amar o que já tenho: a poesia. Escrevo para a poesia sair de mim, mas ela me incorporou, não consigo sair dela. Os fragmentos, abandonados pela poesia, são meu mundo, minhas poesias. A razão é apenas aparente. Não há razão na vida, na poesia, elas se assemelham, morrem-se até recuperar a razão, quero morrer junto.

Aparência interior

Eu sou o que fizeste de ti: nada. O esclarecer da alma é toda a minha ausência, toda a minha vida. Se em vez do nada fosse o amor, minha aparência interior estaria perdida, como sendo a última ausência sentida por mim. Derrama-te em mim como fogo, no ferver da vida que afunda minha alma, no raso de mim mesma. A união do ser e o nada é a alma. O ser é a separação do ser e o nada, sem poder deixar o ser no nada de ser, o nada de ser é o nada verdadeiro. Onde o nada da vida nem mesmo nada é. Por isso a aparência não é aparência da aparência, é subjetividade. A vida, eu concebo na imaginação, sem ser imaginação. O mundo inteiro não tem a vida da imaginação. Perdi-me em imagens reais, sem imaginação. A imagem deveria ser apenas imaginação, assim a imagem da minha morte seria apenas a minha imaginação. Não sei no que acreditar, apenas imagino, como se minha consciência fosse a vida de todos. Não importa a aparência, e sim o sentir. A ausência é uma coisa boa: é aprender a ser só, onde a minha aparência surge, como se fosse meus olhos, mas é apenas minha imagem contra a falta de amor, contra essa indiferença de viver.