Blog da Liz de Sá Cavalcante

A liberdade é a ficção do real

O corpo é uma mudança. Por um corpo, não quero morrer, mas meu ser não é meu corpo. Não quero morrer, apenas por já ter morrido. A vida apaga a evidência do corpo, antes de ele morrer. Entrega-o à morte, como quem se livra de um fardo. A ausência do meu corpo não o torna eterno. A ausência é eterna, se for só. A única maneira de eu poder viver é através do meu corpo. Todo dia é dia de viver, até que a vida se torne sem alma, pela minha alma. A vida nada tem a oferecer à minha alma, ensinarei a vida a viver!

O inapreensível do corpo

O corpo é uma maneira de ter a alma, perdendo a alma para a morte, que é a única maneira de tê-la. Não deixo a morte para a morte, isso seria a morte sem mim. Com a morte sem mim, a morte torna-se eterna em mim. A alma não tem nenhuma função para o ser. A alma não é por onde meu ser vive, por onde o ser morre. A alma é a inutilidade do ser. Até quando ama, a alma é inútil. O ser ama sem alma, vida, morte. A alma não é dignidade, é pela alma que não sou digna de mim. Não consigo manter a minha alma, como estou viva? Estou viva sem minha alma, minha alma é Deus. O inapreensível do corpo me fez humana em mim. Tenho me esquecido da solidão, de mim, somente pensava em Deus. Mas meu ser necessitou de mim, vi que posso me amar e amar a Deus ao mesmo tempo. Perdi a Deus e a mim por não morrer!

O olhar da morte

Tento ouvir a morte pelo meu sentir. A morte escuta meu sentir, como se me visse. O olhar da morte é pura imagem. A alma se protege sem ela mesma. A falta tem um único olhar, que me desarma para morrer. Falo como vejo, isto é amor. A fala deixou de se ver, perdeu a fala, como quem perde a alma. Morrer pelo olhar da morte é mais do que pude sonhar. A vida perde a morte para o ser. Tudo se perde sem a morte, menos o ser não se perde, essa foi sua pior perda. Se, ao menos, estivesse perdida por morrer, o sol enterraria a vida na minha morte.

A falta de som na voz interior

Por que o interior fala mudamente o que sente por mim? Pareço ouvir um som sem som, onde o sentir flui mais do que eu possa dizer. Dizer desfaz o amor pela alma. A alma fala de um adeus, que não sente o que vive, por isso capta o silêncio como único amor.

Pai

Você é a continuação da minha vida. Nascemos um para o outro, temos o mesmo amor, o mesmo respirar, a mesma alma, por isso não há solidão. Estamos sempre juntos; mesmo quando estamos distantes, temos um dentro do outro, essa é a única alegria de que preciso, é o amor de que preciso, onde a vida é sempre mais por ter você. Você é todo o significado da minha vida, da vida, da eternidade. De quem o ama, sua filha, sempre sua, Liz.

O sonho que não sonha

Apenas a dor não é tédio, rotina. É algo morno, que ferve sem vida, mas com muito amor, que encontrei na dor, como quem encontra a vida. O amor latente se descobre na morte, sem mim, de onde voltará, sem soprar a vida para longe. De longe, amo a vida, mas pareço não a amar sem escondê-la de mim. O amor não basta para viver, mas nem por isso preciso ser eu no amor. O amor não necessita de mim, necessito dele, como uma necessidade de morrer. Morrer é procurar o nada, sem jamais encontrá-lo, deixando uma saída para o amor: de que vou morrer um dia!

O princípio de tudo

Nada falta no princípio. O princípio de tudo se torna eterno com a morte. Tudo falta no fim. A falta cessa o nada, que poderia ser o princípio de tudo. Nada pode ser o princípio de tudo, nem mesmo o amor. O ser é o princípio de tudo, até de Deus.

Poesia ausente numa única lágrima

A vida é quem melhor me conhece, como se a poesia não tivesse ausente numa lágrima. A alma se reinventa sem a vida. A solidão é o único amor que não é vazio. A vida destrói os momentos, pelo deserto do saber. Tudo surge dos momentos não vividos. Apenas o não saber sabe de mim. O amor que sinto é o único saber que tenho. Deixo a alma sair de mim lentamente, para que eu possa sentir minha morte, minha vida, meu amor, aproveitar quem sou, até em morrer, até que eu não exista nem para a morte. Que eu descanse sem vida, sem morte, no teu adeus.

Alma e corpo são exclusões do ser

No meu amor, apenas o que se derrama não cessa. A exclusão da alma e do corpo é a vida, é o céu, é o infinito no renascer do amor. O nascer não renasce como o infinito renasce.

Vejo a vida de longe

O amor cuidando da vida, na distância que os separa, nada mais os separará sem distância, por isso vejo a vida de longe, para não incomodar minha alma. A fidelidade da alma é um incômodo. Olhei para a vida sem a vida, me vi dentro de mim, onde a morte pode me esperar, no recomeço de mim!