Blog da Liz de Sá Cavalcante

Impermanência da permanência

Vida perdida de vida na impermanência das coisas em senti-las tudo é o nada. As coisas descobriram o ser que existia nelas. O olhar deixa a realidade ser o meu corpo mudo. A vida é um olhar sem realidade, por isso, sinto a vida como se esse olhar fosse real. A vida é real se a sinto real. Meu sentir é a única vida que tenho. Nada pode ser esse sentir, nem mesmo a vida. Até as conclusões são confusas no meu pensamento. O eu não existe no eu, nem na vida. Por isso, meu eu existe para o amor. Não existe mais permanência nem impermanência: existe amor!

Rasgando-me

Rasgando-me para não me dilacerar, percebo que tenho esperança. Vesti-me de luz na escuridão. Toma minha luz, carregue-a dentro de ti. Menos luz, mais corpo para a escuridão da morte. Nenhuma luz, ilumina-me apenas a escuridão. O silêncio se impregnou na alma, excluindo-me das palavras, que ainda gritam por mim. Segredos são inconfessáveis até no silêncio. Rasgando-me sem que me costurem. Da costura, não ficam retalhos de mim. Eu fui até a alma, onde não podem me costurar. Eu nadifiquei sua consciência com meu amor. Amo é a sua ausência, que me descostura. Amo o nada não silenciar o que digo. Meu amor, é o que falo sem ausências. A alma é a ausência da vida noutra vida, que não é o além, é apenas o amor que tenho para dar. Daria mais que o meu amor para a vida, daria minha alma. O que foi esquecido viver, fez-se amar. Morrer é como um amor que nunca vem a mim, mas existe na minha morte. Morrer, riqueza do espírito. Nada quis da morte. Rasgando-me para não morrer. Alma não cuida, mas ama. Morrer ou não morrer, é apenas ser.

A liberdade de viver

A liberdade de viver é como o céu depois do olhar. Ver é a despedida do céu em mim. A consciência é o passado eternizado. O respeito pela vida vem da alma, do passado de existir. O que posso dar à alma é mais inviável que a alma, mas a alma não se dá a mim. Mesmo estando viável, disponível, a alma se distancia de mim num único respirar. Esse respirar é o sopro da alma. Respirar cessa a culpa de existir.

Um instante

Vivo apenas pelo instante. O instante tem fim, renascendo. Pela alma, o instante continua a acontecer. Não tive alma suficiente para viver, mas tive alma suficiente para amar. O instante cessou de amor até desaparecer por completo como uma lembrança que ainda existe sempre mais, até eu morrer. Enfim, sozinha.

O desaparecer da ausência é o nascer do esquecimento

A morte está pregada, colada na minha alma, ou pode ser apenas o esquecer de mim, querendo ser minha alma. A alma se curou da alma sem o esquecimento. Apenas a alma da alma é quietude do esquecimento. Sem alma o esquecer é mais essencial que a vida.

Sou o que lembro

A invisibilidade une a distância e a proximidade: é apenas isso que sinto em mim. Sentir é lembrar. Mesmo sem lembrar de mim, lembro do sentimento de ser. Nada pode ser o sentir que eu sinto: nem mesmo a lembrança de mim. Preciso de algo para me identificar com a lembrança do que sou. Mas nem na lembrança de mim me reconheço. Laços desatam mortes. Sem lembranças sou feliz como é feliz esse alcançável de ser. Mortes desatam laços. Mais vale uma ilusão perdida do que viver? Se a alma saiu de mim, esteve em mim em cada amanhecer. Por isso, para mim, o amanhecer é alma. Mas a alma desaparece no anoitecer, e tudo é apenas sono e vigília. Existem almas tão nocivas que às vezes amo apenas para não ter alma. A alma é uma lembrança triste, nunca superada. Posso transformar a alma na minha vida, mas não haveria sonhos. A alma é para ser vista na sua alma, não ser mais uma lembrança. Não necessito mais lembrar da alma. Ela é real!

A fé nasce da coragem

A morte será a fé que nasce da coragem. Uma dor que não machuca, não sangra. A dor alivia a alma. Nada perdi em sofrer. O silêncio não sofre, silencia. Saudade é uma força que dá sustentação à alma. Mas não quero sentir apenas saudade, quero viver essa saudade como um algo a mais. Aprendo com o amor que posso não ser, que minha existência é apenas esse amor. Nada existe tanto quanto o amor! Precisei sonhar para viver. Além do sonho, há o amor. O espelho sobrevive ao sonho de ver. Lamento não sonharmos juntas. Sonhar é conviver. Sonho em mim, o nada de ser, que nunca será seu. O tempo é o vazio de cada um cada vez que se morre. O tempo é a dúvida da existência da vida. Para que a vida precisa do tempo? Ela vai além do tempo, além da falta de nós. A vida é uma para cada um. O ser é diferente de ser, a vida é diferente da vida. Não existe vida individual: vida é estar junto para estar perto de mim. Deixe-me no deixar de uma ausência, que se refaz em mim, de mim. O sol é apenas minha ausência decorando o céu com palavras de amor. Palavras não substituem minha ausência, na ausência do céu. A ausência do céu é o céu no meu amor.

Mergulho em mim

Recuperar a solidão mergulhando em mim num fôlego de vida. Não há imagem no céu por onde morrer. Não há olhar no céu. O céu é a despedida do nada que falta no olhar. Não deixo para o céu a última imagem do olhar. Que seja esquecida essa imagem na sua existência, como se eu te visse sem olhar, mas é apenas a minha sombra. Não reflito quando mergulho, apenas me entrego ao pensamento sem pensar em nada. Não pensar é como sentir a alma tão fundo que ela me esmaga com tanto amor. Somos apenas eu e a alma nesse amor. Tudo que desaparece na alma é infinito. Apenas sem nada pensar não sinto vazio. Vejo o significado do nada, sinto-o sair e entrar pela minha pele. Não vou justificar o vazio com o nada. Se minha vida fosse simples como as ondas do mar, viveria eternamente como um mar dentro do mar. O vento sacode o mar dos meus pensamentos. Existir não me faz ser. O vento dissimula a realidade, engana a morte. Minhas lembranças eram apenas o vento. Por isso, gosto do uivo do vento, espanta o silêncio com a noite. A noite não é silenciosa, range dentro de mim. Seguro as mãos do silêncio nas minhas mãos para não me perder de mim. Alma, necessitei em ti o meu silêncio. Esqueci a janela fechada, a alma saiu de mim em algum sol estranho, por isso, não causa estranheza. Deixo a morte sem alma sugando os momentos da morte em cada lágrima que não chorei. Chorei até tornar minhas lágrimas a vida de outro alguém. Não estou distante por viver, apenas diferente. Não precisa carregar minha alma com você. Essa será sua morte, sua condenação.

A alma é irreal

A alma é irreal pelo amor que permanece. A alegria cessa o tempo na alma. O tempo da alma sou eu. O tempo esperado é o tempo obtido, é o amor, o mesmo amor em tempos diferentes. O nada surgiu da irrealidade da alma para que a irrealidade da alma tenha um significado. A Flor de Lis se arrisca sem o mar da ilusão que resseca a alma sem ilusões. A ilusão de não estar perdida é a alma: desencanto da vida. O céu se perdeu na própria alma, fez-se meu amor. Não posso unir o mar a terra, sou insignificante como as estrelas que não duram o céu que as veste. O irreal é infinito, opaco, deixa a saudade igual ao ser. O céu investe na realidade sem Deus. Deus é cada estrela perdida num céu em chamas. Não há céu na tua esperança, nas tuas atitudes dúbias, confusas. Eu estou partindo o céu ao meio, sem ter esperança de me encontrar na minha morte. A permanência, falta de esperança, me vê como sou! Não vou me enganar por ser diferente do céu. O céu se igualou a mim, mas esqueceu da minha eternidade, que voou mais alto do que o céu. Nada mais ruiu, destruiu-se, foi só.

O infinito do infinito

Não sei onde começa ou onde termina o infinito para vivê-lo. O infinito é uma maneira de me dar a vida sem me esquecer. O infinito pode ser uma imagem, uma lembrança. O infinito é ter sido eu. Não esqueço a vida pelo infinito, nem que, para isso, eu necessite morrer. Um dia as palavras perderão o sentido, então me entregarei à vida morrendo. As palavras nunca poderão ser o infinito. O infinito é inexpressivo. Do infinito irei morrer.