Blog da Liz de Sá Cavalcante

Angústia é não ter medo

O medo separa a angústia do existir. A alma é uma dor que preciso sentir, longe da minha dor. Somente existe sofrer junto a alguém, por alguém. Agora, que nada mais existe, a vida nasceu, para o nada, pelo nada. O nada nasce pela vida, eternamente. O céu, esculpindo o nada no vazio de perceber. Perceber não é terrível, é o nada na alma. Boiam-se almas nas minhas lágrimas, que, suprindo minhas dores, no padecer da alegria, que é apenas mais um sol, mais uma vida! A vida, sem sentimentos, é um poema surdo, mudo. Minha alma soluça vidas. Feliz quem sente dor, pois é humano sentir dor, sem descansar a dor na alma.

Inseparável nada

Seria sempre, pela alma, na alma. A alma é um sentimento pessimista, cruel, pior do que o sentimento de morrer, pois é para sempre assim: inabalável na dor. Morrer corrói a dor, não a mata. Nunca necessitei viver na alma, nesse inseparável nada. Deixei de tornar o nada inseparável, tornei-o comum. Mesmo assim, me senti morrer, nessa separação entre o mim e o nada, o amor nunca será eu em mim, por mim. Triste ver a vida sem alma, meus olhos olhavam para a alma da vida, como se nada restasse no mundo. Por isso, nada me separa da alma.

A alma da ilusão

Por esta ilusão, a alma da ilusão não é a ilusão da alma. A alma da ilusão é o meu sorrir infinito. Por que a morte não pode ser feliz como a vida? A alma sofre quando amo. Vesti-me de alma, onde nada mais importa. Vesti-me de alma, para que meu corpo não sinta meu amor. O céu foi resgatado no nada do ser.

Compreensão

A vida sem amanhecer não existe. O amanhecer é a compreensão da vida. Nada se compreende pela solidão, mas a solidão compreende a incompreensão da vida. Solidão também ama. O tempo é ausência de solidão. Mesmo assim, procuro a solidão no tempo. O tempo não muda, mesmo com a mudança da vida. A vida não muda porque quer. Ela muda pelo ser. Sem compreender a vida, quer apenas pensar na vida. A compreensão pensa sem compreender. Tudo se compreende sem compreender. Apenas o silêncio é o que escuto. Estou feliz, como se o fim da vida não fosse a morte, fosse o amor!

Quem sonha ama

Faz tempo o amanhecer. Estou só no amanhecer. No amanhecer, o amanhecer sem amanhecer é um sonho de eternidade. Vivo sem mim, assim como o amanhecer vive sem o sol. O sol se despede, como se amanhecesse sem o amanhecer. Essa despedida é a vida sem o sol, distante da distância, pela presença em busca do sol. O sol se despedaça sem distância. O sol próximo de si é uma luz na luz do ser. O sol não devia existir no céu, o sol era para ser quem ama. A existência do amor é sem o céu. Será que existe outra maneira de amar que seja no céu, que seja o céu? Quem sonha ama, como se o amor pudesse amanhecer.

A falta de profundidade no amor

No amor, a vida é um sonho, pois, mesmo sem morrer, amo a vida. O céu desabou no meu amor, para que eu fique em paz. Vivo apenas do que esqueço, somente assim faço parte da lembrança de viver. O amor é contradição, o ser não é contraditório, é o que é, com ou sem amor. O sonho desfaz a contradição do amor, que não é diferente do amor. Tenho tantas vidas, que sou feliz, como se a vida me pertencesse. Tudo pertence a uma solidão sem amor. A solidão de amor é se desprender da vida, a solidão sem amor necessita viver!

Os olhos sem o olhar

Os olhos sem o olhar é por onde surge a alma. Mas a alma já foi um olhar por onde vive a vida, num mundo que é puro olhar. Os olhos sem o olhar é o meu amor. Para que perceber as coisas pela existência? O olhar é inexistente, mas o percebo como existindo em mim, fazendo parte dos meus olhos, de mim. Os olhos, sem o olhar, fazem parte de um sonho, que ainda tem que se dividir com minha existência. Manter a essência do olhar na verdade é verdadeiro? É essência minha ou da verdade? A verdade poderia ser ainda mais verdadeira? O que é preciso para perceber a verdade do outro? A essência não pode ser verdade como os olhos sem o olhar são!

A morte é uma oração

Está tudo tão quieto, que não adianta morrer. Contemplo a vida sem a vida. O nada supera o nada, longe de todos e de ninguém, essa distância é a aparência do ser no nada. Não há nada para o nada. O nada se disfarça de ser. Ninguém inventou o nada, nem mesmo a dor. O nada se inventou na presença do tempo. Isolar-me é me encontrar onde quero ser encontrada. Escutar a morte na oração para ser sua essência, sua esperança, a esperar o silêncio do seu amor, que numa única voz eu disse: não sou só, tenho a morte para morrer.

O segredo do silêncio é o ser

Mesmo sem o silêncio, o ser é um segredo, nada continua pela continuação da vida. A única coisa que percebo da alma é que ela é o abandono do meu ser noutro ser. Nem mesmo o abandono compreende a solidão. O que o corpo e a alma não podem abraçar, o olhar abraça em braços infinitos, para o fim de abraçar, fim do amor. Há mais alma do que vida. Quero que a vida seja a alma que anseio ter. Há almas que são desencontros. O encontro com a alma não me faz escrever para existir, escrevo sem alma, sem sentir. Escrever é o oposto do amor. É a busca do amor que me faz escrever. A vida deixa saudades no que não existe, mais do que no que existe. Ter saudade é uma forma de inexistência, durando mais do que o infinito. Escrever é o único tempo que tenho para viver. Viver traz complexo de ser feliz. A ausência não pode se tornar o tempo em que vivi. E se o tempo for este agora? Dou tempo ao tempo de se refazer. A alma não é distante do real, é o real. A luz me observa, no meu ser inobservável, a luz me vê, logo não necessita a poesia de existir. Ela é o meu espelho sem me ver. A coragem de silenciar o que se sabe é o mesmo que dizer. Na fala ou no silêncio, o amor nunca se completa, nunca se compreende. Apenas a morte não é um segredo, mas sua objetividade é subjetiva. Todo objetivo no objetivo se dilui no amor diluído. A alma vence a vida. Tudo é exatidão, apenas a morte pode escrever minha vida. O que escrevo é mais real do que o real. A realidade não está em escrever, está no agir da escrita, que não alcanço. A vida existe mais dentro de mim do que na própria vida. Mas, a vida não existe por mim. Isso é confuso em minha alma, não no meu ser. No ser, vou vivendo o que não posso viver na alma, no amor!

A consciência sem conhecimento

A consciência sem conhecimento é o infinito de mim, restos sem os restos do amor, é o ser em mim, em qualquer resto, em qualquer lugar, qualquer amor, onde o infinito seja apenas o ficar da lua, pelas estrelas da solidão. O céu é o conhecimento eterno da lua. A lua invade o céu. Pelo céu, a lembrança se constrói só, sem o ser. Nada no ser é o céu, por isso o ser tem que morrer sem o céu. A consciência do céu transforma o mundo. Não há céu no céu, mas o céu continua sendo céu, e eu tento conquistar o céu. É uma pena o céu ser apenas morte. Não há céu na alma, no meu ser. Tudo que posso ser serei, como a nitidez do céu dentro de mim. Nem ao morrer esqueço o céu. A vida, a morte, é apenas olhar o céu, separar as estrelas do amor, do sonhável, que não é o sonho, é o amor. Sem amor, viveria em cada estrela que brilha só, como é impossível esquecer esta consciência feita de céu, onde não é preciso conhecimento, tudo sei pelo céu. Mas, enquanto não existe céu, vivo das minhas certezas, do meu amor, como se fosse o céu.