Blog da Liz de Sá Cavalcante

Amor recolhido

Quem sabe se eu recolher meu amor do mundo, seja feliz ou, ao menos, lembre de mim, pelo que deixei de amar. Sempre posso recolher o nada, no que passou, sem eu ter sido ao menos o que passou. Os passos da vida são apagados pelas minhas cinzas. Minhas cinzas voam pela minha liberdade, talvez isto seja morrer: fazer das minhas cinzas as asas da minha morte, onde posso estar em qualquer lugar, se minhas cinzas estiverem em mim, impregnadas na alma. Vim ao mundo, para tornar as minhas cinzas a minha alma, essa é minha eternidade, meu amor! Não tenho forças nem para morrer, mas, quando vejo minhas cinzas, percebo que nem tudo acabou, tenho a alma para viver, isso é tudo, mas não é o fim. O que acabou comigo foi o abandono, nunca a morte. Que a morte se liberte das minhas cinzas, elas são inúteis. Há mais no céu do que estrelas, do que morte. Quem sabe exista o amanhã?

Reavivar a memória pelo sofrer

A lembrança cessa a alegria, pela companhia do adeus. Perder vale mais do que viver?! Não há nada que substitua o pensar, nem mesmo o amor. A carência de viver é a morte, como se eu visse as coisas em mim, nelas mesmas. Sentir o amor é anular o amor onde a memória descansa, na ignorância de não amar. Para uns, não amar é sabedoria. Fui cruel por te amar? O que a sabedoria sabe de mim, que eu não sei? Como pertencer à culpa de existir, se se culpar é um despertencimento da alma? A saudade, a falta, é a imensidão do infinito, que cessa o amor, em sua finitude, que não era para ser o seu fim. Escrever é falta de pele, de falar, amar, existir. Reavivar a memória pela verdade do ser, que não é a vida, a morte, é o ser em pleno amor. Não há verdade sem amor. Existe apenas uma única verdade: o amor.

Amortecimento da luz (perda de força)

O olhar amortece o sol em sua luz, para encontrar força na falta de força. A luz tem uma força inesgotável, que não se vê com o olhar. Somente assim, sem olhar a luz, sinto o cheiro da vida, que me leva aonde quero ir. O não ser se entrega ao nada sem a luz. Mesmo amando, ninguém necessita amar. O amor é o imperceptível do ser. Ninguém mais se inspira no amor. A força não é boa, nela não há igualdade de alma, de ser, existir. Nada no amor causa amor. O amor não se vê como amor. Ninguém se apoia no amor. Amor não é um risco, mesmo sem ser correspondido, é salvação. O amor morre sem risco, sem deixar marca. A luz incendeia o amor de escuridão. Ninguém quis que o amor vivesse. Se eu dormisse sem amor, estaria ainda viva, para despertar a vida da minha luz? Que luz é essa que não salva a vida de qualquer imagem que lhe damos? Eu sou a imagem da vida, que não se reflete em mim. Um dia, a vida terá sua própria imagem para eu deixar minha imagem na minha alma. Talvez, a única imagem seja essa luz. Fim do fim da escuridão. Amor, não escureça a luz em mim, pois veja pela minha luz, logo verá por toda eternidade, voltada para o que Deus não pode concluir. Nem Deus pode fazer você me amar, embora a eternidade do amor esteja em você. Se ama Deus, como não consegue me amar? Deixei de amar você? Não sei. Sei que amo tanto a luz, é como se visse Deus na luz. Eu sou amada por Deus em plena luz. Não me sinto mais só, quero apenas que a luz se apague, para que eu possa morrer na escuridão do nada. Esta é a minha coragem, de transcender na luz como morte, para que escute o fim do amor, não como silêncio, mas como uma nova luz que nasce, que faz de si mesma o que pensa. É apenas esperança, mas já é um começo, ou recomeço, de que ainda posso viver pelo que morri. Não preciso ser salva, preciso de amor. Pelo amor, não há mais nada, nem luz. A esmo, o amor se fez à toa, para que o sintam como amor. Se não o sente como amor, olhe para a luz, mesmo se não encontrar amor, encontrará esperança, que dias melhores virão!

Abstrair o nada

Abstrair o nada não reúne as vivências perdidas na poesia. Abstrair é saber que é possível, sem possibilidade nenhuma. Para abstrair o nada, não receio morrer, como se eu fosse ouvida pelas ondas do mar. Não há lembrança em mim, do que vivi na poesia. A vida, parada diante de mim, como se ela fosse a permanência de tudo. A abnegação é abstrair o nada no amor. Se eu sair do nada, vou morrer, para que meu pensar não seja eu. O eterno é a origem do nada, que se determina sem o céu. A vida e a morte podem esperar, pelo que o céu alcança, sem a vida e a morte. Eu vivi o céu sem morrer. Tudo alcança o inalcançável, mas não alcança o alcançável. O alcançável é o céu.

Desapego da alma

Tudo que começa começa pela falta do fim. A alma é apego da razão no desapego da vida. A paz não é profunda como a dor. Sofrer é amor. O sangue escolhe o que quer da vida. Alma, sem sangue, vida. Sangue não é vida. Foi por isso que o sol sorriu, até esparramar-se no chão, para trazer o céu para perto. Não consigo imaginar, no desapego da alma, o céu de todos. A compreensão do ser é a morte, não capta a morte ao morrer, e sim ao viver. Tudo dura na morte, que desliza, de tanta permanência, assim o amor é a impermanência da permanência. O amor é uma maneira de lembrar da vida sem a tua luz. O que escapa ao amor, permanência da luz sobre a luz. O que escapa sem amor é a luz eternizada, é o ser. A alma se apaga na luz do ser, que não apenas ilumina, é luz. A luz rompe o céu de luz. A luz tornou-se o único céu, onde olho para o céu, como sendo espelho da minha alma. O céu é o desapego da alma.

Por que a vida existe apenas no real?

O real existe, pois nenhum amor é a vida. Desmoronei, como se eu fosse o real do real. Da vida, surge o pensamento, no desencanto de pensar. Penso, pois não há o que fazer em mim, por eu pensar. O amor é incomunicável na fala muda da consciência, onde a vida não é consciência de nada, nem da consciência. Consciência é tudo que existe apenas para mim; mesmo assim, faz parte dos outros, onde o real esconde o sonho irreal, que resgataria a vida, até ela se tornar amor.

A alma não é como é

A alma não é como é, é sempre mais. A falta de valor é o único valor do amor. Ninguém pode ter o vazio, sentir o vazio, nada há no vazio, isso para mim é possuí-lo sem o ter. Que fim é o vazio? Um fim que busca algo não pode ser vazio, é um ser no ser do vazio. O fim do vazio é a ausência do sol. Se o vazio levar o sol, de dentro de mim. Apenas minha ausência é sol, fim da eternidade do vazio, fim da esperança. O amor queima na ausência, que é puro sentir. O sentir e o amor se unem, nasce a morte. A morte nasce do amor, como se nascer fosse sorrir. Apenas ao sorrir, sou capaz de nascer do que não nasce em mim: amor, amor, amor…

Alegria infinita

A alegria é infinita ao partir. A alegria somente existe sem alegria. A inacessibilidade de ser feliz é que me faz feliz. Ser feliz é como saber quantas estrelas há no céu. A alma é o ser, quando o ser a deixa por amor. A vida não está onde estou, não sei onde estou. Sei que meu pensar chora como se eu estivesse em algum lugar, mas não sinto que há um lugar para o amor. A sombra da alegria é o infinito da alegria, onde a vida é me dar a mim. Nada acabou por acabar, acabou sem o fim. A distância é um olhar mais atento à vida. A alma é a minha sombra no infinito. A alma é a solidão que o amor queria ter. Partir sem alegria é não partir. A alegria não é infinita quando a sinto.

Vida caótica (confusa, caos)

A morte é não ter começado a viver. Botei a morte no colo, ela nasceu de mim, foi tão natural quanto respirar. Respirar é apenas a escuridão que não se define. Eu sinto por mim ou pela morte? Viva ou morta, nunca sei o que é sentir, por isso sou minha própria poesia. Perdi o sentido da vida, pelo sentido da vida. A morte floresce dentro de mim, define todos os sentidos no indefinível do meu ser. A brisa da morte não carrega o sol do amanhecer da noite. Dormes, e eu floresço, sem pensar em ti. Pensar em ti não me pertence. O momento suspende a morte num único pensamento: viver. Aprendi apenas a morrer. Talvez, eu viva mais que a delicadeza da morte, prefiro a brutalidade da vida. Vou viver, quando não houver mais vida. Sonhar é a imagem da morte, tão mais verdadeira que viver. O que quero ao morrer? Apenas que o desejo continue a florir, como se fosse eu. Quando o florescer de mim não sustentar minha morte, é porque os meus obstáculos foram vencidos, e a tristeza teve a paz de me ver morrer, feliz por sofrer. Tudo morre sem dor. Sonhar é o partir da alma, que não me faz florescer sem a minha morte. A dor, vencida pelo medo, desvenda a vida. Paz é o medo, o receio da vida. Vai dar tempo de morrer? Nada levo da vida, além da sensação de morrer, mas nada levo da vida, nem mesmo a morte. Encontrei a morte sem a minha morte, assim morri plenamente no nada, como nada sendo nada, que faz todos viverem, para eu morrer na tua paz, que não é a paz de todos, são os destroços da vida, que se acumulam, para que eu seja algo, que não seja o nada, não seja eu. A vida supre a falta de morrer, contanto que eu não exista, somente assim descobri o privilégio de eu nada significar para viver. Viver não precisa de significado, viver precisa do ser, até para morrer, onde o silêncio não enterra a dor de quem vive, mas sabe que nenhuma palavra, nenhum ser, nenhum amor, me impedirá de viver e morrer pelos meus sentimentos, que vigiam a morte, desfazem destinos, para haver esperança de vida. A expectativa de vida não é ser amada, é ficar só em mim, como um último instante perdido de vida, que deixou para depois. Nós deixamos o instante desaparecer, na ruptura de nossas almas, onde a separação une o que foi esquecido por nós. Nada podemos fazer por nós, nada podemos fazer sem nós. Resta apenas a distância, devorada no vazio de nossas almas. Somente queremos morrer, com o nosso olhar nos vendo, como se houvesse nós.

Extenuar-me (esgotar, cansar)

Tudo que vai descendo, até a alma, não existe, é como o céu a esperar apenas o meu olhar, num suspirar eterno. Nem o céu pode curar a alma dela mesma. Nada me separa da alma, mas não me sinto unida a ela. A palavra prefere morrer a ser poesia. Amar é apenas sobreviver no nada. O suspirar traz de volta o momento perdido, onde não há mais vida. Mas, ainda há vida na minha vida, no silêncio. Sinto falta do momento perdido, como se fosse minha alma, mas nunca houve esse momento perdido, ele era apenas o meu imaginar, é a única presença real da vida. Mas não é presença da presença. Disse adeus, para encontrar o amor que sinto, talvez ele seja um momento perdido, encontrado na falta do meu ser.