Blog da Liz de Sá Cavalcante

Ausência abandonada

Pensar é deixar de ser, onde a ausência abandonada consegue ser a minha vida. Nada dizer do pensamento, não o sinto, o guardo para a ausência abandonada pelo teu sorrir. Interagindo com o nada, não há abismo de mim. O abismo é a semente da vida, que faz brotar o chão. Um abismo sem buracos, sem faltas, onde apenas preciso sorrir pela alegria do abismo de mim, chegar ao fundo do abismo não é resgatar o chão, é levitar no nada, sem o nada. A presença do nada pode ser simbólica, mesmo sendo real. A presença da ausência é a falta dela. A alma, sem pressa de vir a mim, pois já veio de algum lugar, no inencontrável de mim. Sem a alma, parecem me conhecer, mas conhecem apenas a expectativa de ter alma. A ausência é abandonada, sem sua ausência: o tempo me faz esquecer a vida na ausência. É a ausência que faz viver. A existência da ausência, como o naufragar de um sonho, não afunda a realidade em mim. Procurei nos sonhos minha inexistência, mas a inexistência é o próprio sonho. Te deixar, sonho, não é uma ausência. A ausência abandonada é uma realidade que foi vencida.

Existir é novidade para mim

Tudo se renova, tudo existe, menos o existir. Não nasci, apenas existi. É cedo no existir. Pela alma, não há o nada. O céu não se mantém em almas fugidias. Devia existir um céu para a poesia, as estrelas não seriam necessárias para se sonhar. A lágrima engole a alma, sem dor, sem culpa. Apenas a alma conhece outra alma. Por mais que eu ame, nunca chegarei a ser amor. Por isto, existem vida e morte: para que eu não desista de ser amor.

Não há como caber dentro de mim

Mesmo intensa, a realidade não me preenche, não é como caber em mim. A realidade não é qualquer sentimento, é o reconhecimento de Deus no meu sentir. Tenho mais do que amor: tenho Deus. A essência da morte não é morrer, é dizer adeus ao conhecido, como digo adeus à morte. A alma não contém desespero, o desespero contém a alma, como mergulhar nas cinzas da morte e conseguir viver: aquelas cinzas nunca serão as minhas cinzas. As cinzas colorem a vida, parece familiar a cor do nada. A morte, exatidão do ser, num sofrer sem abismo. Detrás da cor do nada, acumulam-se sofrimentos. Detrás da simbologia do nada, o vejo como eu. Mas, detrás do nada, não há mais o nada. Eu vejo, amo o nada, sem o nada. Não seria o nada que devia me amar? Será que o nada ama diferente de mim?! O nada, razão para existir amor. Mas, o amor precisa de razão para existir? O nada me fascina, me embriaga de amor. Amor que pensei nunca encontrar. Desde que incorporei o nada, não há mais vida, amor. Por isso, o amor não pode condenar o nada pelo seu fim. O sol é apenas uma gota do nada. A frouxidão da morte deixa escapar o ser, fica-se apenas a perda de não morrer.

O som silencioso de uma lágrima

Tudo que se torna palavra não precisa ser poesia. Tudo que me tornei nas palavras foi sem poesia. A palavra não é apenas poesia, é o penetrar do abismo em mim. Minhas palavras somente aparecem na ausência de vida. Nada nas palavras é a minha palavra. Por isso, não escrevo para mim, e sim para as palavras. As palavras não são nunca leves. O nada é a única lembrança que tenho em mim, por isso espero que dure, pois sou feliz na lembrança do nada. A alma não pode incorporar o nada, ela é o nada, que me torna um nada. Não há palavras para o nada, que o façam existir, por isso o nada é amor.

A eternidade da eternidade

A consciência me faz não ser, a eternidade é a única consciência que tenho. Às vezes, é preciso parar de viver, para sentir o amor. Absorver a eternidade sem amor não causa amor. O amor é o fim da eternidade. Tristeza, sua morte é a minha morte. Deixei a alma entrar na alma como vestígios da minha alegria. O silêncio da alma perturba o silêncio da vida. Há almas que não têm silêncio, têm mortes. A eternidade é o único silêncio em mim, aceitável na dor. Não posso fazer da liberdade uma alegria. Nada falta à falta, por ser um olhar distante do mundo. Esse olhar é o mundo. Que fim o mundo teria pelo olhar? Não deixo o olhar ser o meu fim, prefiro ser o fim do meu olhar.

Alegria de impermanência

Pela impermanência, sinto o meu ser, mas sei que essa impermanência não é amor. Amor para mim é a permanência do nada, permanência perfeita, absoluta, como se eu estivesse segurando o sol em minhas mãos. Estou dentro do sol, que me irradia. O sol floresce, como se fosse uma flor, é quando sei que posso morrer feliz, pela permanência das coisas, que é o próprio nada.

O silêncio do silêncio

O silêncio se escuta na alma, a falta do silêncio não é viver. Se a alma não for o silêncio, não há silêncio. O silêncio do silêncio é uma maneira de eu esquecer o silêncio, ficando em silêncio. Fico em silêncio, para não pertencer ao nada da minha voz. O silêncio não pensa, mas tem vida, alma, amor.

A eternidade da solidão

A eternidade da solidão é a lembrança do desaparecer. A lembrança do desaparecer é mais do que lembrança, é a minha vida. A eternidade da solidão é o meu amor. Não há quem me ame mais do que a solidão. Apenas ela me faz parar de pensar, como se eu fosse a eternidade. Sonhos não são eternos, deixei os sonhos pela eternidade.

A existência é uma má-fé

São tantas cópias da alma que construo em mim, que não sei qual é a original. Não sei mais o que é alma de ser e o que é morte. O sentir machuca o sentimento, até eu perder o prazer de sentir. Conhecia o sentir pelo prazer de sentir, até descobrir o amor. Não me importa ter prazer em sentir, se amo. O nascer não é só, nasce unido a um adeus. Sem a morte, o respirar não flui, pela saudade de você, onde sinto saudade de mim. Será isso me perder?

O silêncio do som

Existir ou não existir, continuo com a mesma história de vida. Sofrer é o silêncio de um som. O prazer, a angústia, será o simbólico de ser, se tornando um não ser? Quando amo, sinto a impermanência da morte no meu suspirar. Assim, o silêncio do som se rompe na eternidade da vida, onde suspirar e falar se misturam, com sofreguidão, numa impaciência para amar este sempre, que é como uma nova vida, um novo amor.