Blog da Liz de Sá Cavalcante

O ser é o tempo de si mesmo

A vida não nasceu, mas respiro, como se a vida já tivesse nascido. Nasceu mais do que a vida, nasceu o ser, sendo o tempo de si mesmo. Um tempo sem vida, feito de ser. Cada vez que respiro, a vida se distancia dentro e fora de mim.

A apreensão do outro na minha apreensão

O sonho de ser não acaba rápido como o ser. A alma se entristece a si mesma, como se fosse eu a sofrer. Meu amor é puro demais para amar, mas eu amo! O infinito é pouco amor, o amor é muito quando é o fim. Fiz da ausência amor. Eu era apenas uma poesia, afastada da vida, não vivi o amor, vivi a ausência do amor, assim a minha presença me espera, sem ausências, no silêncio eterno, pleno de amor.

As marcas que deixei me deixaram marcada

Não sei quando minha vida acaba, mas sei que acaba nas marcas que deixei. Consigo viver apenas na ausência, que é o sofrer da solidão, onde cessa minha solidão. Vivi tanto, que não deu tempo ser eu.

Poema retalhado (feito de retalhos)

Tirar a ausência da ausência é como tirar o céu do céu, pelo retalho do poema. Nada será como antes, mas é melhor agora, que não posso esquecer o poema, que são apenas retalhos do poema. O poema nunca está inteiro; se fosse inteiro, seria só. O fim do poema é o começo de viver, onde não preciso de explicações para viver, basta chorar pelo poema, pela vida, e tudo flui. Fluir é mágoa que conforta.

Sentimento amordaçado

A vida consegue esperar que eu seja eu, no sentimento amordaçado de viver. Existir é a continuação da vida. As certezas que tenho são amar. O sentimento tenta me dizer algo que eu não conheça, conheço-me melhor do que o meu sentimento me conhece. Quero ter a vida de novo, como se nunca a tivesse perdido. Viver me curou de sofrer. Nada mais existe além da minha alegria. O sol se aproxima do mar, enaltecendo meu amor. Há algo além do mar? Nada sinto longe do mar, é como se a vida fosse um sonho do mar.

Ausências a se realizarem

A ausência da vida é a vida do meu corpo. Ausências que não se realizam deixam de ser vida, tornam-se nós duas. Duas ausências, numa dor de morte. Não conseguem sofrer juntas. Nada se vive sem ausência. A ausência tem razões que a ausência desconhece. Se a lembrança é uma ausência perdida dentro de mim, melhor não lembrar, para que a ausência não se sinta perdida em mim.

Quando sinto o sonho, a realidade aparece

Vidas emprestadas pela inacessibilidade da alma. A alma é o espanto de um vazio. Fui derrotada pelo amor. A vitória dói por dentro, como um sentir que se desprende da vida, do amor, para se sentir. O sentir existe no vazio do amor. Decorar a vida com o ser, verdadeiro ser, que não se encontra em alguém, encontra-se em ninguém, como sendo além da vida, do amor, do ser. O que posso escrever que seja como o voar de um sentimento, que não tem aonde ir, além dos meus caminhos, minhas ideias? Tudo desaparece na ideia de ser, como um sentimento que dura eternamente, como sendo o último sol, a última vida, para que tudo seja apenas o sentimento que desce como alma no meu amor.

Recuo ao infinito

Tentei amar sem o infinito recuando no que sou. Recuar é a falta do nada. Estou tão feliz em amar, que amo até a falta de amor, mas não aceito a distância da vida, perto, mesmo sem amor. A distância destrói a alma, não o amor. Para amar, tem que querer amar. Amor pode ser um adeus à vida. O amor é o que eu quiser. O silêncio recolhe a morte do amor, torna-a sombras do nada. O amor, reconhecimento eterno de depois, onde a sombra do nada é a única realidade de que necessito para viver. Não há sombras do nada sem a morte. Fazer da sombra do nada vida é um recuo ao infinito. Mas não posso recuar no que sou. Ser é sem infinito, sem esperança, mas me faz tão feliz, que, sufocada de alegria, vi que posso resistir a viver, ser a esperança de viver é melhor do que viver. Esperança não é vida, mas me cura da vida. Amor é deixar de viver, pela esperança de algo mais, pode ser o futuro, pode ser amor, pode ser o nada, que a vida não pode me oferecer, nem mesmo me amando. O que seria do amor sem o nada? E se eu for esse nada a amar? Não importa, importa apenas a alegria, que ela não seja o infinito da solidão. Tento me ver no meu amor, vejo a solidão me sorrir, sendo companhia eterna. Não consigo sorrir, a solidão sorri por ela e por mim, é por isso que a vida parece infinita. Vivo para uma vida que morreu. Foi aí que percebi que palavras são apenas palavras, eu sou apenas eu. Pensei que tinha recuado, mas continuei, sendo o infinito de todos que amo. Talvez isto seja viver: continuar. Sendo nós mesmos, estamos continuando, perdendo tudo neste continuar, que nos deixa puros para saber que Deus existe, é por isso que continuamos.

Vidas que respiram

Existo fora de mim, não me falta o amor, mas, quando olho para mim, vejo apenas amor. Morri, por ser mais que a vida; por essa superação, a vida ficou sem mundo. Respirar, canção que não se escuta. Se eu não sentir meu respirar, é porque estou vivendo.

Minha alma cessa na tua alma

Tua alma não sabe da minha, mas vive por mim? Tua alma, expressão da minha morte. A eternidade não tem alma, tem morte. Tudo cessa, menos a união de mundos e almas. Como, então, estou separada da tua alma? Eu prefiro sorrir a ter alma; alma se tem sempre, sorrir somente se tem uma única vez. Precisa ser assim, tem que ser especial, como sendo o respirar da alma, pousando na vida, para que eu não seja só.