Blog da Liz de Sá Cavalcante

Gentileza

Poesia é apenas poesia, essa é a gentileza de Deus. Não olha para trás, olhe para mim. Continuar a viver com a presença da morte, sem palavras. É perfeito morrer nas palavras não ditas. Elas não morrem comigo: se tornam a vida de alguém. A palavra ser é plena no vazio do ser. O início da alma é o ser, o fim da alma é o ser.

Consciência imaginária

A negação é plena, isenta de consciência. Vou amar até o amor acabar. Queria ficar com o amor, nesta incompatibilidade do corpo comigo. Queria ficar na alma, já que não tenho um corpo. O céu, do tamanho do universo, não aceita corpos. O amor é exagero da alma. Que alma desaparece no caos do amor? Fugindo da alma, me esqueci dentro da alma. O que desaparece se torna alma, para que eu possa te ver. Te ver é a alma que necessito. A ingenuidade é um adeus. Nada imagino numa consciência imaginária. Consciências são separadas da vida. O cuidado, o zelo com a inconsciência é o amadurecimento. Deixa a liberdade existir ao menos na inconsciência, que não está vazia. Inconsciência, te quero para ter consciência. A consciência é meu mal, é maléfica. A solidão é sem consciência. Não há solidão no vazio. A consciência é falta de falar com a alma. Insegurança é alma. Eu acalento minha alma. O tempo é um lugar para a eternidade. Há eternidades que não duram. Algo nasceu do nascer, talvez seja a voz da eternidade, talvez seja a vida ou o nada. Nascer vem de Deus. Deus é um sopro na alma.

Pele inabitável

Sustentar o nada é como ser eterna. A vida não consegue ser vida, é apenas uma pele inabitável. Não preciso de pele para amar, o cheiro do amor é a minha pele.

Meu tempo é quando eu partir

A negação é espontaneidade quando eu partir, minha alma fica contigo. Não vou precisar dela na minha morte. A ausência refaz o tempo como sendo um sair da morte ao entrar na alma. A imagem é diferente dela mesma quando é realidade. Todas as perdas, ganhos estão na realidade: estão dentro de mim. O nada é vida eterna? Será o nada coincidência do nada? De nada? Quero ver a imagem como uma imagem, não como vida. Quando eu partir, a vida vai ter um destino. Vida e morte são a mesma coisa, o mesmo céu, o mesmo adeus. O adeus é a manifestação da vida, é o céu feliz. O verdadeiro não é eterno, não une o ser na alma.

Lamento das almas

Eu me dou a minha alma, pela minha ausência. O céu é ausência do nada no ser. O ser do ser é o nada. Quem se vê no amor é eterno no amor. O que permanece é mais do que amor, é a morte. O que permanece não é só, mesmo sem amor. O acontecer aconteceu aprofundando as minhas lembranças, tornando-as reais como uma pedra que a alma leva embora. Viver por uma lembrança é ser para o nada o que sou. Assim, o lamento das almas é a permanência do amor. Amor na morte, não pela morte.

A alma da morte

Não há ressentimento em morrer. Morrer é a continuação da minha alma. Sem alma não vivo. A alma da morte me renova de amor. O lago do pensamento secou com o sol da vida, que resseca a minha voz de vida. A alma da morte é meu único pensamento. A alma da minha morte quer que eu viva, me faz viver, num sentimento sublime: na renúncia de mim mesma.

Pele inabitável

Sustentar o nada é como ser eterna. A vida não consegue ser vida, é apenas uma pele inabitável. Não preciso de pele para amar, o cheiro do amor é a minha pele.

A alma do depois

A alma do depois faz existir a alma do hoje. O sofrer sem alma é infinito. É onde cessa o depois, antes de ser um depois. O depois cessa, a vida não cessa. O antes da alma é o amanhecer, depois da alma, é escuridão. O tenho de ser é apenas um passado inexistente, como um agora, à procura de si mesmo, sem passado ou futuro, o agora não existe. Vivo o depois da alma como se fosse esse agora, e assim amo no nada, sobrevivo sabendo que o agora não virá. Como sou feita de agoras? Pela ausência do agora, que é o meu amor.

Insaciabilidade

O tempo sem alma não é vivido, mas é sentido como alma. Não há amor para o amor. Sem o passado tudo é vazio. Por isso, não vou entregar minha alma ao passado. Deixo ela ser o passado naturalmente. Se a alma é o passado, o que é o hoje? A insaciedade do passado ser o hoje é o amor desse hoje nascendo. O prazer de morrer é o passado vivo a me amar.

Corpo na alma

Para o corpo estar na alma, é preciso alegria, amor. A vida absorve o tempo sem o tempo. O único tempo é o corpo na alma. O corpo, sem alma, não é um corpo. Não nasci, estou entrevada dentro do meu corpo. Tua voz, dentro do meu corpo, é o silêncio a reconhecer o nada na minha fala. Escrever sou eu saindo de mim, desvendando o desconhecido de mim, mesmo sabendo que nunca o conhecerei, mesmo o tendo descoberto. A consciência do nada sou eu me abraçando, em vez de viver.