Blog da Liz de Sá Cavalcante

Chorar sem mim

Quem me ama, eu a chorar sem mim? Estou ausente no sofrer, mas sofro. A lembrança surge do nada, do vazio eterno. É fácil respirar no vazio, é suave como morrer. A poesia dá um sentido à morte, a vida dá um significado a Deus, não existe Deus sem vida. Deus é a vida da vida. A vida pode se isolar do ser, não pode se isolar de Deus. Chorar é me aproximar de Deus. Apenas eu posso me distanciar de mim sem sofrer. Deus é a única alma que sobrevive à morte, à vida, ao ser. A fé, razão da minha desrazão de ser. A única razão, a única fé é Deus. Deus é o continuar da vida, na distância que me une ao meu ser, à vida, a Deus. Pela distância que nos separa, me une a Deus: quero viver para estar perto de Deus. Deus me uniu a mim e aos outros. Se relacionar começa com Deus, é transcendência de amor, de ser, de alma: é a existência. Nunca será a vida que tenho. Tenho mais do que a vida, tenho Deus. Chorar sem mim é Deus em mim: minha maior ausência de ser!

Dormindo na morte que não acontece

O dormir é falta de morrer. Não durmo. Dormir é a eternidade de sonhar, onde vivo acordada. As pessoas não são de verdade, para não ter ilusões, chorar é ilusão da alma, é quando eu sou eu por uma ilusão, não na ilusão. Acordo sem despertar, é quando sinto que perdi minha alma pra vida. Nada me resta senão sorrir. Apenas na ilusão não posso brincar com a vida, com a realidade. Nunca chegarei até a alma, ela está além de mim. Nós nos comunicamos em sopros de saudade, onde nada se precisa falar, tudo é amor entre mim e minha alma, por isso, esse abismo entre nós: reflete-se no amanhecer. Se para não morrer eu tiver que amanhecer, reinvente-me, se descubra ao viver. Juntas estaremos como uma ilusão em sonhos, onde terei novas lembranças, mais tristes que a vida. Quem sabe? Nós nos cruzamos em algum momento? Apenas para nos refazer de nós. Saí de dentro da alma para a eternidade da solidão. Saí de dentro da alma, não tendo alma isso é solidão absoluta.

Harmonia

O nada aparece na sombra da inconsciência, como o sol da vida dentro da escuridão de ser, me deixa sem o interior, sem o nada. O nada são mãos fortes que sustentam a vida com amor. O amor mantém o nada no olhar, sem a névoa da vida. O nada no nada não é tudo, é ver ao sonhar, onde tudo desaparece, no que a vida me deixou. Será que a vida me deixou tão pouco, que me entrego ao sonho? Será que sou diferente da realidade? Ser um sonho é ser presença em mim, não na vida. A harmonia dá lugar ao mar, que é o infinito de mim. O infinito perde o céu. Há lembranças que falam e se escutam. Tudo sou ao escutar o nada de mim, sem a sombra da fala, que polui o amanhecer sem sol. O sol no meu coração me acorda sem luz, sem o amor de iluminar, de ser dia outra vez.

Decadência de morrer

Morrer como se eu não pudesse suspirar por mim. Suspirar é morrer, posso suspirar por mim. De mim nada restará da morte. A ausência é falta de me despedir da morte com a morte.

Desassossego sem caos

O desassossego, em harmonia com a alma, é plenitude. A vida não tem margem nem a morte é um descanso. A desolação é a margem de tudo, onde descanso da minha tristeza. Tristeza é o fim da desolação.

Abandono-me até nos meus sonhos

Sonhar é nunca dizer adeus, é fazer do adeus uma fala de amor para o ficar. O adeus é o sossego da alma, é onde a alma pode morrer em mim, na minha paz, para descansar sua eternidade exausta de amor. Terminar de existir é existir mais ainda. Existir no fim é nunca existir.

Exclusão

O céu é tão pequeno no meu amor, que cabe nas minhas mãos, assim, não exclui o amor de mim, por sentir o céu nas minhas mãos: isto é viver. O pensamento é imaginação. A alma vive de si mesma. Nada na alma é real, seu amor é real: tão real que parece irreal. A sombra é a irrealidade do olhar. Olhar é a irrealidade de Deus. Vejo Deus no amor. A inspiração cega o real e meus olhos não existem mais. A existência é o irreal. Posso tornar o irreal real pelo teu olhar, tristeza. Ser triste é dizer adeus à tristeza. Não há exclusão da alma, tristeza é alma. A luz é falta de alma. A falta de alma faz eu não notar o que me falta. A falta torna-se meu amor por mim. Respirar é falta de vida. Apenas pela alma encontro o nada sem sonhos, é um alívio, uma gratidão eterna com Deus é Deus em mim.

Deixa eu encostar minha alma na tua

A subjetividade desaparece na alma, faz nascer o amor. Não é o seu amor. Sinta minha alma, nem tudo está perdido. Alma, semente da morte, para a vida nascer sem a morte. A morte é um caminho, o único caminho a seguir. Não adianta ficar parada enclausurada em mim. Vivo através do olhar da morte. Penetrar no vazio pelas entranhas da morte, a ressecar o sol de lembranças úteis. O sol se esconde no pensamento como se fosse triste esquecer. É feliz não ser a sombra da ausência, esperança de sol, vida, no enclausuramento da intensidade. Profundidade se perde nas sombras da ausência: alheamento do nada. A sensação que penso ter é o vazio, nada tira o vazio de sua liberdade, que modifica a vida, a faz ter essência. Essência aniquila a dor, a dor, o passado: fantasma que faz sombra ao sol, quando ele é tão forte, queima o amor, o ressuscita. Amor, não cesse a solidão de viver. Deixe o céu sem agonia, a me contemplar amando: este é o amor que sinto. Pedras de amor dissolvem a água da existência como uma poesia fluida de desespero por viver. O que em mim vive? A solidão vive por mim, sem o meu suspirar eterno. Não é mais a vida de sonhos que vivi, é o que resta do mar sem poesia, em poesia. O fim do sonho é o ser, por isso, não sou um ser. Sou o universo da poesia, sem me importar de sofrer pela poesia, não por mim. Deixa eu encostar minha alma na tua para saber que te perdi.

Petrificar (endurecer)

O ser precisa nascer para perder a alma e se encontrar. Meu ser, minha alma endurecem, com o amor da vida por mim. Meu corpo imóvel move a vida. A morte é a minha sensibilidade no meu aproximar, até de mim.

As marcas da vida

A falta de marcas da vida em mim: é pior do que morrer. Tudo é melhor nos meus sonhos: o céu é mais perfeito, as estrelas brilham mais. Queria ver a Liz dos meus sonhos, conversar com ela em um sonho infinito. Nada tenho a dizer aos meus sonhos, mas, para a Liz dos meus sonhos, falo de amor. E assim me amo. Os sonhos são as marcas da vida: a essência da vida é o sonho. Se o amor existisse completamente só, não existiria o nada, e o amor seria puro, como uma estrela. O absoluto é o nada. Sem o nada tudo é vazio.