Blog da Liz de Sá Cavalcante

Rompante de lágrimas (rompante = irreflexão)

A irreflexão se refletiu irrefletida em lágrimas suaves, é como refletir. Espero morrer, me refletindo na morte. A morte me orienta em todas as direções. Me pus às lágrimas para sair da tristeza. Não há tristeza nas lágrimas. Meu sonho de tornar as lágrimas amor é apenas morrer, como se toda reflexão fossem lágrimas. Estou inconsciente por não chorar. Tudo se sofre sofrendo. É quando a insignificância tem valor. Apenas o céu significa algo para mim, por isso, não quero morrer para o céu ser a minha existência, minha única ausência, meu único amor.

Compulsão por sentir

Sei tudo do nada, não sei de mim. Preocupo-me com o meu sentir: não faz doer nada. Se doesse sentir, eu seria feliz, sentiria em carne viva onde a pele se decompõe em lágrimas frágeis de se ter, para magoar o amor. Não me torture sem lágrimas, sem mágoas. Ame-me, mesmo que esse amor seja apenas a mágoa de não te ter. Ardente compulsão por sentir, me faça me amar, amar o céu, ter forças para esperar ser amada por ti. O céu esperou e espera sempre por mim, então te espero, vida, como quem espera o céu, a morte, ou como quem espera viver!

Roda viva

Amo sem alma como alguém que se encontra apenas nessa roda viva. Eu a chamo de viver. A lembrança, roda viva que acaba em tristeza, não acaba com o fim. Gira, vida, no meu parar, que é ficar. Roda viva, alma, solidão, morte, nunca para. Estou encantada, esta roda viva sou eu, mesmo sem sonhar. Gira meus sonhos, para eu não me sentir morrer, e ser feliz.

O fim do nada

A noite capta a vida sozinha pela sua tristeza. Eu não capto a vida, não quero ser triste. Tudo passa, a morte permanece. Se não existe alegria, amor na morte, também não existe alegria, amor no ser. Ficar um instante na morte é atravessar a alma, deduzir que, depois da alma, nem a morte há. A luz do sol não invade o amor, é escuridão da alma, não a deixa existir, ela faz de conta que é a escuridão: é sua diversão. Escuridão é te ver como se visse minha alma, que é a minha identidade. Não há o que sofrer sendo. O fim do nada é a alma. Queria ser o fim do nada: consigo apenas ser eu.

Suavidade

Não aprofundei a suavidade da morte. Convenci-me no lado bom da morte. É leve morrer: é como te ver sorrir!

Para amar é preciso morrer para viver

Está dentro de mim essa morte que se torna luz. Perceber é vazio. Não perceber é ficar na plenitude do céu. A plenitude do mar percebe a plenitude do céu. O mar se mistura à plenitude do céu. O sol é o olhar do amor na plenitude de ser só, sem o mar, sem o céu, sem a esperança de sonhar, como se sonhar fosse ver o céu. Eu nunca vi o céu pelo meu amor, mas vejo o céu pelo amor do céu. O céu é o sofrer de Deus no meu ser. Sonho com a morte, em sonhos mortos, caídos de morte, sem o desespero de morrer. O que me aflige na morte é a sua ausência de mim, onde canto lágrimas que não choram, padecem no meu amor. A alma, às vezes, faz bem a si mesma: esse momento de perda é vital na alma. Olhar de perda para o vir a ser sem perda: ser apenas um olhar na multidão de palavras. A esperança é sangue nos meus dedos, que veem como sentem a vida. A simplicidade é amor. Dedos se soltam como mãos de amor, que, ao tocar o nada, torna meus dedos, amor para as minhas mãos, que se procura em dedos alheios. Dedos se espalham sem vida, em meu corpo débil de prazer em viver. Vidas me tornam um não ser. É tanta vida que não posso ser.

Devaneios de nascer

Não nasci ainda, mas, em sonhos, estou viva. Antes da vida, não era o vazio, era o nascer de mim, acabou com o nascer do devaneio. O nascer do devaneio me deixa solta no meu nascer. Nascer para não pensar. Pensar não traz de volta minha morte, minha vida. Morte, espelho sem alma, tem imagem do possível. A imagem do impossível é a vida. Se eu perder o impossível, eu vou morrer. O imaginário é a imagem concreta da morte. Se a morte existisse apenas na poesia, tudo seria mais triste ainda, mesmo assim, quero viver. A escuridão do céu são as almas dos que vivem.

O tocar invisível é amor

O tocar invisível torna o amor visível. Morrer é fácil, tocar o invisível do amor não é fácil. Abraços? Apenas em sonho! O destino escolheu a vida como seu destino. Preocupo-me com a vida dentro de mim, parece que ela nasceu comigo, ela existe antes de mim. Sei que cresci para morrer. Não procurei a morte. Morri como um vento sem sacudir a alma. Alma, o que fizeste de mim? O tempo que perdi na alma me socorre de viver. Tocar me tocando pelo teu sorriso. Nenhuma cicatriz da vida que não morre. Vencer é ser na morte. Detalhes não me fazem negar a vida. Evidências não são vidas. Levo comigo a vida ao partir. Partir, permanecer, não é amor. Não lembro de lembrar. Apenas meus olhos são a lembrança que não possuo. Esqueci de mim no que vejo, mas o que vejo não me deixa só. O sol, a vida não sabem de mim. Tocar o sol sem o sol me faz feliz. O amanhecer salvou o sol das minhas mãos.

Como me tornar o que sou?

A existência da alma é o nada, mas não é o nada da alma. O nada é livre como o ar. O ar se acostumou à vida, por isso não respira, eu o respiro. O respirar é a verdade que não se cala. O fim da verdade de viver, não me obscurece. A vida é a verdade do fim. O silêncio da noite é o fim do nada. A noite se recolhe nos meus sonhos. Tenho medo do nada acabar, o nada me faz um ser. Como me tornar o ser sem o nada? Não posso deixar o nada, não posso me abandonar sem o nada. Não posso morrer sem o nada. O nada é sem a procura de um adeus, mas o nada é permanência de mim. Procuro um adeus, como em um sonho.

Totalidade despedaçada

Tudo me abandona, menos a morte, nessa totalidade despedaçada, ainda me faz chorar, ainda a amo, como se pudesse ser a minha morte, inteira para mim.