Blog da Liz de Sá Cavalcante

O ser da presença

A presença é a definição de ser. O ser da presença não é o ser que existe. A presença é o fim de si mesma. Não há lugar no mundo para a presença. O fim é a presença, é a minha maneira de olhar o céu. O ser trincado é o seu céu. A Natureza regride como um ser, para o ser não ver a sua morte. Apenas a consciência não é morte, mas o ser é morte. A consciência nunca morre, a consciência do ser é consciência da vida, que parte como quem chega. Eu acredito na morte, na vida, mas não que sou o ser da morte, o ser da vida. Da distância eterna, não consegui nascer. Eu queria ao menos nascer, como um rio que se separa do mar. É decisivo nascer no desmaiar das ondas do mar. O que não se define acaba perdido no infinito, como o mar. Tudo me assusta sem o mar. O mar sopra a ventania das aflições para longe, num sussurro do nada. O silêncio do mar se parece com o sussurro do nada, acalentando o vazio de existir. Sem o ser, a presença é o mar. O oceano sem o mar, saudade do nada que nunca senti. A turbulência do meu amor esmaga o mar. Eu vivi o inesperado do mar: sua ausência, que perdoa a presença do mar, de não ser ausente como o mar. O sol faz o mar viver, na presença do ser, sem nenhum ser. Apenas o fim se define, distante do mar, perto de Deus.

A vida é um desafio

Como faço para conquistar a vida? Sei apenas morrer. Conquistei a morte, não sei o que ela viu em mim. Meu sofrer importa para a morte? O ser pelo ser é o nada, sem fragmentos do nada. Apenas a alma muda o ser. A morte é ter o momento pleno, como se não fosse nada. O silêncio, uma voz incompreendida, sem consciência do silêncio que me causou. Seu silêncio é meu silêncio. Não há presença do silêncio no silêncio. O silêncio, imaginação que tem força para destruir a vida. Não sei se o silêncio é infinito, mas a falta do silêncio é infinita, não dá tempo de ser só.

Plenitude cega

O que foi perdido em amar torna-se alma. A plenitude deixa minhas lágrimas serem meus olhos. A cegueira cuida de mim, é como ver teu sorrir no que não vejo. Não vejo para ser cega, de alma, amor, assim poderei conduzir a cegueira da plenitude. A plenitude cega são meus olhos. Anos de esforço para não ver a vida, ela se vê na minha cegueira. Nada vejo, apenas amo, sem saber o que amo, sem nunca ver o amor. O estranho é familiar. Sem a alma, a plenitude vive. A morte, distância do amor, necessária para refazer meu ser na morte. O tempo é o fim do amor. Nada sonhei dos meus sonhos, espero que o sonho se torne vontade de viver, assim como o mar devolve a terra aos meus sonhos. Plenitude cega, se eu te visse, ainda serias cega? És cega por quereres ser cega? Quero apenas morrer nessa plenitude de ser. O movimento do meu corpo deixa a morte em êxtase. O corpo não sabe morrer. A alma resgata o corpo no nada. O vento, alma do tempo. O sorrir esmaga o vento. Escolho a vida pela cegueira da plenitude. Tudo falta na plenitude.

O isolamento do nada

O nada se isola de mim, não de si mesmo. Nada importa sem o isolamento do nada. O nada vê melhor o sol no seu isolamento do que na companhia do amanhecer. Sonhar é distante do que sou, do que faço: nem mesmo a escrita pode ser sonhada. A essência da escrita é nunca ser lida. Assim, nunca lida, a escrita é a essência dos sonhos. Lembro-me dos sonhos, posso descrevê-los com amor. Sonhar é despedida, que não se isola da realidade. A vida não perde nenhum sonho, é por onde tudo começou. Viver de sonhos é deixar de sonhar. Como deixo de sonhar dentro de mim? Eu devia sonhar dentro do sonho, apegada a esta falta de mim, que é como um sonho. O nada não se isola, sonha.

A alma da vida é Deus

É pela alma da vida, que Deus nasce e morre. A vida torna a alma vazia em sua plenitude. O infinito da alma é o fim de Deus. O que morre não descansa, o que descansa apenas vivendo.

Súplicas de silêncio

Morte, erguendo-me nas minhas lágrimas. As súplicas são a frieza da vida. A dor não se machuca, é como se minha dor se perdesse em minha tristeza. Tristezas são cavilações da alma. Rezo pelas súplicas da alma. Que elas não se percam sem o céu das palavras, sem amor. Suplico apenas por palavras, que elas me digam quem eu sou. Sou nas palavras o que não sou em mim. Mas, mesmo assim, sou o que falta nas minhas palavras, como manusear o nada com amor. Cadê minhas palavras, quando posso senti-las? Tornaram-se o infinito de mim, onde apenas as senti nas minhas poesias. É como se se tornassem mais infinitas que a vida. O sol, as estrelas se ajoelham em poesias. Poesias são flores que não se plantam, cultivam-se, amando a poesia mais do que a mim. A poesia é a minha única realidade. Até as cinzas de uma poesia podem construir uma vida. Não há vida sem poesia. As cinzas do silêncio são o meu interior preenchido como cinzas do silêncio. Seguro as poesias, sem minhas mãos, como se fossem as mãos de Deus, levanto-as bem alto, tremo, assusto-me, são apenas as mãos de Deus acariciando o meu amor.

Inconformidade

Nada ser para a essência infinita, que une o ser nele mesmo. Resta a alegria do que já se foi, ter partido antes da alma. A alma é muito mais do que morrer, do que despedida, é o que permanece em mim, sem a sombra do olhar. Poesia, deixaste-me sem referência por encontrar a presença tardia da morte, como o que resta do esquecimento. Apenas na lembrança, a morte não tem fim. Não há o que esperar da esperança. Tudo ficou da morte, pela responsabilidade do depois. O silêncio, interrompido como alma, para dar um fim à minha morte. O fim é o silêncio mórbido que escapa na dor. Dor, contida de esperança de que a alma nunca seja o fim.

Destruição do meu ser

O tempo se fez sem a solidão. O depois é sem o nada do tempo. Apenas a solidão conhece meu amor. O fim da alma não é só. Apenas o indestrutível do meu ser se destrói. A vida se destrói sem o ser. A morte é o bem da alma. A ausência não tem morte. O que importa é a destruição do ser, a morte não importa. Desligo-me do mundo, o mundo era a essência da minha alma. A esperança de existir o mundo é apenas a essência do ser. O mundo, mesmo sem o ser, é essência do ser. Pela destruição é que existe o ser. O ser se destrói antes de morrer. Não existem o bom e o ruim, existe apenas a destruição. Nada se destrói só.

Vestígios do nada

A alma, por ela, ainda percebo os vestígios do nada, como sendo minha vida. A imagem surge do esquecimento. Alimento-me da luz que me invade. A luz alimenta a alma, deixando-me sem luz. Deixar sem luz é resplandecer a luz. A luz é o calor do corpo traduzindo a realidade sem luz. A luz observa, é observada, sem a esperança de vê-la sem luz. Sem luz, não é escuridão. Vestígios de luz escondem o sol do sol. Vestígios do nada clareiam a luz. A vida não é claridade, é escuridão. Quando a escuridão se aproximar da luz, irei morrer. Morri na união de luz e escuridão, que foram a moldura da minha morte. Ver a morte não a explica, senão ela perderia todo significado. Só, comigo, a luz não se perde, na imensidão da escuridão, a vida se modifica. A alma absorve o corpo pela luz do saber, que nunca será a luz do amor.

Evitar a alma

Evitar a alma é amor infinito, é como se eu fizesse nascer estrelas no céu pela ausência de alma, que não é minha ausência. A ausência é sem alma, a morte tem alma. Tudo que nasce é alma, o que morre é o ser. Não existe nascer sem alma. O meu suspirar é uma esperança da alma de que eu possa nascer de mim na presença sem alma. Renunciar a alma é um pedaço de mim que não foi perdido. Essa renúncia foi vivida como presença, embora a alma não tenha renúncia, presença, consegue que eu a ame em seu silêncio. A falta de alma é ter você! Não renunciar a alma é morrer.