Blog da Liz de Sá Cavalcante

Resignação

A vida não está completa, me resigno à solidão da incapacidade de viver. Vivo, pois o instante não está separado da vida. Eu não estou dentro das suas forças. Isso não me diminui, me faz superar a mim mesma, por isso suas lágrimas são por ti, como gotas de céu, que falta amanhecer por ti. Por isso me entristeço por ti, poesia, para que viva com minha vida. Agora, estrelas saltam de ti.

Sentimentalidade

Não me satisfazer no amor, esperança da alma de amar. O esvaziar-me no teu corpo não é alma, amor, nada. Tantos anos para nenhum amor. A substância da alma é o nada. Deus não é menos que a alma, a alma me diminui na presença de Deus. O não ser é alma de amor. Tenho vontade da alma viver sem mim. Eu a contemplo no ar para poder vê-la sem deixar de me ver. O sonho me contempla e eu a dormir. Não sei se este é meu corpo, se esta é minha alma. Sei que me sinto só. O amanhecer é a alma que não está perdida. Como posso perder a alma com um sorrir que não é o meu. Há mais do que sorrir na alma, por isso a alma morreu, por eu a amar.

Desânimo

Morrer pelo amanhecer é deslizar como a alma no céu. Desliza até o amanhecer. Ceder a poesia, como um resto de nós. Nós, me separa amanhecendo. Tudo de triste partiu, continuo triste, sem motivo, assim como o sol, não tem motivo para amanhecer. A vida é infundada na realidade. O corpo é vida da vida. Excessos de nada me atormentam. O nada me relaxa. Quem é esse nada? É a virtude, o verso sem poesia. Distraída, durmo no nada, como se fosse a presença de Deus. Deus é a única lembrança de mim, que vive sem mim, coberta de mim. A espera de um adeus é aceitar a vida como é. Parti em Deus. Nada tem a cor da vida. O desânimo chega ao mar, não é frágil. O mar me desafoga no sol. Explodi de dor na erupção do sol. O sol parece a solidão do mundo. Como deitar-me quieta de vida, e ardente da vida como o sol. Não há explicação para o nascer do sol, nem para as minhas respostas de sol. O tempo é uma experiência de sol. O sol faz nascer a vida. Nada a vida leva de mim. O princípio do sol é o meu rosto no nada. Nada dá certo para mim, dentro do meu sol particular. O vazio, ocupado de me sentir, deixa-se desanimar, de ser vazio.

Mundo impuro

Não nego a pureza da alma neste mundo impuro. A alma não se tornará o mundo, o mundo se torna a alma, sem a remissão da alma. Deixo a alma livre para amar meu amor sofrido, como se ele fosse alma. Alma é a consequência de amar. A gratidão da alma é o ser, seja onde estiver. O que está nas alturas é a morte. Ando céus de fé. Chorar o amor perdido, ser humilde e amar o amor. A saudade ainda não se perdeu. Meu corpo é a saudade de mim. Lembre-se de mim, não como ser, mas como saudade, e não sentirá falta de mim, sentirá amor, meu amor por ti. Emana vida em mim. O amor não se desprende do céu exterior, nem do céu interior. Criar uma imagem para a morte é não ter alma para discernir o que é meu e o que é do mundo. O que é da vida, o que é da morte, é meu também. O que é da vida vai ser meu na morte. A impressão da vida é o mundo, o mundo não é vida, mostra a vida, com o objetivo de um fim. O fim não precisa de conhecimento para entregar a morte ao ser, não o ser à morte.

A luz dos meus sonhos

Há luzes que não estão nos olhos, são sonhos que me iluminam, e eu os ilumino. A sensação de luz é de perda, refaço as perdas na escuridão para a luz se iluminar e as perdas se fortalecerem na luz. Não há luz no amor. Perdoo o perdoar da luz com a minha ausência feliz. A realidade, ausência absoluta de mim. Às vezes preciso sair do real, me comunicar com Deus, com a morte, com o meu adeus incomunicável de viver. Vivo porque me concebi assim para o sol, a vida. Não volte, alma, para mim, para mim basta que me conheça bordando a vida, não se preocupe comigo, pois eu estou contigo, alma.

Decepção

O amor, decepção eterna, como se a decepção fosse o último momento entre nós: perder foi o último momento para poder renovar a vida, a tristeza, no mar. O mar é a beleza do céu. Tudo no céu é mar, que me evolui no amor que sinto. Nada mais quero da vida, quero apenas o mar em mim, nada mais me faltará. Tenho tudo, tenho o mar. Sou privilegiada, o mar distante é o que está perto de mim, respira por mim, onde não posso deixar de ser eu. Agora consigo chorar por mim, com lágrimas de mar. Sonhos impossíveis são possíveis, eu sou um sonho impossível, que se tornou possível, como se fosse eu a única luz no céu, a povoar minha solidão. Recebi o céu de corpo, alma, feliz, por ele me deixar viver um pouco mais a cada dia. Se eu morrer, que a sombra da minha ausência me cubra com meu desejo de viver. Queria que o céu soubesse que sempre fui dele, em poesias. Não vou sair de dentro de mim nem mesmo morta. E o sol se fez para mim, não tenho mais medo de morrer, mas insisto no quanto quero viver, como o sol, o mar, até ter o infinito em mim para morrer, numa aceitação infinita de mim. Se eu viver, darei o meu melhor, serei como o sol, a cuidar das ondas do mar. Não serei mais só, quem tem vida em si nunca morre, se encanta.

Flutuações da alma

A alma não se contém em mim, como o mar suspende suas ondas na primeira ausência de luz. Luz é ausência, machuca a solidão, cria o outro em mim, por mim. Palavras embelezam a solidão com responsabilidade. A responsabilidade do céu é fazer da solidão poesia. O céu flutua em minha alma. Tenho que saber de mim, do céu, das estrelas. Para saber de mim não preciso me sentir. Senti coisas mais difíceis do que me sentir: senti a pureza do céu no meu amor. Amor que move as ondas do mar, como uma canção perdida, entregue ao nada da solidão.

Algo pode ser eu sem mim?

A vida vive das minhas lágrimas, do meu sorrir. Sonhos não são sopros de dor, são reconciliações com o nada. Nada se esqueceu de mim, não existo. Eu ia me sentir diferente sem os sopros de dor, acordam o amanhecer nos meus sonhos. O sol é um pedaço de nada, um universo interior para consolar minha solidão. Meu nascer infinito, do que não nasce, sonha. O infinito, sem nascer, é a margem do que sou. Essa margem do que sou desvenda a falta de infinito: é como andar descalça no fim, sentindo o infinito no céu. No céu dos meus pés flutuam sem amor. Não me refiz em céu. A saudade é um céu afastado de mim.

Imensidão

Não há imensidão no amor, por isso, ele é verdadeiro, maravilhoso. Nuvens de fumaça a esculpir o céu. Na alma, manchas de um passado vivo. O inexistente é o passado onde eu ainda sinto o nada como concreto. Amor, palavra sem passado, o amor é feliz. Feliz como se tivesse um passado. Meu passado é o que me acontece se não me sentir o vento, o sol, a vida, são meu passado, no amor que sinto agora em que eu sou eu, e a vida é a vida. O vento, marcado pelo sol, faz calor. A voz não alcança a fala, alcança as estrelas: ondulações de uma voz perdida no espaço da minha sombra. Sombras de ar a me encher de bondade. Respirar se torna amor.