Blog da Liz de Sá Cavalcante

A negação do passado pode mudar o futuro?

Como negar o passado pelo futuro? Amor é recomeçar sempre só em mim. Mesmo que eu pense que é o fim, não é: não posso nem começar com outro alguém. O futuro é a solidão do pensar. Não posso te dar amor se não me amar também. O vazio só cessa com outro vazio, pode-se esquecer a morte em outra morte. A essência não se desenvolve, fica sem solidão. Eu tenho que conviver com a solidão sem o interior, assim, o vazio se torna minha morte.

A negação é uma consideração com a alma

Não me sinto real, não sou real, mas de mim sai algo real: a poesia. Tão real a poesia, que não importa se sou irreal. Sinto-me viva apenas quando escrevo. Escrever é luz quer não se apaga. Na poesia, o amanhecer é eterno. Considero a alma negando-a. Negar é querer algo de mim. Fazer da negação uma afirmação é dizer sim à ilusão e às suas consequências. Há tanto tempo existe a vida, mas nada mudou com a vida. É do mesmo modo quando existia apenas o nada. Não me sinto vazia com o vazio: com o vazio sinto a alma, mas o amor da alma me esvazia, exaure. Nessa exaustão encontrei o meu ser. Nada é suficiente na alma, mesmo assim, ela é feliz.

Mais do que a vida

A alma só faz por mim mais do que a vida. Tento ver as palavras em mim. As palavras adormecem em mim num despertar eterno. Mais do que viver, as palavras me fazem dormir em ausências, seu fim é a poesia. Se a poesia fosse sem palavras, seria tudo, todos a compreenderiam. Sorrir não precisa de poesia. Sonho mais do que a vida. O infinito é a parte negativa do meu ser, que cismo em manter viva. Entre tantas partes resta infinito, sem nenhuma parte dele mesmo. A vida era para ser as partes do infinito.

Desperdiçar

Desperdiçar a vida num único sentimento de sofrer me faz não perceber o sofrer que não é eterno. Esse sofrer que não é eterno pode ainda ser alegria. Afastar-me da vida para nada sentir me faz sentir mais ainda o amor, a vida. Quanto mais eu desperdiço o tempo, mais tempo há. Quando quero viver o tempo, não há mais o tempo. O tempo é a modificação do divino. Nada reage ao tempo. Não uso o meu corpo. Deixo meu corpo afundar no nada, ele rejeita o nada, fica boiando na vida sem mim, até meu coração se separar do corpo, no inseparável de mim. Afundar é nunca morrer. O afundar, tão inerte quanto meu corpo, não me deixa fazer meu corpo sofrer. Morrer é apenas sofrer. Meu corpo, alheio ao afundar, a minha sensação, não pode transformá-la em amor.

O nada é amor?

O ser e o nada, maneira de ver a vida como ela é, e me ver inteira em mim. Não há amor entre o ser e o nada, pois o nada é amor. O amor é fiel. Se me sinto amada, depende de como sinto o nada. Ressignificar o amor como nada faz eu lembrar da vida. A lembrança é o nada no nada, não no amor. Tem amor que não necessita do nada para ser amor. Saudade é uma maneira de fixar o nada no amor pela eternidade da poesia. A poesia é a voz do nada. Sem o nada não conseguiria conversar. O nada foi a única conversa que tive comigo. O tempo e o nada são diferentes quando o nada é amor.

A morte é obra humana

A humanidade criou a morte com seus erros. O desaparecer é a aparência do nada. A morte não tem aparência, por isso, eu a vejo sempre mais. É pela inconsciência que sinto vazio dentro de mim. A morte conversa comigo no meu vazio: parece o silêncio da vida. Não sou, o vazio e a morte são. Nem a morte me faz existir, minha única esperança de existir é pela morte. Não existe vida sem poesia. Poesia é aceitar a morte para viver. A existência é a morte sem a vida. O corpo deixa o vazio noutro corpo, um corpo fantasma, que libera o corpo num nada sem corpo! O corpo sem o nada é a liberdade da solidão que sinto meu corpo viver sem a solidão. Meu corpo se abraça para não ser só. O corpo é a alma aprisionada na alma. A vida da alma é dar prazer, amor, minha vida é ser amada. O abismo é o chão, o chão é o abismo. Minha alma é o chão do abismo. Será que existe apenas eu e o nada? Será essa percepção o fim da solidão? Solidão é uma vela acesa na escuridão, e os fragmentos de luz dos meus olhos veem apenas a luz da solidão, sinto como vida, esperança. A eternidade não é só, pois a morte é obra humana. Eternidade é o que ficou em mim para sempre em morrer: a tua vida.

Ressignificar (dar um novo significado)

O mundo pode ser mundo e conhecido ao mesmo tempo? A morte é apenas saudade de ser. Sem a morte, sem saudade de amar. Saudade é imaginar tão distante sem prever a morte. Apenas a morte sabe o significado da vida. Sem a saudade, sem morte, sem ser. Ressignificar o ressignificar é deixar o vazio falar tão alto dentro de mim, que encontro palavras para a morte: amor, amor, amor…

Recordações de ideias

Lembro-me apenas que lembro no sentir, não sei o que lembro. O silêncio que acolhe o nada é uma boa maneira para recordar que o vazio não é quieto; sacode-me, revira-me ao avesso. As recordações de ideias alegram-me enquanto existem, mas o não existir também é uma ideia, uma recordação.

Uma realidade menos morta

A morte tem que ser o nada. Se a única realidade é morrer, vou viver! Viver até que a realidade se perca no meu viver, que torna a realidade infinita, como um pedaço de papel que se vai com o vento. O vento da realidade é o pensamento. Eu queria ser os pensamentos da vida. Ser eu é não pensar em mim, na vida, deixo o pensamento escorrer como sangue para não escorregar no pensar. Pensar é um pensamento da alma. O balançar do amor embala a alma. Não sei o que vai ser de mim na alma, mas sei o que vai ser de mim em mim. A morte não tem nada de morte, mas sua realidade está morta, dentro do céu, que perdeu a sua realidade para Deus! Deus não é uma realidade, é espírito. O corpo sai de dentro da alma para construir outro corpo para a realidade nascer do amor. A vida não pode fazer do tudo o nada. O nada não nega que é nada, nem mesmo nega para a natureza morta. A realidade morta é uma natureza viva: esse é o encanto da poesia. Tudo morre como a sombra de Deus. Ninguém tem o sol nas mãos, mas o tem na alma. A liberdade do sol é o meu olhar. Meu olhar se torna sol do sol. As minhas mãos são uma realidade viva. Pelas mãos, pelo tocar e ser tocada, nasce meu corpo. O corpo ganha vida. Uma realidade menos morta não me deixaria tocar o céu, nem sonhar, não me deixaria ser eu. Convivo melhor com uma realidade morta, onde sei amar, ser, conhecer-me. É por onde a realidade da poesia desaparece, para eu ter outros sonhos, outra realidade. Apenas a realidade morta não é imaginada. Pela realidade morta, liberto-me da poesia, não há mais o que sofrer, viver, estou tão morta quanto a realidade. Somos duas mortes numa única irrealidade: a de viver. As mortes buscam mais a vida do que as pessoas. É preciso valorizar a vida, por isso, torno minha vida útil: ensino a sonhar, assim como me ensinaram a ser eu. Tudo passa, a morte passa, o amor fica.

Pensar da alma

É inesquecível a morte, está no meu respirar, na minha aflição, no meu ser, no meu destino de não parar de respirar, de morrer. Respirar é morrer. Pensar na alma oculta o respirar de mim, mas esqueceu de esconder também a lembrança de respirar. Respirar me torna só e a lembrança de respirar é pior: é morrer lembrando que morri.