Blog da Liz de Sá Cavalcante

Perplexidade

Quero minhas lágrimas ocultar da alma, sem me esconder. Quero a tristeza mais perfeita, na perplexidade de me sentir existir. Como ouso existir? Eu existo em abraços de vida, numa alma inconfessável. Falo de mim, não por mim. Se meu infinito particular fosse meu corpo, não necessitaria tanto abraçar para me perder, seria independente com minhas perdas. Minhas perdas são minha voz, meu suspiro. A fala se cala, as perdas não se calam. As perdas transformam o infinito em nada. Não me preocupo com a vida, não me preocupo comigo, quero apenas parar de sentir. Sentir me machuca mais do que sofrer. Quero dar asas ao céu para que ele conheça outros céus, tenha outros sonhos, mais humanos, reais. Tão real que seus sonhos sentirão o céu num novo céu, onde o amor nunca deixa de amar. Que importa o amanhã? O amanhecer, para mim, é esta minha alegria infinita de ter fé em mim. A esperança é o dia a dia, a fé, sou eu.

A lua

A lua é o infinito do meu amor, que me faz sentir eterna, como se não houvesse sombra na lua dos meus olhos. A lua desmaia como uma poesia: é quando a lua está lua cheia. A falta da lua me faz sonhar, eu a imagino como um sonho, um sonho de viver, para esperar o amanhecer que pousa em mim feito lua, mas não sonha. O sol se perde no horizonte do amanhecer, encontra a paz. O sol e a lua brigam por um lugar no mundo. O sol é a paz da luz. Do sonho nasce o sol e a lua, no tempo de sorrir. A lua tem uma função secundária perto das nuvens. Quero morrer como a lua a partir, se misturando com o sol. A presença da lua é o sol. A lua é uma poesia sem ideias, sem alma, sem sentimentos. Este é o encantamento da lua, é também o seu fim.

Espelho de dificuldades

Um espelho de dificuldades a se quebrar dentro de mim, é quando sei que nada me resta. É melhor o positivo do que sentir? Será o positivo a morte? Então o positivo não adere a morte? O espelho suga minha aparência. Minha aparência é agora apenas a falta de um espelho. O espelho adere a aparência ao impossível de ser. Apenas olho para minha aparência, como algo distante, que nunca deveria ter sido. Não me conhecem pela aparência, mas pela minha essência, pelo que sou. Por isso, sem aparência, sou feliz. Meu ser não é um ser, é apenas alma, que transcende no nada: realização do infinito, onde tudo é apenas um espelho que não se reflete no amor.

Dando vida à morte súbita

O tempo virá como alma para o inesquecível de ser. Não há vida nem morte: há o ser. A morte é mais sagrada que o amor. A morte queima por dentro de mim. A música não canta, exala vida. A espera são flores do que já existe. Ainda chamo de vida o que existe, mesmo não sendo vida. A vida é o meu universo. A alma não existe, não tenho como amá-la, mas a vida a ama por mim. Se o amor for o universo, não existo mais. O tempo é o universo a se fazer poesia para mim. O amor, para ser amado, precisa de poesia. O sol, sombra da morte, aparece feito alma. Vivo pela falta de lembranças, como o sol a se esconder no infinito do meu olhar.

Movimentos da alma

Envolvendo-me, envolvo a vida, abraçando o nada: esse é o movimento da alma. A dificuldade de respirar é a alma. A ausência é o fim da alma, num respirar, é a alma. A ausência é o fim da alma, num respirar tão eterno que parece ser um sentimento. O amor não acaba com o desamor. O amor é qualquer coisa que eu consiga lembrar que faça sentido para mim. O mar faz sentido para o sol, onde perde o escutar. O fim espera pelo amanhecer para viver. Eu sou o próprio amanhecer, por isso nada espero. Minha única ilusão é viver. Algo incapaz de ser, de morrer, de viver, jamais será alma: é apenas uma tristeza, sem nada ser. Por que não posso ter a tristeza de morrer? Talvez nem a tristeza me queira. Algo na alegria diz sim para mim, pode ser apenas o vestígio do nada, a deslizar no vento, como uma lágrima caída do céu a se fazer sorrir para mim.

Ventania de versos

Morrer é o pedaço do céu, que não existe mais. Para que pensamentos de amor se vou morrer? O céu se mistura, se funde com a ventania de versos. Cancelo as palavras de amor, fico com o essencial: a vida. Assim, conseguirei escrever versos sem palavras. Ser pode ser nós. Se me descuido do amor, o amor seria um erro que necessita de mim para acertar? Vou guardar a vida dentro de mim, para ela não cessar. Quem sabe assim eu descubra a eternidade do meu ser dentro de mim, distante da vida? É assim que tem que ser. Não podia ser diferente: a eternidade está em mim, como as poesias, ambas se completam. Assim nasce a vida, livre da tristeza, da agonia agonizante. A vida nasce como um sonho, até evoluir, se tornar real.

Rios de pensamentos

Os movimentos da alma são como rios de pensamentos. O pensar consome a alma parado. Distribuir a alma multiplica a alma em mim. Viveria mais no infinito sem alma como um momento decisivo de vida. Fui feliz sem viver. A vida seria melhor que a própria vida no amor. O sentir da vida é o meu corpo, por isso, não pergunto por mim, estou onde meu corpo está. A inessência se faz vida. O fim é a presença da vida. Quando o fim não acontece, o nascer não diz adeus, se despede num até já. O momento de partir não é o seu fim, é o nascer absoluto, corpo cravado na pele pela imensidão do olhar da solidão. O olhar da solidão se desfaz em pele, em morte. O filho da vida é o futuro. A vida é o amor que não tenho em mim, por isso mergulho na vida sem a superfície do agora, que cessou o amor, por eu viver na profundidade de mim. Mergulhar na secura da imensidão é morrer infinitamente, na companhia eterna do nada. O que me marcou nessa alegria foi essa letargia sem sol. A alegria sem significado é o sol. Vesti-me de sol, como quem encontra a alma no sol, inerte, como se seus movimentos fossem o desaparecer da vida, completando seus movimentos sem os movimentos. Rios de pensamento para cada movimento seu. Vida, que é a conquista de um adeus sem nome, anônimo. Os movimentos suspiram até morrer, eu fecho os olhos para mim e os abro num começo infinito.

Véu de contemplação

Se eu pudesse partir o que se foi ao meio, para nunca mais voltar. Minha alma é um véu de contemplação. Minha alma esconde a realidade do mar, da vida, das estrelas, mas não pode escondê-la de mim. A alma derrama o mar nos corredores do fim. O amor sente falta da vida para preencher seu fim. Sentir não é conseguir nada. Consigo com o meu amor, que não consegue me perder. Sempre amanhece para quem é só, amanhece pelo sonho de uma poesia. Meu olhar é o amanhecer mais puro que Deus me deu, onde amanhecer é apenas o horizonte nas margens do meu ser. As lembranças são solidões que não duram no ser. Permanecer é deixar as margens da vida morrerem na minha permanência. Minha permanência parece um adeus inesgotável. Sei pouco sobre permanecer, por isso, permaneço. Permanência, quero sua proteção para morrer por ti. Antes não existia morte, por isso nasceu o vazio. O vazio nasceu sem erros, de corpo e alma, me tirou a vida, me deu o céu, que era só antes de mim, dos meus sonhos, do meu adeus. Tudo era só antes de Deus, até o céu é só sem Deus. Me fiz só em Deus. Deus me quer só? Nunca amanhece nem pela solidão. É preciso acreditar na força do amanhecer. Nada pode ser eu quando amanhece, nem mesmo posso ser eu. Eu dentro de um ser inexistente, chamo-o de ser eu. A insistência com que chamo o nada é a minha voz sem se enfraquecer de alma. O que enfraquece a alma é a falta do nada, de viver. Me incomoda que exista o não viver, sem morte, sem sofrer. Gratidão é não sofrer, não odiar, morrer apenas de gratidão é conseguir chorar minhas perdas com amor, elas não me pertencem. Como o princípio do nada irá viver por mim, se nada sinto pelo nada? Olhos que seguem não vivem, onde o pensar desaparece como nuvens ao céu. Se entrega à indefinição do sonho. Sonhar me faz morrer sem o céu me esperar. Alguém chegou na morte para me levar em um sonho. Estava a dormir estrelas, como se as estrelas minhas fossem iguais às do céu. O céu vive sonhos isentos dos meus sonhos. Os passos do sonho é por onde ando sozinha, sem nada querer encontrar. Morrer é o espírito ficando no ser, num adeus a si mesmo.

Labirinto da alma

O invisível são os olhos da alma. O controle da alma é o seu sofrer. Fazer da alma duas almas, esticá-la até o infinito é ter agora a alma do infinito, essência da alma do finito. O fim pode esperar pela alma. Alma, foste alma até o seu fim, é raro no ser. Ser um ser até o seu fim. O fim é a razão das palavras. Não leio nem compreendo as palavras pelo seu fim.

Horizontes de sonhos

Para nada ser é preciso ser livre. No horizonte de sonhos inesgotáveis, ninguém sabe se vai acabar, se tem um fim, esse horizonte de sonhos. Vejo o horizonte de sonhos, não vejo a vida. O horizonte não necessita do fim, ele é o fim em um sonhar por sonhar. O sonho sonha apenas com o horizonte, longe do fim. A realidade cessa, nasce o ser. Para o ser, o horizonte estimula a realidade. O horizonte se abre, expande-se em minhas lágrimas de amor, ressecadas pelo tempo. O tempo de chorar é o tempo de Deus. Vejo melhor o céu no horizonte marcado de luta e poesia. O céu define o horizonte pelo seu amor. Amor que buscou no ser, mas encontrou esse amor apenas no horizonte da solidão.