Blog da Liz de Sá Cavalcante

O ímpeto de viver

Não há vazio sem mim, em mim. A permanência da morte é o fim da morte. Penso nas coisas que não vivem como sendo o nascer do sol me fazendo viver. Viver pelo que não existe é como acender a alma dos mortos pelo meu amor, de amor, pelos que ainda vivem, pelos que vão viver ainda da vida dos mortos. Morrer deixa a ausência vazia. Ausência é plenitude. Na ausência não me sinto só. Só é o meu amor! Amo só, por isso, não sou só.

Acreditar

A alma não tem lembrança, perda, por isso ama. Ama e acredita na vida. Matar a alma para salvá-la de acreditar. Acreditar é ter algo. Poucas pessoas têm esse algo: essência. Para aprender a não acreditar na vida. A essência é simbólica. Acreditar é poder mudar a vida pela vida que ela tem. Ainda é tempo de amor. As almas que se foram mantêm a vida viva. A desconstrução da alma é o amor. Alma morreu sem nunca ter amado. No vazio não me perco. O vazio sem o vazio é como o vento, como o sol, mas continua vazio por ter as estrelas do céu. Não há céu, estrelas, na plenitude. O sonho guarda a vida dentro de si, por isso, ele tem vida eterna. Tão eterna que desperta o sonho com ele a sonhar. Não faltam sonhos na vida, faltam pessoas que mereçam esses sonhos. Não resisto ao sonhar, quase não volto à realidade, que não é o real em mim. A alma se entrega à vida sem acreditar nela.

A morte me observa

A morte me observa pelo seu interior. Sou argila nas mãos da poesia. Sou destino, se a poesia é mar. No mar, sonhos eternos cessam, dão lugar à imensidão no fim de mim. Meu fim é fim do fim. Não há ser nos teus olhos, há apenas um mar de sangue. A infância, já gasta de tantos sonhos, não se sente só em mim. Infância é seguir em frente. Viver é ser criança. Não existe morte na infância. A criança desvenda o tempo como um sonhar eterno. Sonhos são o infinito. Depois de você, poesias tristes definham, torturam-se, mas não consigo nem me ajudar, o tempo foi eu para a poesia, num amor que não existe, e, assim, ajudei a poesia, como um resto de mundo guardado para mim, para eu renunciar a mim, num tempo feliz. A alegria percebe quantas estrelas tem no céu, e para ela, cada uma é única. Tudo me sorri, é como sonhar. Nada se compreende vendo: compreende-se amando, sonhando, até o infinito. Meu ser sofre minha ausência. Ausência é o passado que jamais saiu de mim. Necessito sonhar como o céu necessita de sol. O fim do sol é o céu. Não se criou o céu sozinho perto de Deus. O sol nasceu do céu, o céu nasceu do sol. Não nasci do sol, sou espectro do sol, que arde de vida, de prazer, amor. O sol torna tudo mais lindo, alegre, vital para mim. A morte dança em meus olhos para ser admirada por mim. Eu acompanho cada melodia que cessa meus olhos para que eu viva. Observar não é ver: é ter o sol na alma!

As múltiplas faces do espelho

O espelho tem muitas personalidades, por isso, nunca me vejo no espelho, vejo nós todos no espelho, quando não estou consciente da múltipla personalidade do espelho. O espelho é um mundo preso à ficção de ver. Vou morrer no que vejo. Se ao menos visse a mim, a minha morte, teria um significado. Ver nunca foi não morrer, não tenho medo de não morrer, não tenho medo de morrer, tenho medo de escutar minha solidão, como escuto o mar. Renascer para a morte tem mais valor do que a vida. Viver para a morte, apenas em sonhos, é possível. Renascer para a morte, reluzir, afastando o nada: alma que se escuta. São inseparáveis a alma e o nada. A ausência é o que existe. O que não existe é presença. Remexe alma até nada se mexer. A realidade é distante no mar. Quantas vezes o mar pode me sorrir, até entrar nas suas águas, de onda em onda, de céu em céu, até perder o sorrir no meu sorrir? O céu não tem medo do amor, tempestade, do ser, da vida, da morte. O céu tem medo de nada poder oferecer a Deus. A eternidade do amor é a sua morte. Não há espelhos em se morrer, para ser apenas o que vejo em mim.

A escrita e o amor

O amor e a escrita, minha única realidade. Às vezes sinto falta de outra realidade. Mas a realidade aceita a minha realidade. A vida não é natural, se tem a escrita do amor. Fico à vontade escrevendo na minha morte. A morte pode ser acrescentada em palavras de amor. A morte são apenas palavras. Eu acreditei que a morte ia definir as palavras com meu amor. Mas meu amor não são palavras: são reconciliações da vida, que não dão em nada. O amor das palavras é o meu eu sem mim. As palavras querem ser eu, não podem. Sou mais do que palavras. Não compreendo minha compreensão. O amor fez eu não perguntar por mim. Pergunto por Deus, não por mim. Em Deus, a solidão é perfeita, por isso dou valor à solidão, para um dia estar em Deus, onde a solidão é essencial. Estar em Deus e em mim é eternidade. Sou livre por amar Deus. Como ouso amar Deus? Pelo amor que Deus tem por mim. A realidade é Deus! A palavra amor existe apenas no ser, não existe no amor. Amor, transcendência de alma. Sou o meu fim, permanecer no fim é ter algo a que amar.

Pedras no coração

Para o meu coração funcionar, foi necessário colocar pedras no coração. A escuridão ilumina meu amor! Mas a luz não ilumina meu amor. O sufocar tira as pedras do meu coração, como se me tirasse do meu coração, como se me deixasse sem amor. O amor é inútil na sombra da minha ausência, por isso, não preciso de ausências, sombra. Ausência pode ser amor? A ausência evita que eu morra. A ausência é eterna. A ausência faz viver. A ausência é responsabilidade comigo mesma. Eu, por uma ausência. Mas como essa ausência surge? Pelo meu amadurecer. O intervalo entre a ausência e a ausência é o meu ser. O céu, as estrelas são a falta de vida. A vida é uma bobagem que necessito viver. Sou um obstáculo para o meu pensar e para o meu amor. Tudo pode ser melhor se houver o pior. Pensar é amor pela vida, sem pensar em algo a mais. A alma do espírito é a morte, onde nasce a vida. A morte é mãe da vida. Há esperança na morte, mas não há esperança na vida. A morte é o todo, que dispõe do nada do olhar. Saltar de uma morte a outra é acabar com o abismo entre mim e eu.

Não é imaginável o imaginário

A plenitude se tornou vazio pelo imaginário. A alma fica constrangida com o corpo. Como uma imaginação dentro de outra imaginação, assim, nada sobrevive à realidade. O tempo é imaginação da vida, sem a eternidade da realidade. Imaginar é morrer pelo que não sou. No imaginar vou viver, como sendo a perfeição do nada. Se tudo fosse perfeito, não haveria vida. Cresci no nada de mim. No ser não há morte, por isso, preciso morrer, por tudo que não pode morrer. As árvores escondem a vida. Apenas a morte é natural. Não tenho como andar, andar, apenas na morte. Morrer é seguir. Seguir nunca é chegar. Há um mundo, sem mortes, inacessível. A única coisa que posso fazer por mim é morrer. O outro é a minha morte, é também minha vida, então, como ser só? O universo é a solidão da vida. A vida sem a vida é o universo. Soldados da vida são aqueles que não têm medo de morrer de si mesmo, quer apenas que a vida continue. A vida já viveu demais. O tempo de viver era apenas o reconhecimento eterno. A imaginação é uma maneira de dominar a realidade. O corpo às vezes é real, às vezes irreal, nunca oscila, entre a vida e a morte. Quero morrer, tenho tudo pra morrer: até a minha essência. A vida é honesta com a morte, a morte não é honesta com a vida. Com ou sem a vida, o amor é ilusão. Percebo a falta no amor. O amor não sabe de si. Eu sei de mim sem amor. É um saber triste, melhor não saber. Inventei-me, assim como se tudo fosse eternidade da minha criação. Criar o que já é eterno é amor. Mais eterna que o amor, é a desilusão, que é a saudade de tudo que o não ser é para mim: amor. Nem o amor alcança a falta do não ser, é como se não existisse o não ser. A falta do não ser é o ser. O não ser conhece apenas a alegria da vida. O ser é a tristeza da vida que não chora, se derrama. Quem não fala da tristeza é triste, é vazia. Não há vazio que sustente o ser na morte. Como falar de mim na minha morte? Não sei se falo, a morte escuta. A morte preenche os espaços vazios, melhor os espaços vazios, a falta, do que essa solidão infinita de morrer.

Retratos de canções

O amor são retratos de canções perdidas. O suspiro da morte, no silêncio da alma. As lembranças imemoriáveis estão vivas, como sendo um retrato da alma. O ódio é uma relação de morte, deixa-me sem alma, sem nada. Convivo com a perda da alma: é como se eu tivesse partido com ela. O silêncio partiu sem nós duas. A agitação da água, misturada com a sinfonia do silêncio é como a vida, nascendo das minhas palavras. A vida e a morte são duas estranhas no meu amor, mas será meu amor apenas este quarto fechado? Por isso, fecho as portas para que ninguém me escute no sofrer, e sim, como eu sou. A ilusão de abrir a porta me torna tão só, melhor morrer, assim meu silêncio me escuta baixinho, sem sussurrar o amor que sente por mim. Amor, não é silêncio. Crescer não é dizer adeus ao amor, é saber manter o amor. A vida quis que o amor me perdesse, me deixando, sendo escutada pela porta, até exausta, dormi na inconsciência da porta. A porta vive, comigo a abrindo, de morte, dor, até as palavras sangrarem, como se fossem nós duas. As palavras nos separaram, o seu abandonar nos afastou, não lutamos para sentir, por isso, morremos uma da outra, onde as palavras não sangram mais, se cansaram de me ver sofrer. Sinto um arrepio quando me lembro de escrever.

Torres de alma

Torres de alma, além das braçadas do meu coração. Tempestade de sol, deixa o céu limpo, tão azul, que é triste, mórbido, poético. É o azul pelos dias que não nascem pelo amor que não vem: ele é apenas a presença do céu, da morte. Meu corpo nada em almas flutuantes, nadando contra meu corpo, a nadar no nada sem mim. Sem mim, nadar pertence às águas, e eu pertenço ao meu corpo. Não nadei, eu afundei em mim. Nada vem do céu, nem mesmo a morte: espírito do céu. Meu corpo é um véu que esconde a minha morte de mim.

Aleatório (depende das circunstâncias do acaso)

A vida é aleatória ao que sente. Voz de céu, a traduzir a vida, numa única voz. Voz de céu, a tornar tudo real. A voz do céu não está na consciência, é o que imagino sem mim. Sem a voz do céu nada se escuta, e a falta de escutar é a morte, calando a voz do céu. As estrelas são a voz do céu, entristecendo-se. A voz do céu é tão simples de ouvir, ninguém escuta. A voz do céu é o meu inconsciente. Na consciência o corpo não tem alma. Se o corpo tiver alma, morre. O constante liberta a alma. A espontaneidade de morrer é como o desaparecer da luz, para nascer a lua.