Blog da Liz de Sá Cavalcante

Poesia de sol

O nada sente uma dor poética. O nada, tudo é verdade tudo é especial na alma, no nada, onde tudo é perfeito. O ser é uma tristeza que não pode ser sentida como ser. Apenas o ser pode dar ao nada, o nada que ele é pelo ser. É pelo nada que tenho vida. A poesia é um sol que dura sem as minhas lembranças, que são fragmentos de sol, salvos, mantidos em minhas mãos. Seguro firme as lembranças me agarro aos momentos de ter alguém, como se não existisse a solidão. A solidão é falta de pensamentos: então, não sou só: me sinto só. Rompi com a solidão ao morrer. Incorporo a morte para não escrever. Nadificando-me por viver, me misturo com o céu por viver. Poesia de sol, nas nuvens das palavras. Sonho com uma palavra apenas minha: seria como morrer no meu infinito.

Agonia

Não há céu no meu desespero, mas há o sol do meu desespero a me iluminar. O nada é a superfície, na qual respiro. No nada, sou todo o respirar da vida. O nada é o fim do começo, num respirar solitário. Quero respirar Deus, sendo em morte ouvida. O mundo nunca vai ser um ser, ser abraçado, amado. Alguns veem o mundo se vendo nele, mesmo assim, o mundo é só. Não imagino a minha imaginação: ela me imagina. Existo no que minha imaginação sente por mim, mesmo sem eu existir. Se o som do silêncio desaparecesse na voz do meu olhar, a imaginação seria feliz onde estiver. Quando esqueço meu corpo, abraço a imaginação como se tivesse alma. O sonho é o contrário de imaginar: é ser minha própria realidade, é possível unir o sonho e o imaginar na poesia. Nada é seguro, por isso, há vida. São tantas vidas para esquecer ou lembrar: é como se assim eu participasse da vida, dos meus anseios, para não ver nada, vendo mais do que o que se vê. Eu vejo o céu perto. Tão perto, parece desaparecer, para nascer as minhas poesias. Não há poesia na poesia. Eu a torno poesia. Sinto o desaparecer do céu na minha inocência de ser feliz, como se não houvesse céu, e Deus, e agora é Deus do mundo. A pausa da vida é Deus. Deus me faz nunca ter sido, sendo o perfume da vida. O mundo, a vida, é apenas encontrar a Deus.

Esvazio-me sem o nada de mim

De mim, não resta nem o meu esvaziar, sem o nada de mim. Mesmo se a poesia cessar, terei meu vazio por onde nascer. Nasço sempre, como escuridão da vida. Afogo-me em nascer.

Como me livrar do meu espírito?

O espírito não me preenche, é ruim, inessencial para mim. A saudade é um espírito que me suga, me deixa sem forças para morrer. A presença de ser é diferente do meu eu: meu eu é presença de vida. A alma cessa a saudade de ser, não cessa o ser. Meu ser me é dado pelo meu vazio existencial. A morte é a minha sensibilidade. A consciência sem passado é a alma. O eu é um passado sem passado, por isso é outro alguém que tenha o passado que a vida merece. Esse outro não sou eu na minha dor. Torno-me outro, a dor não muda. Depois do ser vem a consciência. Mesmo sem consciência, o ser é consciência de ser. O nada é consciência plena: é amor. Deixar a consciência ser eu é como não haver vida. Pela força do espírito, morri no meu espírito: no sempre, no jamais.

Olhos de cristal

A essência vê com olhos de vida o que vemos com a morte. Sonhos de vidros em cristais de olhos resplandecem o sol no céu de vidas. Atitudes são palavras. Esmoreço no fim de uma poesia. O sol se anula sem poesias. O céu não consegue ser uma poesia. O sol não surge por chorar a presença, é um sol que não nasce. Terei do outro apenas a mim. Teu nada que me resgata, tua alma ilumina minha dor. Olhos de cristal para te ver e esquecer meu interior, noutro sentir. Sentir extravasa o meu ser. Meu ser me fere, distante dos meus olhos de cristal. A imagem do pensar são os meus olhos de cristal. Por essa imagem me mantenho viva: ela não sou eu! Não quero imagens, quero o meu pensamento a me amar. Por imagem, estou eu nessa imagem, a não amar.

Morri no silêncio

O silêncio é vital à vida. Morde meu silêncio na tua dor, viva nele. Meu silêncio é barulhento. Range dentro de mim em palavras inesquecíveis. Tão inesquecíveis que morri nelas para não me esquecer. Elas não me esquecem: nem mesmo a Liz morta, perdida. Eu posso me perder, mas palavras voltem, pelo tocar das minhas mãos. Pelo meu amor por vocês, que nunca se perderá. Se eu tenho vocês, minhas palavras em mim: não pela poesia, mas por viver de palavras!

Existir é um silêncio eterno

Converso com o silêncio eterno de existir, ele não me atemoriza. Não dá medo, apenas são carícias na alma. A plenitude é infinita apenas para mim? E quando o apenas cessa? O que resta? O silêncio é a única coisa que me faz ter alma. Conheço o silêncio na minha voz. Falo em silêncio, em amor. A quietude, sem o silêncio, é o nervosismo do vazio, que torna o silêncio verdadeiro na sua ausência. Querer é solidão. Querer é a presença do nada na minha presença. Perceber é um adeus infinito. Dentro do infinito o adeus é feliz, amado. O adeus é a continuidade da vida.

Intemporal (pertence a todos os tempos)

Meu amor é intemporal. O nada é a alma. A morte é a ilusão do fim. A alma é indiferente, não sabe o que é ter amor, saudade, vida. Adormecida para sempre, sinto a alma em sua inexistência que não é maior do que seu sono: é mais essencial que viver, que o sono. Sem ter fome, às vezes delira por mim. A alma precisa reagir, amar no que vivo. Não sei se amo no que vivo. Há um abismo entre mim e eu. Tudo comparo ao real, menos a inexistência: mais real do que a vida! Amar é sem sonhos. Amo a sonhar com o sonhar. Nada foi escrito pela vida, na vida. A vida é uma única página, sem nada escrito nela. Viver é sem palavras. Ignoro a existência do tempo, pois não me dá prazer. O tempo é falta de ousadia. É uma determinação que eu existo, apenas para o tempo. O tempo se foi em mim, mas o tempo ainda existe como uma rosa sem jardim. Como um ser da alma. Viver da alma é nascer da minha alma, não de mim. A alma é o sol para quem é triste. Eu sou triste por ter alma. Minha alma vai ser minha última poesia: o que não restou de mim.

A eternidade existe?

O céu se desespera de amor por mim. Deus é minha eternidade. O tempo particular existe para eu não existir. O tempo particular não é o tempo interior. Sofrer é sem alma, por não perder a alma. Perdi mais do que a alma: perdi a vontade de escrever, de viver. Cada vez mais, perco a alma, com satisfação me apeguei à falta da alma, fiz dela uma perda minha. Não da alma. A lembrança é um fato inexistente. Nada é inexistente na morte. A morte tem vida.

Não há nada entre a alma e o amor

A alma é plena nos meus sonhos, minha alma não é mais alma: é resignação. A mágoa vai além da solidão, da morte, me dá alma, preparo emocional, me faz amanhecer, viver de mágoas. A alma é uma ponte à vida, me aceita como eu estiver, para viver. O tempo não me faz esquecer, torna a situação eterna em mim. Se o tempo é uma situação, como meu pensamento pode ir além do tempo? O ar das minhas mãos purifica o céu, faz o céu respirar ao lembrar de mim.