Blog da Liz de Sá Cavalcante

Feito sol

O abismo transcende em mim feito sol. A tristeza é feita de sol. Quando o vazio se afirma, a eternidade ama. Afundar no amor raso é a eternidade do meu ser. Raso, fundo, não se vive o amor imemoriável de alma. Mas o desamor é capaz de amar no mar a secar, no sofrer do amor. Nada esvazia um amor solitário. A solidão preenche a alma, deixa o ser morrer. Nada sinto na perda do meu ser, pois a perda do outro está em mim: sem sol, pura vida, amor. A vida é dada sem amor, por isso amanhece em mim, sem desespero apenas só: isso é viver feito sol, brisa, que não perde o amor, a essência, nem por instantes. Apenas não quero ser mais só do que já sou: mesmo se eu não puder ser sol, ilumino.

Em mim

O significar é uma vida: existe apenas na alma. Em mim o significar não precisa de significado, e sim de amor. O tempo, o vento carrega. E traz a consciência sem tempo, como se fosse a única vida, o único amor.

Amor corporal

A morte é destruída pela minha corporalidade sem vida. Floresce o dia como mãos que somem o corpo, sombra da morte, não se pode perder: é a minha intimidade, sem mãos. Procuro minhas mãos, na poesia.

No lugar do todo

Meu ser ficou no lugar do todo, sofre pelo fim da consciência de mim, como se nunca tivesse existido o todo. O todo de cada um nunca será nada. Meu corpo, numa alma, estranha a ele, transcende para se dividir em alma.

O nada puro

O amor não é amor: é o que morre, antes do fim. O amor é o perdido, solto nas asas da imaginação: somente assim o perdido conhece a vida pelas suas perdas, que não me condena a eternidade da perda: me deu a eternidade do sol. O sol no nada puro da vida é desolação. Desolação pela alma: permanece alma mesmo sem desolação. O sorrir da alma me desvanece em ser. A vida é o tumulto da alma: habita em nós, conciliando o antes e o depois sem vida. O nada puro é uma oportunidade de viver sem a vida: assim me reconheço: onde transcender e apenas eu.

Elevar a morte

Levantar a morte do meu calvário. Meu tormento não chega ao tormento de viver. Quando vou ver? Quando cessar o amor? Na minha morte? O que ainda são os meus olhos? Viver não significa amor, o amor é mais do que eu, do que a vida. Eu espero amor, assim como eu espero dormir: a insônia não deixa. O corpo desvenda a alma, ao morrer. Estou dentro da alma, nunca dentro de mim. Negar a negação é o meu eu saindo de mim: sem alma. Minhas entranhas sem alma são a minha vida.

Solidão

O amor me tornou eu: de tanto amor, não é mais amor: é solidão. Nada se pode viver na permanência, tudo se vive em solidão.

Individualidade

Não há consciência na consciência. A consciência é a morte. A realidade é o amor que sinto. Transmito com meu ser, a realidade que falta na realidade, por isso, é real: na vida que lhe falta. A realidade penetra na ausência da vida: não é mais realidade. A lembrança é realidade eterna e o fim do acontecer. Nada lembra do acontecer: nem ele mesmo se lembra dele, mas acontece como se soubesse de si. O acontecer é a ausência do nada no acontecer. O ser é o acontecer do real sem realidade. Mesmo a vida se entregando a mim. Nada acontece comigo. Lembro-me do nada acontecer como sendo a alma. A alma da vida perdida é esse acontecer.

Momentos

O amor da morte é o mesmo amor da vida. Um único amor é vida que conhece o mundo, sem demandas, expectativas. O amor começa a alma, cessa no coração. Chove amor, na ausência de adeus. Aprendi no adeus o respeito ao amor. A alma é exterior a mim, como certeza da vida. Se diz vida, sem propriedade, sem consistência, significado. Sentir, nada significa para o sentimento. O amor não percebe sua ausência. A falta de amor é amor sem ausência. Não dá para viver no ser: é o mesmo que morrer.

A fala do nada

A necessidade dos sonhos é tornar o ser, um não ser por onde fala o nada: o sonho é a fala do nada, o existir do nada em mim. A fala, o nada, me mantém viva.