Blog da Liz de Sá Cavalcante

A vida da vida

Entre a saudade e os momentos resta a vida. Quando o sol canta, a luz emudece no meu olhar. A separação das almas é o nascer do tempo. O tempo é apenas dia, a noite são minhas ausências. O sonho não usufrui do tempo. Borboletas saem de dentro de mim. As asas quebradas do tempo são o tempo. Fiz das asas quebradas do tempo o meu retorno à vida: livre da liberdade. A fidelidade do tempo é a morte. Deixa a alma do descanso ser poesia eterna. A essência rouba o lugar do ser. Não há pensamento na essência. O fim é onde está o pensamento. Divido meu pensar com a ausência. O medo da ausência é o amanhecer. A ausência é o amanhecer eterno. Expandir o sol dá vontade de viver. A força me arrebenta por dentro de mim. Ver a luz arrebenta a luz. Faz nascer a vida em plena escuridão. Assim, se fez e se alimente a vida da vida: de escuridão. Inspiração eterna, a faz viver. Vive, vida, é possível na sua falta de existir.

Enlanguescer (perder as forças)

Enlanguescer na força da loucura é perder-me em vão. Enlanguescer para a força voltar como cisne da solidão, e, assim, minhas forças voltam, não para mim, mas para a força de amar, como uma canção perdida, na melodia do destino. A vida arranhada de amor pela alma esquece-se em outras almas, volta a ser vida outra vez, no nada que quis viver como alma, foi para sempre amor. Amor eternizado em canção.

Ternura entre caminhos sem flores

Realizar um sonho é viver sem a poesia, realidade concreta, poucos alcançam essa realidade distante do mundo. Apenas as flores encontram o caminho que não está em nenhum lugar, é o que sinto parada: é como se eu estivesse em todos os caminhos desejados ou indesejados, é preciso seguir sem olhar para trás. É preciso dizer meu nome à vida. Vida, entre tantos, chamou por mim. Por isso, esqueci de mim em viver. Entrei dentro dos sonhos da vida para aprender a sonhar. Sonhar é eternidade eternizada, onde tudo floresce: espelhos, músicas, solidão. E, assim, a vida nunca mais será só: será esquecida como um sonho!

A morte ficou onde a deixei

Soterrada de sonhos, enterrada exterior a mim. De amor. Mar de luz a cavar meu destino. Deixei a morte ser vida e tornei-me morte. Enterrei-me em mim sem morte. O azul do céu se fez sem ser descoberto pelo céu. O céu se descobre em nuvens. O céu de estrelas chora estrelas numa ventania de céu, desejo incontido de merecer o céu, como lembrança da morte, que acaba na existência do fundo de mim. A morte sem lembrança me torna rasa. Tudo se foi sem a morte. Ninguém vê e sente a vida como eu. Eu a vejo em estrelas, que se demoram em mim. Em mim, estrelas navegam no céu no mar celeste da despedida do céu. A tua presença alegria é o meu céu. Alegria, voaste alto, em céus desconhecidos. O que vai ficar sem sofrer não é o vazio, e sim, o vazio da vida que é apenas um sussurro perdido no amor. Amor que separa o real e o irreal do que sou. Faz falar o vento como despedida do sol, que estava perdido em mim. Não quero acordar na luz do amanhecer, e sim na escuridão da poesia: deixa o amanhecer vazio ser amado como o anoitecer que vibra, entontece, reage. O depois é o silêncio, onde se misturam a noite e o dia. Confio no céu, nas estrelas, não confio na alegria, que se agarrou na minha alma, me deixou com medo. Eu não sabia que alegria é eternidade. A eternidade foi algo um dia. Esse dia foi o dia que escrevi no sempre da alma. E tudo fez sentido, mesmo que essa alegria acabe, antes de eu senti-la, me descobri viva para tudo sentir. Sentir é a tranquilidade de morrer. Morrer é amor: amor pela vida. Escutar é apenas eu, falar é apenas eu no outro. O sossego do amor é um desamor? O que é desamor perto da morte? É a necessidade vazia de viver. A vida me deu o nada de presente, me sinto tendo tudo. O sonho é uma fantasia. Fantasia do céu. Não posso viver sem o céu. Alma da morte: aparência sem céu, a enganar a transparência de viver, lhe dando uma segurança inexistente como o sol e a lua. Quero apenas paz.

Tentação de viver

A saudade limpa a alma das impurezas do amor por ti. A mornidão do amor é a tentação de viver. Viver é pouco ao viver. Sonho com a tua solidão, ela não me torna ausente, me faz te amar. Acordei da esperança de amar.

A origem do nada é o ser

O amor se compreende o nada. A separação do amor é o ser. Nada no ser é inevitável. A faísca do nada resplandece no inacreditável e esconde a luz no olhar. O abismo é a única luz que é vida. Abismo é luz, mesmo sem o infinito. A alma não sabe vir a luz, sua única luz é o meu corpo. A fadiga da luz é o amanhecer, luz falsa, onde o corpo é escuridão para o amanhecer. Resta da luz o sono, a ausência, que mesmo perdida ainda é ausência. A ausência na luz é a morte. Mas que luz posso ter?

Suavidade sem brisa

Disfarço a realidade com o meu amor. A realidade é sem amor, como a suavidade sem brisa: é a suavidade do amor, que espera, sonha com o amor, que tudo cria, dá vida à vida. As coisas aparecem no aparecer inexistente das coisas do amor. A aparência fugidia do nada, se torna minha aparência. Ter você é não ter aparência nenhuma. A falta, espaços vazios são a alma, a tentar entrar em mim.

Fragmentos do nada

Os sonhos, fragmentos do nada, preenchem minha vida. Minha vida é vazia sem os fragmentos do nada. O alívio da pressão do sol, é a pureza do anoitecer que se despede da vida nos meus sonhos como sendo uma poesia na eternidade da alma, que é o meu fim. Um fim de poesia.

Debilitada de tanto amor

Estar plena é morrer! Confundindo-me comigo, sou mais eu. Partindo de mim para ficar dentro de mim. O interior e o exterior se unem no meu amor. O amor me isola em fragmentos. Fragmentos são o meu conviver. O sonho é o interior. O interior do nada é a essência. Morrer cada vez mais é viver em mim. Por mim. Meu corpo jogado na vida, como um lixo velho. Meu corpo não descansa em paz em mim. Meu pensar é eternidade agonizante. Meu pensar tem que morrer, não morre. A morte me abandona: não tenho para que lutar. Lutei com o nada em mim. Sai de mim, morte. Aprendi a viver no amanhecer. A eternidade não amanhece em mim. Me aproximo do amanhecer, amanhecendo. Sou muito injustiçada: pelo amanhecer. Não faço parte do amanhecer como faço parte da sua ausência.

Tem vida na ausência

A escrita abre a porta da vida, onde saio se quiser. Entrei para sempre. A vida está mais na escrita, do que na própria vida. Amanhecer na poesia é entregar-me a vida, abrindo-me num amor infinito: nasce da vida. A ausência é vida no meu amor. Estando ausente, não morri. Vou declinar na alma com meu sorrir. Meu sorrir é poesia, resolvendo as perdas. Vivi o meu sorrir, estou a sorrir na alma, como um sol que não se contém de alegria, de amor por mim mesma. Me descobri nesse amor que agora sinto tanto. Sou o outro em mim, no amor. O sol ilumina o meu amor, me deixa sofrer por ele. Sofrer deixa a alma leve, como se eu fosse morrer. Morrer não é destino. Penetrar em todas as almas é não desaparecer na morte. Sinto o ar na minha pele, sem saudade de morrer. Quando sinto falta de alma, falo com Deus, minha impotência e me sinto feliz. A falta de mundo me salva de morrer. Morri na sombra da minha ausência e, assim, me separei da morte, restou esse alheamento, a loucura dividida entre a minha morte e o nada. Ninguém pode ser a morte da morte. Preocupo-me com a morte como se fosse filha minha. Não há o que sofrer em mim, sou o próprio sofrer.