Blog da Liz de Sá Cavalcante

Olhos de cristal

A essência vê com olhos de vida o que vemos com a morte. Sonhos de vidros em cristais de olhos resplandecem o sol no céu de vidas. Atitudes são palavras. Esmoreço no fim de uma poesia. O sol se anula sem poesias. O céu não consegue ser uma poesia. O sol não surge por chorar a presença, é um sol que não nasce. Terei do outro apenas a mim. Teu nada que me resgata, tua alma ilumina minha dor. Olhos de cristal para te ver e esquecer meu interior, noutro sentir. Sentir extravasa o meu ser. Meu ser me fere, distante dos meus olhos de cristal. A imagem do pensar são os meus olhos de cristal. Por essa imagem me mantenho viva: ela não sou eu! Não quero imagens, quero o meu pensamento a me amar. Por imagem, estou eu nessa imagem, a não amar.

Morri no silêncio

O silêncio é vital à vida. Morde meu silêncio na tua dor, viva nele. Meu silêncio é barulhento. Range dentro de mim em palavras inesquecíveis. Tão inesquecíveis que morri nelas para não me esquecer. Elas não me esquecem: nem mesmo a Liz morta, perdida. Eu posso me perder, mas palavras voltem, pelo tocar das minhas mãos. Pelo meu amor por vocês, que nunca se perderá. Se eu tenho vocês, minhas palavras em mim: não pela poesia, mas por viver de palavras!

Existir é um silêncio eterno

Converso com o silêncio eterno de existir, ele não me atemoriza. Não dá medo, apenas são carícias na alma. A plenitude é infinita apenas para mim? E quando o apenas cessa? O que resta? O silêncio é a única coisa que me faz ter alma. Conheço o silêncio na minha voz. Falo em silêncio, em amor. A quietude, sem o silêncio, é o nervosismo do vazio, que torna o silêncio verdadeiro na sua ausência. Querer é solidão. Querer é a presença do nada na minha presença. Perceber é um adeus infinito. Dentro do infinito o adeus é feliz, amado. O adeus é a continuidade da vida.

Intemporal (pertence a todos os tempos)

Meu amor é intemporal. O nada é a alma. A morte é a ilusão do fim. A alma é indiferente, não sabe o que é ter amor, saudade, vida. Adormecida para sempre, sinto a alma em sua inexistência que não é maior do que seu sono: é mais essencial que viver, que o sono. Sem ter fome, às vezes delira por mim. A alma precisa reagir, amar no que vivo. Não sei se amo no que vivo. Há um abismo entre mim e eu. Tudo comparo ao real, menos a inexistência: mais real do que a vida! Amar é sem sonhos. Amo a sonhar com o sonhar. Nada foi escrito pela vida, na vida. A vida é uma única página, sem nada escrito nela. Viver é sem palavras. Ignoro a existência do tempo, pois não me dá prazer. O tempo é falta de ousadia. É uma determinação que eu existo, apenas para o tempo. O tempo se foi em mim, mas o tempo ainda existe como uma rosa sem jardim. Como um ser da alma. Viver da alma é nascer da minha alma, não de mim. A alma é o sol para quem é triste. Eu sou triste por ter alma. Minha alma vai ser minha última poesia: o que não restou de mim.

A eternidade existe?

O céu se desespera de amor por mim. Deus é minha eternidade. O tempo particular existe para eu não existir. O tempo particular não é o tempo interior. Sofrer é sem alma, por não perder a alma. Perdi mais do que a alma: perdi a vontade de escrever, de viver. Cada vez mais, perco a alma, com satisfação me apeguei à falta da alma, fiz dela uma perda minha. Não da alma. A lembrança é um fato inexistente. Nada é inexistente na morte. A morte tem vida.

Não há nada entre a alma e o amor

A alma é plena nos meus sonhos, minha alma não é mais alma: é resignação. A mágoa vai além da solidão, da morte, me dá alma, preparo emocional, me faz amanhecer, viver de mágoas. A alma é uma ponte à vida, me aceita como eu estiver, para viver. O tempo não me faz esquecer, torna a situação eterna em mim. Se o tempo é uma situação, como meu pensamento pode ir além do tempo? O ar das minhas mãos purifica o céu, faz o céu respirar ao lembrar de mim.

A alegria é o nada de mim

A aceitação da vida é o nada, que resplandece só. A morte é uma força divina que dá força para a vida. Triste fim, não pode aproveitar o seu fim: deixou-o para mim. Como abraçar, amar a vida sem braços? Com o meu fim, no meu fim.

A espera ausente

O sonho não desperta: ama! A distância da morte é a morte. Amo o que serei, o que sou: essa espera ausente. Tento substituir a vida por uma espera ausente, e a espera ausente se foi, e a vida nunca mais foi completamente vida. A ausência do meu corpo tornou-se flores. A espera é tão ausente, me fez morrer: não pela espera, mas pela ausência de morte infinita. Vi, entre a morte e o adeus, a saudade que anseio sentir. Não há morte no adeus infinito. O adeus é o começo de viver. Quem escreve canta na alma. A alma é um adeus sem despedida: mas é o fim que veio antes da despedida, morri para depois me despedir de mim. Se me tocar, murcho, e nunca terá meu corpo: na vida ou na morte. Não me quis: quis meu corpo para nele esquecer de si mesma. Mas meu corpo não é minha presença: é a minha eternidade. O abraço é a falta de mim. Tudo se abraça. Eu querendo um abraço clandestino, desconhecido, onde possa chorar com alma, sem ser notada. O silêncio me enterrou nesse abraço, a palavra veio me libertar, abraçar alguém que me empreste sua alma, me fez me sentir amada. Tão amada que esqueci a morte, a vida, o ser. Nós nos abraçamos com as nossas almas, não com o corpo. Esmoreci em presenças ardentes de ausência. Vejo luz na escuridão. Apenas a ausência perdoa e morre por perdoar.

Sem história de vida

Nem mesmo os sonhos querem ser a história da minha vida, nessa vida bipolar, que não sei o que ela sente direito. Não a compreendo: olho o céu para sentir que há vida. Corpo no corpo, para morrer, para construir uma história de vida, que o mar banha, mas não leva embora. Ânsia de amor está úmida no mar. Posso ser presença no além de mim? Presença é me desgrudar da minha pele: é ser eu, despida de mim.

A presença da falta

Amo no que me falta. Perder o que me falta é morrer. Basta sentir, já morri sem me sentir morrer: que ingratidão, que imensidão. A imensidão é o infinito de morrer.