Blog da Liz de Sá Cavalcante

Silêncio

Pra que serve o silêncio? O que fiz do silêncio? O silêncio é bom? Será que quando fico em silêncio sou mais profunda? Há mais amor no olhar do nada do que no ser. O olhar do nada consegue silenciar o indizível que já não fala, precisa, mesmo assim, silenciar o que não disse. O silêncio me escuta, não consigo me ouvir. Há amor no silêncio, não no ser. Consigo escutar o silêncio, como se fosse o meu amor partindo de mim. Mas não há despedida onde não há amor. A alma não suporta haver outra verdade que não seja a sua. A verdade que dura é a do silêncio. Não há permanência no silêncio, mas há permanência na alma do silêncio, onde a verdade é também amor. A manifestação da vida é a falta do ser, onde o silêncio é o único ser.

A alma do amor é a solidão

A ausência ama incondicionalmente, de um jeito que o ser não consegue. De ausência em ausência, se constrói o ser. Mas o ser é a ausência de outro alguém, nele mesmo. A ausência sonha comigo, por me possuir, ela quer ter meus sonhos, que são ausência da ausência. Na ausência da ausência, não há ausência. Mas a ausência da ausência é ausência sem ausência. Repetir a ausência é conquistar o nada, sem usar a força. O nada se torna ausência. O ser é mais esquecido quando é amado. A solidão está no auge do amor, da vida, do céu. Amar sem solidão é amor? O silêncio nunca é concreto, a falta do silêncio é morrer, numa emoção única, silenciosa, onde não posso me ter, como a emoção se tem. Mas há na emoção algo de insensível? Há mais insensibilidade no amor do que no desamor. Nada representa a emoção de viver. A vida tem uma força tão grande, que não precisa da emoção para existir. Apenas a vida nasceu já existindo. A morte espera a vida para morrer, onde o seu adeus prolonga o nada do seu fim. Morrer não é certeza de existir. A morte morre por sua certeza de morrer. Há tanto a continuar na morte. O adeus não me deixa deixar o passado. Eu me separo da vida, mas não do que me fez viver. O sol, permanência do nada, a amanhecer para mim. É como se a permanência fosse a eternidade, a se banhar dentro dos meus olhos, que não veem diferença entre a luz e ver. Vejo, porque a luz me ilumina de amor. Penso ser o amor à luz. A luz não se faz nascer o amor, mas é por onde me reconheço. Reconhecer que o amor se destrói sem mim.

Não espero pela alma, espero por mim

Não espero nada da alma, mas espero a alma no nada de mim. Não demora a alma para partir, mas que seja uma despedida minha no teu adeus, onde o olhar se aproxima como se fosse teu adeus. O adeus não soube partir, ficou impregnado na alma. Comecei a ser o que não há em mim. Por isso, existo longe dessa proximidade do meu ser.

A vida supera a vida

A alma me espera, não posso demorar. A demora de ter alma me faz ter alma, onde a vida supera a vida. O saber foi perdido, antes de existir o que penso saber é apenas sombra da minha ausência. O tempo não determina o que fica e o que morre. Ficar, morrer, por uma inexistência que é indiferente a mim, quero explicar a vida, jamais vivê-la. A alma esfria, num corpo gelado. Tenho medo de o meu pensamento sair de mim, me corroendo, indo e se entregando para uma vida que não existe. Por isso, com o tempo, o pensar fará parte do não existir. O nada precisa amanhecer, como sombra da ausência, para eu viver. Brincando de escrever, descubro o infinito sem o infinito, assim nasce a vida, que é a única coisa boa do infinito. Não quero ser infinita como o amor, mas não quero morrer!

A sensibilidade da razão

A vida se faz em mim, por isso é difícil viver. Nada ofereço à vida. A percepção me percebe, não a percebo. O mundo desapareceu, para a vida ser melhor. A sensibilidade da razão é a vida, pura, simples, com a simplicidade do amanhecer, do sol, que me desperta no amor que sinto. Escrevo no amor, que também é dor. A alma anoitece sem amanhecer. O sol desmaia na alma, para continuar vivo. Nada vivo por olhar o sol, mas ao mesmo tempo torno minha inexistência feliz. Esta é a sensibilidade da razão, meu amor, desatino. Durou pouco tempo minha inexistência, mas serviu pra eu perceber que se eu tivesse tido uma existência, não seria feliz como na inexistência sou feliz. As palavras não existem sem poesia, não existo sem amor. Não inexisto sem amor. Perco as palavras, não perco a poesia.

Entrelaçamento (confundir, misturar)

Confundo ser com ter alma. Me misturo com a alma, com o meu fim, mas meu fim não se mistura comigo. Como pude viver na paz da falta de alma? Sinto o cheiro da vida na minha pele, perfume de Deus. Nenhum fim é feliz, até o fim da morte é triste. O entrelaçar da pele no corpo, como se me fizesse viver. Para que viver se posso me misturar, me confundir com o nada? Nada se confunde ao me misturar com o nada. A vida, com o tempo, piora, e a vontade de viver aumenta, como se eu ganhasse o céu de presente pelas minhas lágrimas de amor. O nada torna-se morte, sem que esse entrelaçamento fizesse algo para impedir. O amor repousa dentro de si, o fim é apenas não repousar dentro de mim. O fim busca descanso no amor. Há algo que posso fazer pela culpa de não ser amada por ti: não morrer. Perco tudo pela aflição do tempo que me restou.

A verdade massacrada foi um erro?

Meu corpo, poesia que não sinto, verdade do viver. Descobri meus sonhos sem sonhos, como sendo o amanhecer sem nós. A verdade pode viver como sonho? O quanto necessito sonhar pra viver? O sol vai desaparecer no meu amor, mas meu amor resiste, persiste ao desaparecer, sem deixar de iluminar.

Monólogo interior

Meu pensamento, alheio a mim, pensa em mim, se dispersando no nada, que é além da vida, da morte. Lembrar, esperança cheia de doçura, apaga o vento com o sol. O falar não dialoga, reduz falar, assim como o mar encontra o sol, como o olhar encontra a luz. A realidade não se determina em nada, então a vida vive de poesia. O amor é um recomeço sem começo. Eu podia passar a vida olhando o nada como se visse a vida. Quando escrevo, a vida existe. Me assemelho à vida quando escrevo. Não há semelhança que se compare à vida. Quando escrevo, meu único amor é a morte? Há mais liberdade do que amor no sentimento. Pelo meu ser, nada faço; pelo amor, tudo faço, e é como se eu fizesse por ti, te amasse, alegria, não sei se te amo. A alma somente me dá dor. O ser não é pelo ser, é pelas coisas da vida. As coisas da vida não podem ocupar o lugar do meu ser. Há mais coisas na vida do que no ser. Meu ser tenta se ver no que lhe falta. Tudo acontece, sem que eu modifique a falta. A vida é uma falta, que nunca é preenchida no meu ser. Falta ausência no meu amor. A vida é a ausência do meu amor. Amo apenas para existir, sofrer? Nunca saberei. A vida levou o melhor de mim, sem ausências, dores. Do tempo, nasceu o vazio, distante de mim, de Deus, do amor que lhe dediquei. Parece o tempo morrer, sou a sombra que ilumina o tempo.

A crise de me amar

Não devo me amar, esta é a pior crise existencial, que fez parte da minha vida. Mas o amor fica em mim, como doença, que alastra, venera o que ama! O amor sabe onde foi esquecido, pela sua própria alma, seu próprio amor, que coração nenhum sente. O adeus sobrevive à vida, ao tempo, sem morrer por si. Sempre foste um adeus, alegria, morreste no que te faltou: sofrer no adeus é um alívio que não seja morte. Há vida neste adeus, que não prefere viver, ficar em mim. A sombra do adeus é a presença. Quero ser presença do teu adeus, mesmo que tenha que morrer por isso. Morri, por não te esquecer, por isso abraço o vento antes de morrer, como se te abraçasse. Tudo agora se faz lembrar, num adeus, que é um consolo de amor. Na morte, há apenas o ser, então não há adeus na morte, mas há adeus para a morte. A amplitude do mundo terá o nada, sem silêncio, despedida, apenas o puro amor!

A vida é uma pintura do amor

O sonho é exterior ao ser, mas, ao sonhar, não sei se estou sonhando, sei que vejo a vida com o olhar novo, o olhar dos meus sonhos, que me dá paz! Vejo o amor no sonho. Nada se oculta do amor. Sonhar é perder a fé e se render à realidade. Amor sem suspirar não é amor, é esquecer a intimidade do silêncio, pela solidão das palavras. As palavras têm o sentimento para se sentir só, eu sou só sem me sentir só. Alheia a mim, como se eu nunca procurasse por mim, como se eu não fosse eu. Nada em mim me torna eu. Tão perdida por não ser só, que é como se conviver com a vida fizesse a vida existir em minhas mãos, frágeis. Assim, vi como o céu é frágil, sempre azul, infinito. Eu vivi meu fim cheia de cores, amores, perdas, nem por isso o fim foi menos triste, tive que o dar ao azul do céu. Nunca mais fui a mesma sem o fim, nem o fim é o mesmo sem mim. Não importa a vida, importam as cores, para que eu não perceba que meu ser é escuridão. Vou me pintar com as cores da vida, para notar se alguém me percebe. O que importa é que eu me percebo, me percebo em toda cor, todo amor, em toda vida, mas não me peça para também ser feliz, como se eu fosse apenas cinzas. Não quero ser conivente com a dor da vida, mas me peço para te esquecer.