Blog da Liz de Sá Cavalcante

Tédio

Sentir sempre é o mesmo sentir, como o sol cedendo ao céu. Nem o céu sabe que é feliz, mas ele é feliz sem saber. É fácil olhar o infinito, difícil é olhar para o real. De real, basta a morte em mim. A realidade me entedia, faz me esquecer a realidade, como se ela fosse meus sonhos. No mundo de Deus, deveria ter céu, ter o que esquecer. O mundo de Deus é Deus. Ficar não é permanecer. O sorrir é a eternidade que falta na alma. Mas, eternidade na alma?

O som de se viver

Por tudo, através do nada, o som de se viver destruiu as paredes do sentimento, que não deixava o som da vida entrar dentro de mim. A consciência de viver está exterior a mim. A consciência é onde o ser se desconhece, mas conhece o som de viver, como se fosse a vida. A vida não tem o som de viver. O som de viver desparece na voz da alma. A alma não se parece com a vida, faz do som de viver seu silêncio. A alma é o unir de duas pessoas que continuam só, sozinhas, mesmo percebendo o som de viver dentro da vida. A solidão é o som de viver. A vida é a ausência do som. Essa ausência se mistura com o mar, com o silêncio do silêncio. O silêncio é o universo sem a vida, a traduzir o mundo.

Vida de areia

A vida se desfaz como areia no meu amor. Talvez minha vida seja apenas areia. O que desaparece na areia não é a vida. Meu corpo se desmancha como areia, como vida. O céu vai morrer pela vida que não teve. Minha dor invade meu corpo. O pensamento existe sem a vida, sem o meu ser. Gostaria de ser apenas o meu pensamento a despontar como um céu interior, tão rico. Não necessito ser meu pensar, se torna o céu real vivido como um sonho. A vida não existe porque nasci. Esta realidade me queima onde estou fria.

O sonho existiu como uma lágrima

A lágrima dispersando-se nos próprios sonhos como se o sonho fosse mais essencial que uma lágrima que pousa nos meus sonhos, para eles serem eternos. A parede falsa entre mim e o mundo é o meu vazio, onde há apenas uma porta aberta. Por essa porta, o sol não entra, penetra na alma, chamas acesas de viver. Será sentir a ausência da alma? Como sufocar uma ausência feliz? Nada mudou pela ausência, assim a vida se ergue do nada, como se o nada fosse o meu corpo. Meu corpo é uma lágrima não sentida. Por causa do corpo, perdi a alma te vendo sorrir. No teu sorrir, não existe meu corpo, minha alma, não existe eu. O céu é a minha inexistência, que não chora, não lamenta morrer. A alma colada na morte, mas o corpo quer viver de corpo e alma. Deixe que minha alma seja minha morte, para que ela seja meu fim. Borboletas voando na minha morte, como se elas fossem o céu. Assim, descobri o infinito de morrer por mim.

Inesgotabilidade é transcender

Não há presença, há dois amores: o da lembrança e o do esquecimento. Se completam, formam a vida, dividida entre o ar e o respirar. A respiração afunda no ar, apertada, como se também fosse amar. O sentimento consola a vida de sua inessência. A inessência do sentir é inconsolável. Essa inessência é alma da vida, do sentimento, que separa o sentir da vida. Deixa minha alma arder, para que ela se sinta viva em mim. O transcender trouxe a inessência para o amor. Não há nada para fazer na vida. Amar a vida com desespero não é amor. O amor é confiar na vida. Mesmo que a vida não confie na minha dor, ela respeita. Nada pode desaparecer sem a vida, nada pode aparecer pela vida. Mas, a vida aparece sem poder aparecer, se torna um nada. O ar sepulta, mata a vida, mas o que falta no respirar se tinha em vida. O ar fala pela eternidade do olhar, que respira mais do que eu. O ar derrama gotas do nada sobre o meu vazio. Nada no seco do respirar. Essa falta de mim que já me destruiu não pode mais me destruir. Espero que o ar volte, se aconchegue em mim e me devolva a paz de sorrir no nada dos meus olhos, que encontrou minha paz distante de mim, como um sonho. Não amei mais na forma que sonhei, por isso tomei uma atitude, que vai me fazer viver: ser feliz. Ser feliz como o ar que escapa do vento, para retornar a mim, numa alegria infinita, de tantas perdas, tanto amor, que não podem desaparecer pelo meu respirar, que já é tristeza, já é alegria.

Com o tempo, meu ser existirá

Vou me acostumar com o tempo de existir, mesmo que ele seja distante da minha realidade, de mim. Apenas o silêncio. Me escuto nesse silêncio. Se ninguém sonhar, o sonho se completa só, preenchido como uma vertigem, exposta ao ventre do nada. Nasci sem o teu ventre, sem o teu amor, sem o teu nascer. A vida ilumina todas as vidas, deixando a escuridão ser a morte dos caminhos, que não tiveram sorte de ficar em minha vida. Eu somente pude escolher um caminho: a solidão. Não há solidão maior do que uma escolha: escolhi ser só. A alma não me mantém viva, nem minha alma é minha solidão, nem o vazio é minha solidão. A solidão é o nada. O nada é único sopro de vida, a acalentar minha morte. A vida não corresponde ao meu amor, como um princípio sem fim.

O dom e a força de morrer

O silêncio do mar em sintonia com o sol se faz morrer, como sendo o ser que nunca existe. Querem morrer como ser, nunca como brisa. O meu ser não é o melhor de mim. O melhor de mim é morrer como se sonha. Morrer sendo a sombra da minha sombra. Nem a morte se afasta do sol, ela é a eternidade do amanhecer junto com o sol. Quando anoitece, o sol se põe no vazio, sem vazio. Não importa ser a morte se você é a vida. Na falta de amor, a brisa me enterra. Vejo o sol pela escuridão, pela solidão de morrer, onde sei que o sol sorri para me fazer feliz. Mesmo sem ver o sol escondendo o amanhecer, apenas em saber que ele sorri para mim, sou feliz. Pois a certeza do sol para mim é mais essencial do que viver. O que morrer são pedaços que deixaram de ser eu há muito tempo. Perceberam que morri depois de anos, quando compreenderam minha dor, lendo minhas poesias. Não aprendi a ser só, nunca aprenderei. Por isso, morrer enquanto tudo é luz, amor. Deixem-me morrer enquanto a morte está compreendendo a minha dor, que não é de morrer, essa dor sou eu.

A inconstância da alma

A inconstância da alma são as mãos de Deus em mim, curando-me do meu amor. A morte não é o fim da existência, a existência vive seu existir na morte. A existência existe apenas na morte. A inconstância da alma é a existência, que vive sem a vida, sem a morte. Não quero que a dor sofra com o que não é essencial em mim: a vida! Vivo bem sem a vida. Não sinto falta de viver a vida, mesmo ela tendo arrancado um pedaço de mim. Não viver é o infinito de amar. Pedaços de mim me afastam da vida, eu inteira me faço morrer!

Latejar (pulsar, palpitar)

A morte pulsa mais do que o meu amor. Mas pulsa em silêncio, para não incomodar a vida! O amor não é uma lembrança, é a realidade da vida, é vida que não necessita existir. A vontade não é o amor sentido, é o amor que permanece como vontade. Essa vontade já é um sentimento, mesmo em nada sentir. Estou apaixonada pela morte, somente assim não me sinto ausente das minhas poesias. A alma não inventou a emoção ausente, mas se fez de céu numa ausência do bem, é mais que emoção, é amor. A ausência me fez feliz, nos momentos de maior agonia, dor. Ela foi uma companhia, que morreu da minha dor. Não aceitei o fim da minha ausência. Tirar o sangue do meu corpo não mata minha alma. A ausência do corpo é o sangue que a alma quer eliminar. Sorrir e ter alma são a mesma coisa. Remendei a vida, com meu corpo, minhas lágrimas, minha dor. A dor não são apenas retalhos da vida, é o meu interior. A dor da alma descobre o mundo sem ela, se torna feliz, como se estivesse viva em mim. Minha única lembrança da alma é o amor. Se a alma pudesse ser o mundo, o mundo não duraria pela perfeição da alma, que é uma eternidade ainda com vida, ainda sem mim.

Não existe esforço para sonhar

A expectativa é diferente de viver. Viver é falta de expectativa. Deixaram-me sem a sombra da morte. Perdi meu rosto, não como quem perde a imagem, mas como quem perde o céu. Meus olhos de sol e meu amor de tempestade cativaram a vida, o mundo, menos o meu ser, que continua só, fazendo a vida e o mundo felizes, como sendo o renascer de um sonho, que não será lembrado apenas como sonho, mas como ser. Será lembrado eternamente, como o renascer solitário da ausência.