Blog da Liz de Sá Cavalcante

Sonhar é saber

Sonhar é saber que não existe apenas vida, existe Deus. A perseverança de sonhar torna o sonho possível. Não posso morrer sem ser o sonho de alguém. Meu corpo não sonha comigo, vai além do sonho, além de mim. O transcender da fala é o nada, o vazio. A espera de uma estrela é cair do céu para dentro dos meus sonhos. Sonhar é saber despertar desse sonho que é a vida. O sonho de alguém me ama, como se sonhasse comigo. Nada se sonha, tudo se é. Por isso, não se pode amar. Apenas ser, mas sou o que sou, na esperança de amar. Talvez isso um dia, quem sabe, torne-se um sonho ou me faça sonhar.

A realidade de ouvir é um sonho acontecendo

Esse nada foi a sua ausência. Não há saudade de nós, há apenas saudade dessa ausência. Se a ausência pudesse ser eu, seria feliz? O tempo passou sem ausências, foi mórbido, doloroso como o nascer do sol, que não pode ser minha ausência. Meu sofrer não é ausência de você, é a vida entrando em mim, sem vestígios da sua ausência. Sua ausência existiu, você existiu, ou foi apenas ilusão do meu vazio. Meu vazio pode ver você, eu não. Quando vejo você, não sei de mim, nem dessa ausência, quero apenas ficar perto do sofrer, mesmo sem sofrer, sem nada sentir. Não senti que, além de me perder, perdi minha alma, mas isso não me aproxima de você. A realidade de ouvir você é um sonho acontecendo que não sonhei, estava distante, encontrando-me, distraída de mim, da poesia do mar afastando minha poesia. Deixando-me à margem de tudo que deveria viver, não mais pela poesia, mas por mim. A falta de notícias da minha ausência demonstra que ela está bem sem mim, quem sabe ela fique com você noutra vida, onde a ausência tem uma vida com você. Quem sabe assim, de uma vez por todas, eu perceba que você está viva, tão viva que afastou a minha ausência de mim, dos meus sonhos, mas não me afastou de mim.

A morte não é um adeus, a vida é um adeus a mim

A lembrança é a eternidade da alma, na falta de alma. A alma é por onde posso escolher quem sou. O sofrer, fim da alma, começo de eternidade. A lembrança dura na morte, é o fim da eternidade.

Começar a viver pela morte

A morte, motivo para viver. Não se vive o sempre, nem morte, a morte tem fim. Nada restou da alma, ficou nem mesmo o silêncio. Se houvesse silêncio, haveria alma. A alma do silêncio é a minha existência. A vida me matou antes da morte. A morte são palavras por dizer. Não falo pelas palavras, falo por mim. Falo, como se o instante fosse as palavras, e o amor, apenas palavras. A alma não tem família, não tem lugar para ficar, nem pode amar outra alma, tem apenas fé na morte, dessa fé morrerá.

A fé da morte

Não vejo mais imagem, não há nem mais saudade, por isso tenho fé na morte. Pela falta da tua imagem, tristeza, lembrei-me da minha imagem, que é falta de alma, falta que traz de volta a fé na morte. Nunca a perdi, apenas tornou-se alma. Sem imagem, a vida aparece. A fé é morrer.

Como se essencializa a verdade do ser?

Ajudar a vida prejudica a essência sem verdade. A essência tem que encontrar a sua verdade, longe de viver. Viver não é essência, é o fim da essência, que me invade num amor sem fim. Tenho que deixar a vida pela essência perdida. Eu não me perdi sem essência. É difícil amar quando estou para morrer na essência que não tive. Tive mais do que essência, tive a minha morte toda para mim. Como posso não ser feliz?

Superando meu ser em mim

Há tanto para esquecer vivendo, que quero morrer, sem o transcender eterno. Sem ir além do transcender, que é apenas ir além. As coisas, a vida, o amor, não precisam existir para me ver morrer. Nada seria sem poesia, que afasta a morte na existência da morte.

Eternidade (para pai)

O olhar é apenas uma lembrança, por isso não é só. Olhar é ser anterior a mim. Parece até que o mundo veio de um sol distante, isento de mim. Viver pelas coisas sentidas, sem precisar me sentir, é a libertação da eternidade, descoberta no meu amor. Meu amor não quer ajuda, e sim eternidade. Se a eternidade fosse um sonho, duraria mais. Tocar é uma sensação de vazio extremo, que leva à morte, no fundo de mim, eu queria apenas um abraço, mesmo que ele fosse intocado. Intocado na alma. Meu corpo e meu abraço se encontraram e se realizaram sem mim. A sensação é a falta do corpo. Nada vivi pelas sensações, sensações não são sonhos. No dia em que a sensação for sonho, existirá realidade num abraço. Nada precisa existir depois de um abraço. A solidão é o abraço da alma. Não há depois se não me convencer, num abraço apenas nosso, onde a presença da alma é inútil, ela não pode substituir você. Seu abraço é vida. Nada necessita acontecer depois de um abraço, é apenas amar, ser feliz.

Na companhia de um adeus

Na companhia de um adeus, o espírito é leve demais, como se fosse declinar na alma. Esse desinteresse é o ficar da alma. O amor separa o ser do ser, apenas a companhia de um adeus me faz viver. O adeus é sem adeus. Considero a distância de mim um amor que precisa de cuidados, para que eu fique sempre distante de mim. Pelo amor, a distância de mim me une a mim. Essa distância é razão de eu viver, no desaparecer da presença. Ser só é eternidade.

Um destino para o destino

O descanso eterno se cansa no meu abraço. É um destino, sem destino. É maravilhoso não ter um destino, nem meus sonhos têm um destino. Chorar é não existir vida além das lágrimas. O tempo se completa sem ser vivido. O que se pensa ser o tempo é a alma partindo de onde nunca esteve: no ser. O ser é a inexistência do tempo, não é comodidade a inexistência do tempo, é como uma flor que floresce. O tempo da inexistência é o ser. O tempo da existência é a alma. A existência não tem fim, nem mesmo pela sua inexistência. A alma não é a existência da existência. É a companhia do nada, que é por onde a existência aprende a se conviver.