Blog da Liz de Sá Cavalcante

A mobilização por abandono

A vida é apenas a mobilização por abandono. Deslocar a alma na alma, como razão de ser, quando o ser escapa, a alma age por si mesma. Não quero economizar a alma em mim. Sei de mim até sem alma. A alma não vive de alma. A alma é possível, como um morrer na culpa de morrer, e não poder mais amar, ser amada. Ao menos não esqueço quem amo, sofro, pois não é igual a esquecer de mim. Esquecer é ver pelo amor do outro. Percebo-me morrendo como se eu não pudesse me imaginar viver. Morri até no imaginar. Há um limite entre o céu e o mundo: esse limite é o ser. O ser não é mundo, não é céu: é a perda do mundo e do céu. Bobagem tem importância. Beijos do céu voam no mundo. O ser não se mostra como meu ser, sendo para mim o que sou. O que posso ser para meu ser? Nada, fico feliz longe, sem o meu ser, a pensar por mim, amar por mim, roubando meu ar. O ar seria meu no meu adeus. Mas nada quero recuperar com a morte. Necessito morrer na pureza da vida. Vi o não ver em mim, no meu amor. Dormir apaga a ausência do pensamento e do amor.

Decadência (rumo a um fim)

A decadência de sentir me levará a algum lugar, onde há a dignidade de sentir-me como sombra do indefinido de morrer, ainda a sentir tua ausência. É quando sei que não acabou: não é o fim, é amor!

Devaneio feliz

O adeus se preocupa comigo na minha tristeza, não me diz o adeus que existe no meu adeus. O adeus é infinito por me ver. Ver é o céu sem céu, no devaneio do céu. A alma se foi para perto do meu ser morto, como um existir possível na suposição de uma existência feliz, pelo que não chorei ainda, nesse devaneio feliz. Não o enganei, apenas sonhei mais do que a vida, do que o céu. Meu amor é a realidade de tudo. Enfim, eu em todos, enfim, eu.

O silêncio tem mais valor do que a alma

A alma não é o melhor de mim: não afasta o medo, a morte: apenas o silêncio, os afasta. Preciso olhar para o silêncio e amar. Amar-me. Entre o conhecer e o conhecimento, resta a alma. Não há lugar vazio no amor. Amor é silêncio, é palavra, é me reconciliar com o nada. Clarear o ar no que falta em mim. Nada faltar em mim é como um adeus no adeus, sem o adeus do céu.

A vida é quase tudo

A falta de habilidade para não amar é a sinceridade. O abraço é a falta de vida, a aparecer no amor, nos braços perdidos sem amor. Estou perto do meu corpo, em perder meus braços: em não me perder.

O céu da vida

Da morte nasce o meu viver por ti. Procuro a morte no céu da vida. Resguardar-me no céu da vida, do ser, do nada. A espera de um adeus é o amor do céu da vida. O que será do céu na vida? A verdade é a inexistência no céu da vida, como um ser!

Sou demais para mim

Fortaleço-me no que me fragiliza: o amor. A realidade é a morte do amor. O amor vive sem amor: como um sonho eterno de vida. A morte não é um sonho: é o ser do ser. Não é poesia, não são palavras, é o adeus da alma a crescer dentro de mim. Não cresci em mim: apenas amo. Amo como se amar, crescer, fossem o mesmo. A realidade da morte não é demais para mim. Eu sou demais para mim, em vida ou em morte. Escrever une a vida e a morte em um único adeus. Foi assim que eu nasci. Foi assim que disse adeus.

Um pouco de vida me faz feliz

Meu ser é ser apenas em si. Em si, a inexistência é real como o infinito de um abismo. A única presença é ausência para o céu, para os sonhos. O começo não é o cessar do fim. A vida me impede de viver. O amor é falta de conhecer a mim. Encontrei-me em um desamor profundo, intenso: é como me ter em sonhos perdidos. O segredo da morte é a vida dentro de si. Não há vida sem a morte. Morrer é a vida se realizando, fazendo o céu existir sem vida, na vida da vida. O amor é triste por ser amor: sonhar é vida: sonhar é vida, que o amor não tem.

Colocar o nada em mim sem vida

O desaparecer é uma presença, fica dentro da alma, se torna o meu interior. Eu não quero ser o meu interior, quero ser o meu desaparecer, num sonhar eterno. Não adianta querer ser minha presença, quero apenas colocar o nada em mim sem vida, não sendo presença, mas sendo feliz: esquecer é a minha presença, ao menos pelo esquecimento, não foi abandonada. Ter vínculo com o nada é saúde mental, espiritual. O estagnar da alma é vida. A luz dá vida ao sol. O sol da lua é a aparência do nada. O amor é um sol dentro do sol. A vida é o cantar do sol. O meu ser está sem pensamento: está como alma: no vazio eternizado sem solidão, no amor de ser só, como um amor puro, como a solidão do mar. Não há mar para o mar. O soluço da paz salva a vida da vida. A essência vem para mim, o amor nunca vem: ele fica em mim. A essência vem para mim, o amor nunca vem: ele fica em mim. A essência é a falta de amor. Todos temos um pouco de falta de amor, para sentir a essência, sonhando sem o amor. Nada no amor é real em essência. O amor vai ao infinito pelo ser para não ser o infinito do ser. O ser não tem alma de ser: tem alma de infinito. O infinito é mais do que o céu: é tudo que eu conseguir ser. Assim, colocar o nada em mim em vida, me deixará sem vida, me fará voar.

Feito sol

O abismo transcende em mim feito sol. A tristeza é feita de sol. Quando o vazio se afirma, a eternidade ama. Afundar no amor raso é a eternidade do meu ser. Raso, fundo, não se vive o amor imemoriável de alma. Mas o desamor é capaz de amar no mar a secar, no sofrer do amor. Nada esvazia um amor solitário. A solidão preenche a alma, deixa o ser morrer. Nada sinto na perda do meu ser, pois a perda do outro está em mim: sem sol, pura vida, amor. A vida é dada sem amor, por isso amanhece em mim, sem desespero apenas só: isso é viver feito sol, brisa, que não perde o amor, a essência, nem por instantes. Apenas não quero ser mais só do que já sou: mesmo se eu não puder ser sol, ilumino.