Blog da Liz de Sá Cavalcante

A escrita e o amor

O amor e a escrita, minha única realidade. Às vezes sinto falta de outra realidade. Mas a realidade aceita a minha realidade. A vida não é natural, se tem a escrita do amor. Fico à vontade escrevendo na minha morte. A morte pode ser acrescentada em palavras de amor. A morte são apenas palavras. Eu acreditei que a morte ia definir as palavras com meu amor. Mas meu amor não são palavras: são reconciliações da vida, que não dão em nada. O amor das palavras é o meu eu sem mim. As palavras querem ser eu, não podem. Sou mais do que palavras. Não compreendo minha compreensão. O amor fez eu não perguntar por mim. Pergunto por Deus, não por mim. Em Deus, a solidão é perfeita, por isso dou valor à solidão, para um dia estar em Deus, onde a solidão é essencial. Estar em Deus e em mim é eternidade. Sou livre por amar Deus. Como ouso amar Deus? Pelo amor que Deus tem por mim. A realidade é Deus! A palavra amor existe apenas no ser, não existe no amor. Amor, transcendência de alma. Sou o meu fim, permanecer no fim é ter algo a que amar.

Pedras no coração

Para o meu coração funcionar, foi necessário colocar pedras no coração. A escuridão ilumina meu amor! Mas a luz não ilumina meu amor. O sufocar tira as pedras do meu coração, como se me tirasse do meu coração, como se me deixasse sem amor. O amor é inútil na sombra da minha ausência, por isso, não preciso de ausências, sombra. Ausência pode ser amor? A ausência evita que eu morra. A ausência é eterna. A ausência faz viver. A ausência é responsabilidade comigo mesma. Eu, por uma ausência. Mas como essa ausência surge? Pelo meu amadurecer. O intervalo entre a ausência e a ausência é o meu ser. O céu, as estrelas são a falta de vida. A vida é uma bobagem que necessito viver. Sou um obstáculo para o meu pensar e para o meu amor. Tudo pode ser melhor se houver o pior. Pensar é amor pela vida, sem pensar em algo a mais. A alma do espírito é a morte, onde nasce a vida. A morte é mãe da vida. Há esperança na morte, mas não há esperança na vida. A morte é o todo, que dispõe do nada do olhar. Saltar de uma morte a outra é acabar com o abismo entre mim e eu.

Não é imaginável o imaginário

A plenitude se tornou vazio pelo imaginário. A alma fica constrangida com o corpo. Como uma imaginação dentro de outra imaginação, assim, nada sobrevive à realidade. O tempo é imaginação da vida, sem a eternidade da realidade. Imaginar é morrer pelo que não sou. No imaginar vou viver, como sendo a perfeição do nada. Se tudo fosse perfeito, não haveria vida. Cresci no nada de mim. No ser não há morte, por isso, preciso morrer, por tudo que não pode morrer. As árvores escondem a vida. Apenas a morte é natural. Não tenho como andar, andar, apenas na morte. Morrer é seguir. Seguir nunca é chegar. Há um mundo, sem mortes, inacessível. A única coisa que posso fazer por mim é morrer. O outro é a minha morte, é também minha vida, então, como ser só? O universo é a solidão da vida. A vida sem a vida é o universo. Soldados da vida são aqueles que não têm medo de morrer de si mesmo, quer apenas que a vida continue. A vida já viveu demais. O tempo de viver era apenas o reconhecimento eterno. A imaginação é uma maneira de dominar a realidade. O corpo às vezes é real, às vezes irreal, nunca oscila, entre a vida e a morte. Quero morrer, tenho tudo pra morrer: até a minha essência. A vida é honesta com a morte, a morte não é honesta com a vida. Com ou sem a vida, o amor é ilusão. Percebo a falta no amor. O amor não sabe de si. Eu sei de mim sem amor. É um saber triste, melhor não saber. Inventei-me, assim como se tudo fosse eternidade da minha criação. Criar o que já é eterno é amor. Mais eterna que o amor, é a desilusão, que é a saudade de tudo que o não ser é para mim: amor. Nem o amor alcança a falta do não ser, é como se não existisse o não ser. A falta do não ser é o ser. O não ser conhece apenas a alegria da vida. O ser é a tristeza da vida que não chora, se derrama. Quem não fala da tristeza é triste, é vazia. Não há vazio que sustente o ser na morte. Como falar de mim na minha morte? Não sei se falo, a morte escuta. A morte preenche os espaços vazios, melhor os espaços vazios, a falta, do que essa solidão infinita de morrer.

Retratos de canções

O amor são retratos de canções perdidas. O suspiro da morte, no silêncio da alma. As lembranças imemoriáveis estão vivas, como sendo um retrato da alma. O ódio é uma relação de morte, deixa-me sem alma, sem nada. Convivo com a perda da alma: é como se eu tivesse partido com ela. O silêncio partiu sem nós duas. A agitação da água, misturada com a sinfonia do silêncio é como a vida, nascendo das minhas palavras. A vida e a morte são duas estranhas no meu amor, mas será meu amor apenas este quarto fechado? Por isso, fecho as portas para que ninguém me escute no sofrer, e sim, como eu sou. A ilusão de abrir a porta me torna tão só, melhor morrer, assim meu silêncio me escuta baixinho, sem sussurrar o amor que sente por mim. Amor, não é silêncio. Crescer não é dizer adeus ao amor, é saber manter o amor. A vida quis que o amor me perdesse, me deixando, sendo escutada pela porta, até exausta, dormi na inconsciência da porta. A porta vive, comigo a abrindo, de morte, dor, até as palavras sangrarem, como se fossem nós duas. As palavras nos separaram, o seu abandonar nos afastou, não lutamos para sentir, por isso, morremos uma da outra, onde as palavras não sangram mais, se cansaram de me ver sofrer. Sinto um arrepio quando me lembro de escrever.

Torres de alma

Torres de alma, além das braçadas do meu coração. Tempestade de sol, deixa o céu limpo, tão azul, que é triste, mórbido, poético. É o azul pelos dias que não nascem pelo amor que não vem: ele é apenas a presença do céu, da morte. Meu corpo nada em almas flutuantes, nadando contra meu corpo, a nadar no nada sem mim. Sem mim, nadar pertence às águas, e eu pertenço ao meu corpo. Não nadei, eu afundei em mim. Nada vem do céu, nem mesmo a morte: espírito do céu. Meu corpo é um véu que esconde a minha morte de mim.

Aleatório (depende das circunstâncias do acaso)

A vida é aleatória ao que sente. Voz de céu, a traduzir a vida, numa única voz. Voz de céu, a tornar tudo real. A voz do céu não está na consciência, é o que imagino sem mim. Sem a voz do céu nada se escuta, e a falta de escutar é a morte, calando a voz do céu. As estrelas são a voz do céu, entristecendo-se. A voz do céu é tão simples de ouvir, ninguém escuta. A voz do céu é o meu inconsciente. Na consciência o corpo não tem alma. Se o corpo tiver alma, morre. O constante liberta a alma. A espontaneidade de morrer é como o desaparecer da luz, para nascer a lua.

Inexplicável

A morte é uma dor silenciosa, por isso não é a dor de ninguém. O ser sofre falando, buscando palavras onde elas não existem o ser não se explica, a fala se explica. Sonhos são incertezas, a certeza da falta de um corpo, é minha vida. A fala é ausência do corpo, o amor, é o corpo sem fala. A morte une o corpo e a fala.

Olhar sem imaginação

A alma afoita, sedenta, numa vida morta, deixa meu olhar sem imaginação, imagino sem o olhar como se olhar fosse minha imaginação. Fico bem apenas na loucura. Fui tão longe na monotonia, onde até os monólogos cessam. Falo para mim como se fosse o outro a me ouvir. Ouvir é a distância que me separa da realidade. Tudo é real no silêncio, não é real para mim. Real é a maneira como as palavras me olham, mesmo no silêncio. Os olhos se acostumam a pensar. Meu olhar é o meu pensamento. O céu são escadas de vento para minha alma incorporar o nada. Ver é esquecer. Eu não envelheci, apenas dei ao tempo um pouco de mim. A morte não muda de corpo, de alma, fiel ao que existe. Não é porque sou isenta da vida que não sei viver. Viver não tem destino, deixa-me sem futuro. A alma é o meu futuro. Futuro é deixar a realidade como ela é. Se eu já tivesse ausente de morrer, não poderia amar como eu amo! O inexplicável se explica amando.

O sofrer foi feito para mim

Se tudo fosse amor, como seria feliz sem a incompletude do sofrer? Mas e se o sofrer me torna plena, me restaria a alegria. Seria feliz pensando em ser triste, como se pudesse sentir a essência do céu. Olhos nos olhos, não para olhar, mas para perder o céu, refeita de Deus sem mim. Sinto falta do que deixei na morte, do que realizei na morte, sem te fazer sorrir, mas sorrir não é o céu? E agora nós, sem morte, vida, sem conciliar o sofrer com o amor? A morte faz com meu corpo o mesmo que faço comigo. Só há a espera do corpo, não adianta esperar pela alma na alma de uma solidão. Depois da morte nada mais resta.

Compensar o dia do anoitecer

O valor do amor é a sua invisibilidade. A noite aparece para o dia como um amor perdido. Ausência da noite danifica o dia. O dia é a razão de ser que se perde em noites infinitas. A alma acredita na essência do ser: única essência da alma. Essência é dizer adeus ao que se vive por um resto de solidão. A lembrança me torna só. Mesmo assim, eu cesso a solidão da lembrança, abraço-a como se fosse minha vida. E se a vida forem lembranças? Como esquecê-la? Como o sentimento deixou de ser lembrança? Fiz das minhas lembranças o mar de viver. Não consigo ir até mim, estou em mim, mesmo que signifique deixar de amar, pensando em ti, sem amor, há apenas o silêncio, dor sem fim, mais infinita que a alegria, que o céu. De repente a vida fica leve como o mar, para eu aprender a sofrer, que nada se foi, tudo continua. A existência se foi, tudo continua a partir desse momento inexistente. Apenas para ter a existência para amar, como se ela fosse o último sol, apenas para lembrar de mim. Ternura adormecida no amanhecer, como se, ao erguer meu corpo no vazio universal, o amanhecer fosse feliz, existindo no não existir. Nascer feliz não é morrer triste, com ou sem o amanhecer. O medo de amar não amanheceu, nada foi compreendido. Mas o amanhecer é incompreensão da vida. Nasci como o sol, distante de tudo, para amanhecer dentro do sol. Dentro do sol, há alegria, vida, eternidade. A imensidão é alegria, sem o mar. Lembrar de mim me faz morrer. A lembrança ficou sem sol, por isso as lembranças chovem em mim a seco. A alma se consola de lembranças que não sou eu, mas esta é minha alma, até no fim. Há tanto a viver sem lembranças, mas não há nada a viver em mim, na vida, nas minhas ilusões. Anoitecer por uma realidade é despertar para a vida, para a alma. O amor que possuo é a alma indo embora, deixando meu amor em mim, que é o mesmo que a alma partir sem lembranças, nas lembranças. O avesso da lembrança sou eu. Por isso, não posso falar que mudei por uma lembrança inexistente, apenas confiei que o mar são flores, e a vida, suas pétalas.