Blog da Liz de Sá Cavalcante

Poesia do vento

O vazio precisa penetrar na alma para existir a respiração, penetra no vento, adere à realidade. Respirar não é um sonho. Um sopro de luz, no sonho, me faz parar de respirar, amortece a minha poesia, de respirar o nada, a favor do vento, uma poesia. O vento na minha voz tem o paladar de sonhos, escuta de amor. Nada funciona na alma, nem o amor. A alma inutilizada é um enfeite, uma decoração. Tudo continua lindo, sem a alma. A sucessão da morte retém o ser em si. Reter a consciência na morte sem o ser. Nada contém o ser no ser, por isso, o ser, são boas lembranças. Costuro-me em poesias de vento.

Pedaços de água

Pedaços de água nos meus pedaços, onde não posso me dissolver em mim. Apenas em pedaços de água, posso reviver o momento que perdi. Perdi como se tivesse ar de estrelas, pairando no céu. Mas é apenas o abandono de mim, se fazendo sol no sol. Meus pedaços de água, derretem o sol, para a vida aparecer, e saber qual é cada estrela. Cada estrela é um universo, onde posso sonhar sem poesia.

Pesando-me em flor

Pesando-me em flor sem matar-me por dentro de mim. O espelho do nada é a esperança da minha imagem. Imagem sem céu, puro olhar. Pesando-me em flor, meu olhar se eterniza. A realidade não é eterna, a realidade do olhar é eterna: é como nunca ter alegria, por ter eternidade: plenitude sem alegrias. Escrevo a eternidade inexistente em mim. O sonho é eternidade da alma. Pesando-me em flor, a alma nada precisa significar para mim. Precisa apenas sonhar meus sonhos. Nada se perde em flor: a saudade, o amor, a solidão de amar, não se perdem em flor. A suavidade do esquecer é uma flor sem ser em flor. Me esqueci da vida, no amor.

Criar

A vida não necessita de lembranças. Vou criando lembranças. A única lembrança que a vida tem é a de viver. A lembrança passa a ser realidade. Não há mais o que sonhar, sentir, tudo são apenas lembranças. O tempo não são horas, são minhas lembranças do tempo. O tempo reduz a realidade ao tempo. Pelo viver, a realidade diminui. O criar se expande na vida. Há muito o que criar na vida para ela viver. Criar é uma poesia que se transforma no olhar em ver, me vendo. Criei para mim o meu eu. Criar é ausência infinita de mim. Quero apenas essa ausência, criar, a vida é consequência, se não der para viver, vou criar ainda mais e melhor. Faço da perfeição da poesia a vida que não possuo. Enfim, não estou mais sozinha.

A vida da vida

Entre a saudade e os momentos resta a vida. Quando o sol canta, a luz emudece no meu olhar. A separação das almas é o nascer do tempo. O tempo é apenas dia, a noite são minhas ausências. O sonho não usufrui do tempo. Borboletas saem de dentro de mim. As asas quebradas do tempo são o tempo. Fiz das asas quebradas do tempo o meu retorno à vida: livre da liberdade. A fidelidade do tempo é a morte. Deixa a alma do descanso ser poesia eterna. A essência rouba o lugar do ser. Não há pensamento na essência. O fim é onde está o pensamento. Divido meu pensar com a ausência. O medo da ausência é o amanhecer. A ausência é o amanhecer eterno. Expandir o sol dá vontade de viver. A força me arrebenta por dentro de mim. Ver a luz arrebenta a luz. Faz nascer a vida em plena escuridão. Assim, se fez e se alimente a vida da vida: de escuridão. Inspiração eterna, a faz viver. Vive, vida, é possível na sua falta de existir.

Enlanguescer (perder as forças)

Enlanguescer na força da loucura é perder-me em vão. Enlanguescer para a força voltar como cisne da solidão, e, assim, minhas forças voltam, não para mim, mas para a força de amar, como uma canção perdida, na melodia do destino. A vida arranhada de amor pela alma esquece-se em outras almas, volta a ser vida outra vez, no nada que quis viver como alma, foi para sempre amor. Amor eternizado em canção.

Ternura entre caminhos sem flores

Realizar um sonho é viver sem a poesia, realidade concreta, poucos alcançam essa realidade distante do mundo. Apenas as flores encontram o caminho que não está em nenhum lugar, é o que sinto parada: é como se eu estivesse em todos os caminhos desejados ou indesejados, é preciso seguir sem olhar para trás. É preciso dizer meu nome à vida. Vida, entre tantos, chamou por mim. Por isso, esqueci de mim em viver. Entrei dentro dos sonhos da vida para aprender a sonhar. Sonhar é eternidade eternizada, onde tudo floresce: espelhos, músicas, solidão. E, assim, a vida nunca mais será só: será esquecida como um sonho!

A morte ficou onde a deixei

Soterrada de sonhos, enterrada exterior a mim. De amor. Mar de luz a cavar meu destino. Deixei a morte ser vida e tornei-me morte. Enterrei-me em mim sem morte. O azul do céu se fez sem ser descoberto pelo céu. O céu se descobre em nuvens. O céu de estrelas chora estrelas numa ventania de céu, desejo incontido de merecer o céu, como lembrança da morte, que acaba na existência do fundo de mim. A morte sem lembrança me torna rasa. Tudo se foi sem a morte. Ninguém vê e sente a vida como eu. Eu a vejo em estrelas, que se demoram em mim. Em mim, estrelas navegam no céu no mar celeste da despedida do céu. A tua presença alegria é o meu céu. Alegria, voaste alto, em céus desconhecidos. O que vai ficar sem sofrer não é o vazio, e sim, o vazio da vida que é apenas um sussurro perdido no amor. Amor que separa o real e o irreal do que sou. Faz falar o vento como despedida do sol, que estava perdido em mim. Não quero acordar na luz do amanhecer, e sim na escuridão da poesia: deixa o amanhecer vazio ser amado como o anoitecer que vibra, entontece, reage. O depois é o silêncio, onde se misturam a noite e o dia. Confio no céu, nas estrelas, não confio na alegria, que se agarrou na minha alma, me deixou com medo. Eu não sabia que alegria é eternidade. A eternidade foi algo um dia. Esse dia foi o dia que escrevi no sempre da alma. E tudo fez sentido, mesmo que essa alegria acabe, antes de eu senti-la, me descobri viva para tudo sentir. Sentir é a tranquilidade de morrer. Morrer é amor: amor pela vida. Escutar é apenas eu, falar é apenas eu no outro. O sossego do amor é um desamor? O que é desamor perto da morte? É a necessidade vazia de viver. A vida me deu o nada de presente, me sinto tendo tudo. O sonho é uma fantasia. Fantasia do céu. Não posso viver sem o céu. Alma da morte: aparência sem céu, a enganar a transparência de viver, lhe dando uma segurança inexistente como o sol e a lua. Quero apenas paz.

Tentação de viver

A saudade limpa a alma das impurezas do amor por ti. A mornidão do amor é a tentação de viver. Viver é pouco ao viver. Sonho com a tua solidão, ela não me torna ausente, me faz te amar. Acordei da esperança de amar.

A origem do nada é o ser

O amor se compreende o nada. A separação do amor é o ser. Nada no ser é inevitável. A faísca do nada resplandece no inacreditável e esconde a luz no olhar. O abismo é a única luz que é vida. Abismo é luz, mesmo sem o infinito. A alma não sabe vir a luz, sua única luz é o meu corpo. A fadiga da luz é o amanhecer, luz falsa, onde o corpo é escuridão para o amanhecer. Resta da luz o sono, a ausência, que mesmo perdida ainda é ausência. A ausência na luz é a morte. Mas que luz posso ter?