Blog da Liz de Sá Cavalcante

O que a morte não pode tocar

A morte me faz deixar de sonhar, amar, mas não pode me tocar. O silêncio penetra na alma, tocar o silêncio é não pertencer ao céu. Ver o meu sofrer pela dor do mundo, que me faz morrer numa morte sem asas. Eu fui da vida, enquanto a morte tinha asas. O abismo tem fim: a morte. O ser não percebe quando não é mais: não ser não é morrer. A distância de morrer é a morte, é morrer. O tempo não é certeza de morrer. Não se ensina a morrer. Se eu não sustentar a morte em mim, o sol não se reflete em ondas do mar, mas a vida quis assim, que a falta do sol fosse a minha vida a cantar em mim. O adeus da tua morte sou eu. Não há motivos, há apenas a vida desse instante, confunde-se com sonhos. O instante é o adeus na falta de um adeus. Nada me revela não sonhar, talvez sonhar seja morrer. Mesmo sem sonhos sonho, como se o azul do céu a se derramar em sonho, como sendo o amanhecer eterno. Nada pode ser na eternidade, é um deserto de poeira de amor, que varre o céu de tristeza e o torna tão feliz, mas não tão feliz quanto eu. Nada me prende, não preciso da alegria para viver, mas amor é alegria, continuação da vida. Nem precisa haver poesia, basta ser feliz, como se o olhar do céu fosse único para mim. E o olhar do céu se torna meus sonhos. Tudo vivi, falta ser feliz, como a eternidade do nada: poesia que permanece em mim. A morte não me tocou nunca, por isso, me ama, me deixa viver, não é a morte, é o passado do amor, que lembro apenas com a morte. A morte é apenas um esquecer triste, de luz, acolhimento. Escrevo, pois um dia irei morrer. Então não escreverei por escrever. Escreverei na alma de quem não pode morrer e necessita morrer, quem sabe assim eu possa te ver, vida, no meu amor.