Blog da Liz de Sá Cavalcante

O abismo de luz

Há algo pior que morrer, arrancar um pedaço da minha alma, num abismo de luz, é pior do que morrer! Amo ainda mais sem a vida, as pessoas, é como se fosse um sonho eterno, presença eterna de amar! A alma é amaldiçoada ao existir, a alma não deveria existir em mim, nada precisa existir, tudo é apenas um abismo de luz. Tudo se abandona, mesmo sem abandono! O abandono é apenas luz, em busca de um abismo! A alma, devoção de um silêncio, rompe barreiras com as palavras, o nascer do sol é olhar que mais se aproxima de viver, viver por um olhar, que perceba minha solidão. A minha pele renasce na chuva como se fosse o sol.

Nem o sol nem a chuva poderão viver um grande amor por mim, nada, nem ninguém, pode ser esse amor, ele existe apenas em mim! Por mim o amor viverá, como se suportasse a dor, se o tempo partir com o amor que lhe resta vou acreditar, e conseguir, enfim, sonhar no tempo perdido. Nada perdi sem o tempo, a alma é o que existe dentro de mim que vence o tempo com o amor. O amor é alma toda minha que torna o abismo de luz um céu profundo, se as coisas, o nada, fossem a vida que são, tudo seria melhor! Deixo a luz entrar na luz do meu ser, mas nada tem mais luz que a luz, nada mais pode deixar meu olhar vazio, nem mesmo o vazio, que pode ser qualquer coisa que amenize meu ser de existir, tudo morreu inexistente de mim, há tudo a chorar pela morte, mesmo que ela não seja dentro de mim, me dilacera, até mesmo sem dor!

Meu olhar entra pra dentro de mim como sendo o que ficou perdido pela interiorização que cessou meu ser por um olhar alheio a mim não pode ser meu, meu olhar deveria me fazer sentir a mim, a vida! As palavras são um respirar profundo, onde durmo mágoas acordo morta, liberto meu ser de ser sem morrer a existir sem ser, é fácil salvar a vida, difícil é salvar a salvação. A morte supera a vida, afasta o sol da minha luz, até que, ao surgir a escuridão, a claridade seja o vazio expandir a tristeza na claridade de onde nasce a alegria e a alegria é luz, é sabedoria! Essa sabedoria faz morrer a solidão! Ninguém é só ao se conhecer, nada posso fazer pela sabedoria, nem ela por mim, ela não pode transformar morte em vida, ver o olhar no olhar é deixar o real num olhar, o inseparável se dá na separação, não há separação no abandono, o abandono é o absoluto, é morrer!

Tudo que é ruim tem um motivo, esquecer o mundo, a vida, deixar o céu se fazer em mim como o fim das poesias e o começo da fala, falar é uma poesia que nasce da poesia, do ser! A vivência é o outro lado do ser, mas somente reconquista a vida ao vivê-la. Vivência é uma maneira de falar ao me sentir, mas sentir também é o que falta por vivenciar nada, resta ao sentir. O que se perde em vivência se ganha em saudade, falta, que é mais que vivência, é o que a vivência não vive, a vivência não precisa viver.

Como se sabe da vivência?! Pelas perdas, faltas, que é por onde a vivência existe, sem perder, nada se tem ou existe! Tudo para ser a perda de mim, já que nada consegui na vida além das minhas palavras, que não sei se se tornam mesmo poesia, meu sentir são perdas, que não podem ser tiradas de mim! A perda quer mais que o meu sentir, quer eu inteira, de corpo e alma nesta perda, até que a perda se torne solidão. A solidão é o fim do sentir, a vida acabou, mas a poesia persiste, ainda existe.

A poesia me fez esquecer a mim por causa do fim, o fim é a única lembrança da vida, o fim pode ter a alma que eu quiser, não posso escolher minha alma, posso lhe dar um fim! O fim é o passado inexistente, que existe como fim! A vida passa despercebida, sem o sol tudo é conectado pela esperança da falta de vida, de sol! A alma não se realiza como alma, sua chance de viver é deixar o sol se pôr como se ele já fosse sua existência, ele é mais do que a existência da alma, é a existência do sol, onde a alma ama ardentemente. O dia é do sol, nunca da alma! A alma usa o meu próprio sentir, como se fosse o fim de tudo, tudo vale o fim, tudo fica no fim, mas não permanece como fim. O fim de um olhar, um ser, um amor, não é o fim de tudo.

O fim é a única maneira de lutar por mim, eu sou luta, a vida é desistência, juntas não se pode desistir, nem lutar pelo nada! As vivências nunca serão vividas pelo ser, o ser é apenas ser, vivências do nada fazem eu retomar a vida sem vivências. Não sinto falta do que não vivi, nada preciso viver em ser. O tempo faz falta às vivências para se manter no real, se acobertar no nada do que me proteger? Será o nada uma defesa de se viver? Não posso me proteger do nada, do tudo posso me proteger, da proteção. A vida cindida, cortada sem partes, separou o nada do nada, para o nada ver a vida, servir a vida.

A vida não se importa com sua inutilidade, faz de conta que o nada a faz viver, o nada se expressa dentro dele, começa a viver pela vida. Nada existe em mim, tudo existe no nada, o nada manda na vida. No meu sentir, o nada é o mundo, nada posso querer ou lembrar para permanecer na lembrança, essa mesma lembrança me tira de mim, sem essa lembrança, não há mais nenhuma lembrança. Tudo acontece no acontecer de mim mesma, o acontecer é a lembrança que falta na minha vida. A vida é estática, imóvel, não contempla a lembrança, ela é ausência de lembranças que ficam marcadas na alma do amor. A alma pode ser justa com a morte, deixando a morte sofrer por ela, nem a morte merece sofrer, arrancar a morte da dor da alma, basta de ter alma pela dor.

A morte é uma alma descontrolada, infiel, perversa, na tristeza que já era esperada com alma, que a luz ilumine a dor, não a mim! Que o sol preserve sua luz da minha escuridão, que não é obscuridade, é clareza de existir numa só dança, num único compasso, numa única canção, num único coração, coração de todos os corações, por isso posso sofrer, amaldiçoar a solidão e me vendo partir num coração que soube amar. Isso é suficiente para eu ter clareza, como se a clareza de existir escurecesse a falta de sol de céu.

A única claridade é o nada que não pode morrer, nem partir, mas pode deixar que exista vida para os que podem nascer, vivi no tempo de amar, esse tempo será o começo de muitas vidas. Não sei se terei tempo para acompanhar a vida de quem começa a viver e demonstrar meu amor. Se você não puder conhecer meu amor, minha alma viva e será como se sentisse meu amor para sempre, como vida, como a vinda da esperança que demora, aparece quando mais preciso: na hora de amar!