Cesso com a solidão, com a dor de aparecer. Aparecer pela falta de mim é ausência. A ausência se fez essência, por isso, posso perdê-la, como se perde alguém. Não há ninguém para ter uma essência. Sem o ser não há ausências. Resisto ao corpo por não ter alma, pela insensibilidade sem corpo, que é todo o meu corpo. Na insensibilidade, eu sinto, amo. Tudo perdi no sensível: amor, sonhos, vida. Ninguém é alguém que todos veem. O corpo é o silêncio da voz, sem o meu silêncio. O corpo se cala sem o silêncio. A voz é sem saudade, falta da falta do nada. Interagir com o silêncio é alegria de viver. A alegria não vive, não existe, mas existe para mim. Mas não está dentro de mim. Não escuto a voz real, ao chorar. A vida, ela nunca está na fala, por isso, se fala da vida. Falar recupera-me o ar. Não há ar no silêncio. Recupero a tristeza no respirar. Respirar me une à alma. Sorrir é viver eternamente. A luz acende minha alma. O mundo era apenas luz. Acredito que a morte não é o último silêncio, é apenas a última vida. O silêncio é alma. Nada tem fim no acreditar. A lembrança não para na lembrança, vai até o ser e do ser até chegar a Deus. Deus não guarda lembranças, e sim, amor. Amor infinito. O amor finito, Deus também ama como se fosse infinito. O infinito destrói a distância da alma. A alma tem fim. O infinito me vê como sou. Sou a sombra do infinito no fim do sol das palavras. Não leio as palavras, sonho com elas. A palavra é a falta da vida. A palavra ama, sem ser amada. O suspiro é voz eterna nas sombras do pensar. Suspirar é falar como o céu fala. A fala se mistura com o respirar. Respiro na minha fala, indiferente a mim. A fala é o esquecimento de mim. O desespero da morte me faz ter consciência de mim. Mas sou também consciência de morrer. O céu aparece mais amplo no meu ver do céu. O ver aparece apenas no não ver. Ver sem aparecer: é assim que o ver se vê. Não posso emudecer o ver, apenas ensurdecer o ver. Desligo-me do nada na solidão. A solidão aparece para amparar o ser de sua alma. Muita alma para um único ser: a vida. A vida termina na vida. O céu é uma vida que não nasce. O sonho e o sonhador se diferenciam no nascer. Sonhar é a promessa de ver algo, que não seja a luz, nadando em minha consciência, como a falta de um olhar, uma ausência para ver a vida. Vida me fez ausência. Ver é ausência na imagem da vida, onde a vida cessa na ausência. A ausência não cessa na vida. Imagens surgem apenas na ausência. São a ausência de ser. A imagem cessa no real. O real sem imagem não é só. O irreal é quando a solidão não está só. Só como a realidade, que é só até com alguém, na realidade de alguém: é só na solidão. O sonho não acaba, torna-se o infinito do amor. O sonho não cessa por sonhar.