Blog da Liz de Sá Cavalcante

Nascer pela metade

Metade de mim não nasceu, é saudade das coisas que estão sendo vividas. Sempre, sempre, apenas para amar essa saudade. Saudade é fazer da falta de mim, amor. Eu amo pela falta de mim, como uma estrela sem céu. O nascer é metade alma, metade devaneio. O nascer é o não ver do outro. Nascer pela metade me faz morrer, deixo metade minha, minha única metade para a consciência. A consciência do amor é sem saída. O nascer ajuda a morrer. O nascer é a falta de mim. Tudo que morre nasce eternamente, como a voz que gira para falar, para não esquecer o que sente. A falta de nascer ecoa dentro da fala. A superfície da fala é o amor que se torna profunda não sendo escutada. Eu escuto sem mim, me derreto no ar que respiro: penso ser isso profundo. Nascer pela metade é todo ar que consigo respirar. Nascer e morrer são a mesma metade que se une, a mesma alma, o mesmo ser, o mesmo fim, sem o adeus, que viveu sem nada de si: não é nem metade dele mesmo. O que faz morrer não nasce, fica nos escombros de mim. O amanhecer não precisa lutar por mais um dia, precisa penetrar, amar os que realidade não tem. O olhar do outro me faz não cair no abismo da minha subjetividade. A subjetividade é a morte aparentemente possível em mim. A morte, se melhorar, se estraga. O abismo da minha subjetividade me ensina a morrer, sem sorrir. O nada do olhar é o que nunca sou ao morrer.