A sombra da alma é a inconsciência da vida em um sol infinito, triunfante. Desde o início fui o fim da vida, no teu sol encantador: de abandono, solidão. Solidão é areia a dissolver o tempo para nós. Viver no tempo não é ser feliz. A falta é a eternidade. A falta que me faz a falta é quando sorrio. A vida tem sabor de nada, se perde numa fala de amor. O amor vem até o ser apenas na falta de ser, cessa a ausência do ser, que é a morte. O ser sem a morte está perdido em um infinito vazio. O nada indestrutível no amor. Não existe consciência de falta, por isso, a falta é consciência. A consciência pertence ao nada. Sorrir é o nada na minha angústia. O medo de me angustiar é angústia com vida. Não há alma sem sombra. A alma é a falta do ser no ser, não na alma. O silêncio é falta de alma. O silêncio é o ser no que ele não é. O meu ser é afetado pelo silêncio, numa alegria silenciosa, incomunicável. Comunico-me em sombras de alma, para me refletir no nada como sou. A sombra da alma foi enterrada com o sol. O permanente não tem a permanência do sol. A vida sem vida é permanência: faz tudo durar. Até pareço fazer parte dessa permanência sem mim. A poesia é permanência do céu. Mas há céu na permanência? Apenas não permanecendo, saberei. Permanecer é a arte do desencontro. Me encontro na impermanência. A impermanência da flor é a própria flor. Queria ser a minha própria impermanência. Queria te ver de flor em flor, de sonho em sonho, mesmo sem saber se te amo. O amor sabe menos do que eu. Não há o que saber do amor: saber é ilusão. Escrevo mais do que vivo. A liberdade é uma ausência pura: não adianta escrever: já saí de mim. Tomei a vida de mim. Não há alma viva em uma poesia viva. Meu corpo é por onde fico a fugir do mundo. Mas há um mundo de fuga, do qual não quero fugir. Morri, mas meu nascer é eterno, onde cessa a sombra da alma, e a alma é apenas alma, para a minha alegria de morrer.