Fugir de mim é minha única realidade. O amor é uma fuga para não me perceber. Seria o amor o meu ser? A minha inexistência é amor. A existência é falta de amor. Completo-me na incompletude. A eternidade não importa, se eu estiver plena para sofrer com dignidade: é como um sonho. Desperto da alegria para ser triste, para o sonho não ser triste. A leveza é o sonho do eterno. O ventre da alegria é o nascer do nada. O sonho entorpece a alma. A única perda real é a da alma. Escrever é uma falta do tempo, compensa o nada: a vida do nada. A profundidade da vida é o seu fim. Escrever é o fim, antes do meu fim: é me rasgar sem fragmentos: sem os pedaços de mim. Enquanto o ar cessa nos espaços, sou livre sem nenhum espaço. Largada no nada que não consigo ser. O vazio é a luz do sol que atravessa o infinito. Não há infinito sem o sol. O que sonho é a essência de todo sol, de toda a vida. Para haver essência, é preciso sofrer do amanhecer. O amanhecer é a superfície da vida, de onde o amanhecer não respira. Em vez de respirar, nos faz respirar. Fugir é sempre respirar, onde o possível é a vida.