Blog da Liz de Sá Cavalcante

Como saber como o ontem se sente?

O fim é uma realidade emprestada do amor. A invisibilidade é uma maneira de não me esquecer de saber como o ontem se sente sem mim. A alma se parte ao meio para não partir. Partir como se eu fosse o ontem é reconhecer a morte pelo seu fim. Nunca pelo meu fim. A morte tem o morrer dentro dela. Compreender a morte é compreender a vida. Torna-me vida para morrer sem a plenitude da minha alma, para acreditar que morri, que não venci a morte, é uma alegria, alívio, não quero morrer! Eu compreenderei a morte quando morrer. Não existo sem morrer. Perder a morte seria perder a mim. Amo a morte, mas estando distante de mim. Deus é a concretude de ser. Por sonhar demais, não posso viver ou morrer. A vida, a maior das vidas, cabe nas minhas mãos, na minha poesia. Mas não cabe na alma. A alma, na sua fragilidade, são todas as vidas. Meu amor é inessencial no amor de todos. Todos são o amor que sinto. Tudo que aparece no meu olhar é o espírito, por falta de vida, de alma. Agarrar a alma como se eu agarrasse minha sombra. Nada na sombra é sol. Na sombra o sol se vê na infinitude do céu, o céu começa a cantar o silêncio. Tudo seria diferente sem o céu. Até eu seria diferente de mim, como se algo fosse vida. Tudo é igual pela vida, até o amor que sinto. O olhar melhora a alma, a vida, mas não melhora a vida quando ela se torna esse olhar. Tenho vontade de ter esse olhar em mim, mas não vale a pena viver por um olhar, deixando me atravessar esse olhar no tempo que me resta para olhar. Deixo o olhar resgatar o adeus para me resgatar como um olhar. No amanhecer não estou mais aqui, em mim, por isso eu amanheço plenamente. Não existe solidão no amanhecer. Mas o amanhecer não existe no amanhecer. Tudo depende do amanhecer. O olhar nunca amanhece. A alma amanhece pelo olhar. Demorei para perceber a falta do amanhecer, foi quando minhas poesias anoiteceram que percebi. A inspiração se inspira na poesia.