Quando anoitece, meus olhos se veem sem olhar, é como se pensar olhar me fizesse olhar verdadeiramente nos meus olhos. Não me reconhecer. Olhar é esquecimento do ser e da alma. Não vou fazer do meu olhar uma lembrança eterna das coisas, das pessoas. Não há como separar o olhar da alma, do fim. Olhar sem fim é morrer. O que o amor sabe da vida que não pode se ver na vida? Quando a vida será amor? O fim entra pela pele, deixa buracos em minha vida, que não são faltas, são desespero. Desespero de que algo não me faça falta. Quando a vida nascer, tudo será separável. Se meu olhar fosse meu, se minha alma fosse minha, me uniria à vida? Não há alma que dure uma sensação vazia, não é perda da vida, é pertencimento de viver. A alma me escapa, como se fosse o nascer da vida. A vida nasce de uma flor, que não representa a vida, mas é a eternidade da vida, como um sol em flor. Construir a alma de uma flor morta é acabar com a dor em pétalas de flor. Ainda é uma flor, sem alma, sem rumo, sem beleza. A alma geme como se tivesse vida, como se tivesse dor. A última lembrança é a primeira lembrança: morrer. Morrer, antes que a flor resista ao meu amor. Não há amor sem flor. Eu nasci como flor, morrerei como ser.